Futebol Clube
A evolução do Vitória de Setúbal para uma «Sociedade Anónima Desportiva Vitória Futebol Clube», vai transformar, radicalmente, a realidade quotidiana do popular clube do Bonfim, considerado um dos baluartes do desporto na margem sul do Tejo. Os sócios do Vitória de Setúbal vão deixar de ter a influência de outrora na gestão do clube, sendo certo que serão, brevemente, substituídos, pelos futuros accionistas. Esta mudança significa, antes de mais, uma evolução de critérios de gestão mais ou menos emocionais, para uma gestão que se pretende mais racional e, principalmente, uma gestão de acordo com as possibilidades financeiras da S.A.D.. Dentro de pouco tempo, a Direcção do Vitória de Setúbal e a S.A.D., deverão celebrar um protocolo que permita a cedência, ou a utilização, das instalações desportivas e de apoio à S.A.D., e a exploração das receitas do bingo, mediante um conjunto de contrapartidas a atribuir ao clube sadino.
O Papel da Câmara Municipal
Conhecedora do baixo nível de vida da grande maioria dos associados do clube e da realidade económica do concelho e do distrito, com um tecido empresarial debilitado e, ao que parece (pelo menos por enquanto), pouco interessado em apoiar aquele que poderia ser um grande clube do futebol da região de Setúbal e, porque não do próprio país, a Direcção presidida por Justo Tomás procurou minimizar o problema, garantindo uma forte participação da autarquia setubalense na Sociedade Anónima Desportiva, com 40% do capital social.
A forte presença da autarquia setúbalense no capital social foi considerada indispensável no processo de formação da S.A.D., mas, na opinião de Carlos Pésinho, responsável pelo departamento de Relações Públicas da S.A.D., “ao longo do tempo poderá, e deverá, perder essa grande presença no capital social, se houver, como se espera, uma grande adesão dos sócios e de outras entidades na compra de acções”.
As primeiras 60 mil acções da S.A.D. Vitória Futebol Clube, que vão ser comercializadas ao preço de mil escudos cada uma, estarão à venda dentro de quatro meses, nos finais de Maio ou no principio de Junho, caso se confirmem as previsões para a esta operação financeira, liderada pelo Banco ESSI. Os associados do Vitória de Setúbal que estiverem interessados poderão, nessa altura, adquirir um mínimo de dez acções. Para trás ficam algumas precipitações, como o foi a tentativa de registar os sócios que pretendiam reservar a compra de acções em Setembro de 97 e o anúncio público de que essas acções estariam à venda no fim do mês de Janeiro.
“Acho que houve a intenção de facultar aos sócios uma inscrição provisória, para a compra de acções, mas a Comunicação Social deu a entender que o Vitória tinha acções à venda e isso levou a uma intervenção da Bolsa de Valores de Lisboa”, reconhece Carlos Pésinho, acrescentando que, “afinal, a inscrição provisória também não é permitida pela Bolsa de Valores de Lisboa”.
“Nem os dirigentes desportivos nem a própria Banca estavam preparados para esta nova realidade das Sociedades Desportivas”, reconhece Carlos Pésinho, procurando assim justificar os acidentes de percurso no processo de constituição da Sociedade Anónima Desportiva do Vitória Futebol Clube.
Saneamento financeiro e … escola do Bonfim
A Grande aposta que tem sido feita nos escalões mais jovens em detrimento da compra de jogadores «ao quilo» – muitas vezes «sem o peso» anunciado – em contratações que não passavam de maus negócios para o clube, começou a «render juros» muito rápidamente, com a venda de Sandro e Ribeiro, dois jogadores que, segundo os valores divulgados publicamente, deixaram nos cofres do Bonfim cerca de 400 mil contos. Tão importante como a aposta nos jovens, foi o saneamento financeiro do Vitória de Setúbal. Há, no entanto, alguns sócios que ainda hoje não perdoam a Direcção de Justo Tomás, pela venda dos terrenos anexos ao estádio do Bonfim, embora outros admitam que terá sido o preço a pagar pelo regresso à primeira divisão que, a não se verificar tão rápidamente como aconteceu, poderia ter tido outras consequências ainda mais dramáticas, para um clube como o Vitória de Setúbal que tem vivido a última década à espera dos subsídios camarários que têm sido, quase sempre, superiores a 100 mil contos por ano. Por outro lado, convém lembrar que as despesas na Segunda Divisão de Honra são quase idênticas às despesas de um Campeonato da Primeira Divisão Nacional, enquanto as receitas (da Segunda Divisão de Honra) são substancialmente inferiores. Também por isso, talvez os depauperados cofres do Vitória Futebol Clube não resistissem a uma permanência prolongada no escalão secundário.
