[ Edição Nº 17 ] – Bento Brázio Romeiro, presidente da Junta de Freguesia de Corroios.

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barra-5539104 Edição Nº 17,   27-Abr.98

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Concelho de Amora
Corroios não quer fazer parte deste projecto

           Bento Brázio Romeiro, actual Presidente da Junta de Freguesia de Corroios, reagiu à proposta da criação do Concelho de Amora. Considera esta proposta uma iniciativa de quem não conhece o concelho e que em muitos aspectos chega mesmo a desrespeitar a própria herança histórica das populações. Defende para Corroios um projecto de continuidade e de unidade sempre integrado no Concelho do Seixal.


          Setúbal na Rede – Qual a posição da Junta de Freguesia de Corroios em relação ao projecto de criação de Concelho de Amora?
          Brázio Romeiro
– A Junta de Freguesia de Corroios reuniu e deliberou a seguinte posição: não aceitamos ser integrados no Concelho de Amora porque este é um projecto com o qual não nos identificamos. Entendemos que o Concelho do Seixal deve continuar da forma como está, com as actuais freguesias, porque temos uma história, uma tradição e projectos para o futuro. Por outro lado também não aceitamos que outros decidam por nós. Este é um projecto com uma imposição político-administrativa, as populações da Junta de Freguesia de Corroios não foram ouvidas, as forças vivas não foram ouvidas, as forças autárquicas ainda não foram ouvidas. Entendemos que estes projectos, a serem apresentados na Assembleia da República deveriam ter tido o bom senso de, antecipadamente, ouvir a população de Corroios para saber se ela estava ou não de acordo com a integração no futuro Concelho de Amora.

