Edição Nº 37, 14-Set.98
Contra o centralismo dos poderes
Comunistas dizem ‘sim’ à regionalização
Joaquim Matias, deputado do PCP eleito por Setúbal, considera fundamental que o país disponha de regiões administrativas e defende a região de Lisboa/Setúbal como forma de potencializar o desenvolvimento da península. Recusa a ideia de divisão do país e acusa os anti-regionalistas de “quererem intoxicar a opinião pública”.
Setúbal na Rede – Como é que o PCP entende a regionalização?
Joaquim Matias – Regionalizar não significa dividir, como alguns anti-regionalistas têm vindo a dizer. Regionalizar é criar regiões administrativas. Ou seja, trata-se de autarquias e como autarquias que serão não vão ter poder de legislar.
SR – O que é que as populações ganham com isso?
JM – Segundo as teorias de desenvolvimento, o que se ganha é descentralização de poderes da administração central para as regiões e maior capacidade reivindicativa por parte de quem as representa porque os dirigentes dessas regiões passam a ser eleitos pelo povo. Por isso, as pessoas que tomarem decisões sobre as respectivas regiões serão responsabilizadas por elas, o que não acontece agora porque os órgão que as gerem, como é o caso das CCR’s, Comissões de Coordenação, que são organismos oficiais cujos dirigentes são nomeados.
SR – Acredita que a divisão administrativa do país seria um passo para o desenvolvimento?
JM – Sem dúvida, e basta pensar como é que pode haver desenvolvimento integrado do país se os serviços estão todos centralizados? Será a oportunidade para proceder à sempre adiada reforma administrativa do Estado.
SR – O que é que Setúbal ganhará se for integrada na Região de Lisboa?
JM – As regiões já existem, basta agora formalizá-las. Se pensarmos, Setúbal tem tudo a ver com Lisboa, há uma grande homogeneidade e interligação entre as duas margens do Tejo. De facto, toda esta península tem-se articulado com Lisboa em questões como o emprego, os transportes, os acessos, o ensino, a cultura e até mesmo as questões sociais. Ou seja, esta região já existe, e basta pensar na Área Metropolitana de Lisboa que abrange esta mesma área, e se pensarmos na própria CCR e nas direcções regionais de saúde, vimos que abrangem a região de Lisboa e Vale do Tejo, ou seja, a região de Lisboa e Setúbal. Portanto esta região não é nova, o que se pretende é eleger pessoas que a representem, dar-lhe protagonismo e capacidade de reivindicação.
SR – Mas acredita que o distrito se desenvolverá se pertencer à região Lisboa/Setúbal?
JM – Sem dúvida, porque o desenvolvimento de Setúbal não pode ser feito sem o de Lisboa. E isso vê-se ao nível dos transportes, que estão todos criados em função destes dois grandes pólos de desenvolvimento, o caso dos acessos e agora da nova ponte. Isto para não falar de uma terceira ponte, entre Barreiro e Chelas, que toda a gente sabe ser fundamental e que quando vier já vem tarde. Ou seja, esta região tem uma ligação natural a Lisboa que é preciso respeitar e a criação de uma região administrativa significará o desenvolvimento integrado da península de Setúbal.
SR – Se a regionalização está prevista na Constituição, acha que faz sentido um referendo?
JM – Não se devia referendar precisamente por isso. Foi lamentável que o PS tivesse cedido ao referendo nas negociatas com o PSD. É como disse um dia o meu colega de partido João Amaral: “o PSD usa o referendo como preservativo” quando as coisas não lhe agradam. Isto para intoxicar a opinião pública e manipular as pessoas. Ou seja, há quem já não pense na política como uma forma de mudar a vida das populações, e use a política para tirar dividendos eleitorais.
SR – De que forma é que o PCP vai sensibilizar a opinião pública para a questão da regionalização?
JM – Vamos apostar no debate político e sem demagogias. Admito que algumas pessoas estejam agora baralhadas, depois de uma autêntica campanha de intoxicação da opinião pública feita pela direita. No entanto, sabemos que pelo esclarecimento e pelo debate o PCP vai estar nesta batalha, uma batalha que visa beneficiar a população. Com a força que temos vamos trabalhar, tal como temos feito sempre, lado a lado com todos os militantes que são a nossa verdadeira força. Vamos para os tempos de antena, cartazes, folhetos e muito esclarecimento sobre uma questão que é fundamental para o desenvolvimento sustentado do país.
SR – Acredita que o ‘sim’ vai ganhar no referendo de dia 8 de Novembro?
JM – Acredito que sim, com toda a convicção, porque os portugueses sabem bem aquilo que querem. E agora não irá acontecer o mesmo que no anterior referendo, onde a abstenção venceu. Acredito que, estando todos os partidos empenhados neste assunto, os portugueses vão ficar mais esclarecidos e irão votar.
Entrevista de Etelvina Baía