As divergências…no seio da Sociedade Anónima Desportiva, não são, afinal, tão profundas como tem sido referido pela Comunicação Social, garante Carlos Pésinho, que acusa os jornalistas de “fazerem passar uma imagem que não corresponde à realidade”.
Apesar do alegado “empolamento da Comunicação Social”, Carlos Pésinho diz, no entanto, que “tem havido alguma dificuldade da representante da Câmara de Setúbal (Paula Costa), em se entrosar no mundo do futebol…está habituada a uma autarquia e aqui não se pode aplicar esse modelo de gestão”.
A titulo de exemplo, Carlos Pésinho, lembrou que a ex-vereadora da Câmara de Setúbal, que se mantém como representante do Município da S.A.D., “recusava assinar cheques em branco”.
“Disse-lhe que achava que o deveria fazer, porque senão como poderíamos pagar as despesas das deslocações do Vitória de Setúbal?”, interroga-se o porta-voz do Conselho de Administração da S.A.D., confessando não vislumbrar outra forma de fazer tais pagamentos, sem recorrer à assinatura de cheques em branco, por parte dos elementos do Conselho de Administração… De referir que a Câmara Municipal de Setúbal é o maior accionista da Sociedade Anónima Desportiva, com 40% do capital social, e que a assinatura do representante do Município é necessária e obrigatória para vincular a S.A.D. em questões financeiras.
o mau da fita?…
«Preso por ter cão , preso por não ter…»
Só os setubalenses mais distraídos ainda não se aperceberam do clima de conflitualidade permanente entre os principais dirigentes do Vitória e o presidente da Câmara. Na última década, Mata Cáceres terá transferido para o clube sadino mais de um milhão de contos. Da mesma forma, contribuiu para viabilizar a construção nos terrenos anexos ao estádio do Bonfim, permitindo a venda daquele património, para que os dirigentes do Vitória não ficassem com os cofres vazios. Na linha dos anteriores apoios concedidos ao clube do Bonfim, a Câmara presidida por Mata Cáceres deu também ao Vitória de Setúbal uma vasta zona para a construção de um Complexo Desportivo e outros terrenos, para campos de jogos, que ainda não foram concluídos. Mata Cáceres considera-se, por isso, injustiçado, até porque a nova legislação já não permite a simples atribuição de subsídios, mas sim a assinatura de contratos programa, que obrigam os clubes a responderem pela aplicação das verbas que lhes são atribuídas. Uma nova realidade que terá ajudado a fomentar o clima de desconfiança entre o Bonfim e a Praça do Bocage.
O presidente da câmara de Setúbal tem afirmado, repetidamente, que, se há coisas de que não o podem acusar, é de não ter apoiado o clube do Bonfim. Um sentimento, de resto, partilhado pelos vereadores das bancadas da CDU e do PSD no anterior executivo camarário que, incomodados com o que consideravam ser um “apoio excessivo ao Vitória de Setúbal”, questionaram por diversas vezes o presidente da autarquia.
Contas… de 96
Alguns associados do Vitória de Setúbal protestaram, publicamente, pela demora na apresentação das contas do exercício de 1996, que deverão ainda ser apreciadas em Assembleia Geral do Vitória Futebol Clube, dado que a S.A.D. só foi constituída em Agosto de 1997. Embora pertença, apenas, ao Conselho de Administração da S.A.D., não tendo por isso que se pronunciar sobre assuntos que dizem respeito à Direcção do Clube, Carlos Pésinho disse ao “Setúbal na Rede” que “as contas de 96 estão fechadas e já foram entregues ao presidente do Conselho Fiscal, para serem, posteriormente, apresentadas numa Assembleia Geral, ainda sem data marcada”.
Como fácilmente se percebe, o ano de 1998 assume particular importância para o Vitória de Setúbal. A gestão dos conflitos institucionais, a concretização da S.A.D., a adesão dos sócios na compra de acções, o comportamento da equipa de futebol e a evolução da já denominada industria futebolística, a viver momentos algo conturbados neste tempo de mudança, são elementos fundamentais para o futuro do Vitória de Setúbal ou se preferir da Sociedade Anónima …
Gualter Ribeiro