          SR – Qual é que acha ser a sensibilidade da população em relação a esta questão?
          BR
– A opinião que tenho é a de que a população da Corroios, esmagadoramente, não se revê no projecto. Esta é uma tomada de posição natural. Aliás, as próprias colectividades da freguesia já se reuniram e todas elas, por unanimidade, tomaram essa posição também, sem que houvesse qualquer tipo de imposição, fosse de quem quer que fosse. As pessoas que estão nas colectividades têm opiniões políticas divergentes entre elas, mas quanto à defesa da continuidade da integração de Corroios no Concelho do Seixal, a tomada de posição foi unânime. Digamos que isto corresponde a uma posição frontal, aberta, tomada sem qualquer imposição, As pessoas de uma forma natural respondem-lhe. Se fosse feita uma consulta á população, tenho a certeza de que a esmagadora maioria das pessoas responderia que não quer integrar o Concelho de Amora. Esta é uma tomada de posição natural.
          SR – Qual o limite de fronteiras que defende, caso o Concelho da Amora venha a ser uma realidade?
          BR
– Para além da criação do Concelho de Amora, os projectos apresentados propõem também uma divisão administrativa com a criação de novas freguesias. A proposta do grupo parlamentar do PSD, não está de acordo com a opinião da autarquia. Já anteriormente houve propostas de reorganização da freguesia – a proposta da criação da freguesia de Miratejo, por exemplo – da qual eu e o antigo Presidente da Câmara fomos os primeiros subscritores. Essa divisão, a propor à Assembleia da República, que foi aprovada por unanimidade e aclamação na Assembleia de Freguesia, não foi agora minimamente respeitada pelo grupo parlamentar do PSD, que anteriormente havia votado favoravelmente e aplaudido. Agora, à revelia das tomadas de posição já anteriormente assumidas, vem tomar uma outra posição, que faz com que a actual Freguesia de Corroios fique organizada administrativamente de uma forma desequilibrada. A Freguesia de Corroios tem cerca de 17 km2, cinquenta e três mil habitantes e a proposta apresentada faz com que a Freguesia de Corroios seja reduzida a uma zona central limitada entre a auto-estrada do sul e o traçado da futura via alternativa à nacional 10, fazendo com que a Junta de Freguesia de Corroios fique com cerca de dois km2, não respeitando sequer as memórias colectivas e ancestrais da população de Corroios, nomeadamente quando propõe que o Moinho de Maré seja integrado na Freguesia do Miratejo. Consideramos isto não um desrespeito mas uma afronta às memórias da nossa freguesia, àquilo que é nosso, à nossa tradição porque, como é do domínio público, o surgimento da Freguesia de Corroios está intimamente ligada do Moinho de Maré, que é o seu ex-libris. Da mesma forma que esse projecto propõe que a praia do Seixal, que sempre foi a praia do seixaleiros, seja integrada na Freguesia do Miratejo. Esta praia está a duzentos metros do Seixal, está do outro lado do rio mas ali o rio não constitui uma barreira mas antes uma via de comunicação entre a vila do Seixal e a praia do Seixal, local onde sempre funcionaram os estaleiro do Seixal, a seca do bacalhau. Agora, por via administrativa, o PSD pretende “roubá-la” aos seixaleiros e integrá-la em Miratejo quando Miratejo dista da praia do Seixal em cerca de 5km, o que achamos extremamente incorrecto. Por outro lado também, e ainda dentro deste ponto de vista, o projecto do PSD propõe que localidades como o Alto do Moinho, que sempre esteve intimamente ligado a Corroios, ou a Quinta de São Nicolau de Fora ou ainda Santa Marta de Corroios, fiquem integrados na Freguesia de Vale de Milhaços ou na Freguesia da Amora, quando nós entendemos que por razões históricas, de continuidade e homogeneidade urbanística, devem ficar ligados a Corroios e não a Vale de Milhaços que é uma zona de construção unifamiliar ou bifamiliar, logo dissemelhante do tipo de construção das restantes zonas. Esta questão da divisão administrativa da Freguesia de Corroios tem de ser devidamente ponderada e analisada por quem conhece a realidade local: as populações, as forças vivas e a autarquia. O que nos parece é que quem elaborou o projecto não conhece no terreno a realidade local. O projecto do PSD prevê que localidades como Sta. Marta de Corroios, surjam simultaneamente em dois projectos: ou fazendo parte da futura Junta de Freguesa de Foros da Amora ou da futura freguesia de Vale de Milhaços. A própria localidade do Alto do Moinho, aparece, no mapa, como fazendo parte de Corroios e na memória descritiva, que é o documento que dá conteúdo e forma ao projecto, como fazendo parte de Vale de Milhaços. Não há um rigor no projecto.
          SR – Quais os principais problemas com que a Junta de Freguesia de Corroios se debate actualmente?
          BR
– A Freguesia de Corroios conheceu nos últimos anos a um grande crescimento geográfico. Hoje a Vila de Corroios, já não é aquela pequena população de cinco mil habitantes, como em 1973. Hoje temos mais de cinquenta e três mil habitantes e nos próximos dez anos vamos assistir a um outro grande crescimento demográfico, que fará com que a nossa freguesia fique com cerca de oitenta mil habitantes. A nossa luta passa pela criação de mais qualidade de vida urbana para que estas pessoas que escolheram Corroios para viver, possam viver numa freguesia com condições de vida. Esta qualidade de vida urbana passa pela instalação em Corroios de um cartório notarial, de uma repartição das finanças, de um registo civil, pela resolução definitiva das constantes inundações na baixa de Corroios, passa pelo financiamento da via alternativa à estrada nacional dez, pelo financiamento da via alternativa A3 e a sua ligação ao nó de Coina, pelo financiamento do projecto do Metro Sul do Tejo, pela construção de um conjunto de acessibilidades de qualidade à estação de comboios de Corroios, passa pela construção de uma passagem aérea superior sobre a auto-estrada sul, ligando a estrada nacional 10 à nova urbanização de Sta. Marta do Pinhal, passa pela construção do Complexo Municipal dos Desportos de Corroios, cuja primeira fase já foi adjudicada pela Câmara, passa pela construção de um novo mercado municipal, e de um novo mercado do levante, passa pela instalação em Corroios de um polo da biblioteca municipal. Tudo isto é que vem dar força à vila de Corroios. Estas divisões comezinhas no lugar de engrandecerem vêm enfraquecer a capacidade empreendedora da Câmara Municipal do Seixal.
          SR – Considera que estes problemas seriam mais facilmente resolvidos com a criação do concelho de Amora que estaria mais próxima do que o concelho do Seixal?
          BR
– Nós entendemos que não está em causa a distância quilométrica entre o Seixal e Corroios, até porque vivemos num dos quarenta concelhos mais pequenos do país. Hoje, as distâncias entre Corroios e o Seixal não são tão grandes ao ponto de dificultarem o acesso da população ao Município. O que diríamos então de concelhos com cerca de mil km2 que existem um pouco por todo o país. Esses concelhos funcionam, da mesma forma que o concelho do Seixal funciona e bem, conforme o tem demonstrado ao longo destes vinte e três anos após o 25 de Abril, nomeadamente, quando passámos de concelho rural para concelho urbano de primeira classe, quando passámos a ser uma referência nacional em muitas áreas, como a do ensino. O concelho do Seixal regista o maior índice do país de aproveitamento escolar na área do primeiro ciclo. Na área do ambiente somos uma referência, temos uma cobertura de recolha do lixo, uma rede de esgotos, e um abastecimento de água, de cem por cento. No que diz respeito ao tratamento da águas residuais, a cobertura do país é de cerca de vinte por cento, enquanto que a do Seixal é de cinquenta por cento. Com a construção da estação de tratamento de águas residuais do Seixal, em projecto já aprovado e cujo financiamento está garantido pelo governo, o concelho ficará com uma cobertura de noventa e seis por cento. No distrito de Setúbal somos o segundo concelho em número de habitantes, o segundo concelho mais industrializado, o primeiro concelho em número de estabelecimentos e serviços. Fomos o primeiro concelho do país a aprovar a carta escolar e o plano municipal de emergência. Tudo isto é a qualificação e é isto que interessa às populações. O espaço comunitário do nosso concelho é um espaço de interligação, nós fazemos parte de um todo e é desse todo que queremos continuar a fazer parte. É ainda importante dizer que a Câmara Municipal tem procurado descentralizar para as freguesias um conjunto de atribuições e competências, que vão até para além do que está estipulado na lei, por forma a aproximar mais a administração dos cidadãos.
          SR – Qual é a vossa posição em relação à criação da Junta de Freguesia do Miratejo?
          BR
– Em relação a essa questão, o que nós entendemos é que temos de promover a reorganização administrativa da actual freguesia de Corroios, mas de uma forma equilibrada. É proposta nossa que Miratejo e Vale de Milhaços sejam elevados à categoria de freguesias mas de uma forma equilibrada, para que a freguesia de origem continue a ter os meios necessários a justificarem a sua continuidade. Por isso é que eu disse inicialmente que o projecto do PSD vem destruir a actual freguesia de Corroios. Porque quando uma freguesia que tem cerca de cinquenta e três mil habitantes, dezassete km2 é reduzida à mais ínfima insignificância, ficando com cerca de dois km2, estamos a condicionar a própria existência dessa freguesia. Se é esse o objectivo do PSD então que o diga publicamente. O que me parece inegável, é que nestes últimos anos a Junta de Freguesia de Corroios atingiu um nível de prestígio na panorâmica do nosso concelho, do nosso distrito e até do nosso país. Somos um referência em algumas áreas. Na área da educação, na área da cultura, na área do ambiente.
          SR – Esta é, então, uma proposta feita por iniciativa de partidos políticos, que não reflecte um anseio da população?
          BR
– Admito que alguns sectores da população de Amora estejam interessados em passar a concelho, nomeadamente a população do núcleo histórico. Mas considero que este anseio reflecte rivalidades locais antigas, que foram nascendo ao longo dos anos, entre os amorenses e os seixaleiros. Nós é que não temos nada a ver com essa rivalidade, se eles a têm, eles que a resolvam. Agora, não queiram é que, para expressar essa rivalidade, nos “metam no mesmo saco”. Por isso é que afirmamos que esse é um projecto com o qual não nos identificamos. Se formos à rua perguntar às pessoas se querem ir para o concelho de Amora, de uma forma natural as pessoas respondem que não querem. Isto é dito por toda a gente sem qualquer orientação político-partidária. Isto é dito de uma forma espontânea, porque é verdade.

Entrevista de Margarida Leal     

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