Edição Nº 38, 21-Set.98
AVISO À NAVEGAÇÃO !!
por Rogério Severino (Jornalista do “Jornal de Notícias” e
membro eleito do Conselho Geral do Sindicato dos Jornalistas)
Vamos aprender a viver sem a Expo
(e os trabalhadores vão viver sem trabalho)
Faltam nove dias para chegar ao fim a Expo’98 que nos saiu em sorte após a anterior, realizada na Cartuxa, em Sevilha. Serviu indiscutivelmente para divulgar o nome de Portugal no mundo, dando de nós uma imagem externa muito positiva. Para consumo interno, nem tanto: um escândalo de desvios de dinheiros, que deu origem a prisões, e até uma ‘fábrica’ de notas falsas. Não nos admirámos: os ‘artistas’ eram portugueses. Mas com o fim da Expo vai chegar mais desemprego… Primeiro, poucos meses antes, foi concluída a Ponte Vasco da Gama, que deu emprego a milhares de trabalhadores, na sua maioria indiferenciados mas também a muitos com um nível académico de grau elevado. Em 30 de Setembro vai encerrar a Expo’98 e, como reflexo mais negativo, o desemprego para alguns milhares de pessoas, desde empregados nos pavilhões privados, nos quiosques, até às muitas centenas na própria Expo e todos na sua maioria jovens que até conseguiram lá o seu primeiro emprego. Em ambos os casos (e se a eles juntarmos os milhares de trabalhadores que hão-de sair quando terminar o tabuleiro ferroviário da Ponte 25 de Abril bem como o alargamento das vias) são consideráveis milhares de postos de trabalho que se vão perder, para desgosto da Secretaria de Estado do Emprego, do Instituto de Emprego e Formação Profissional, que vêm as suas estatísticas profundamente afectadas mas, em primeira instância, os próprios afectados são os que mais vai sentir. O grosso da coluna destes desempregados vai incidir sobretudo na Península de Setúbal, de onde provém a maioria. Também a Região de Setúbal (esta mesma, que por obra e graça dos políticos vai ser referendada para ser integrada na Região de Lisboa) vai ficar altamente prejudicada e vê assim mais uma vez aumentar a concentração de desempregados. No entanto e aplicando o conceito do Governador Civil de Setúbal de que, com a Regionalização, com os empregos em excesso em Lisboa os beneficiados são os trabalhadores de Setúbal, talvez agora se possa também repartir o mal: que Lisboa venha a dar trabalho aos desempregados de Setúbal. Tá bem… dava-lhes um doce. Também é interessante revelar que, indirectamente e por causa da Expo, um jornalista muito conhecido dos telespectadores portugueses foi despedido. Trata-se de Vasco Lourinho, correspondente da RTP em Madrid. Homem assumidamente de direita (chegou a ser ‘avisado’ pela ETA por lhes chamar terroristas), Vasco Lourinho, goste-se ou não do seu trabalho, sempre procurou cumprir e realizar as tarefas que lhe eram cometidas e durante quase vinte anos foi presença certa no Telejornal. Até à altura em que, ao fazer a comparação entre os primeiros dias da Exposição de Sevilha e a de Lisboa, disse que na Cartuxa os primeiros dias começaram com muitos milhares de visitantes; só que, dias antes, o Primeiro-Ministro António Guterres, procurando justificar a falta de afluência inicial, e certamente mal informado, disse publicamente que em Espanha a Expo tinha começado com poucos visitantes, o que não era verdade. Vasco Lourinho que sem saber, ousou desmentir o Primeiro-Ministro, viu cair o verniz da RTP: rua, sem qualquer explicação. Recordamo-nos até do caso entre a RDP e Mário Mounier, na América, em que o jornalista, fiel à rádio do Quelhas há dezenas de anos, de repente recebeu uma carta lacónica de despedimento, sem que nada o justificasse. Mário Mounier suicidou-se. (É claro que esta situação foi menos mediática porque entre os presumíveis e insensíveis implicados do despedimento de Mounier há conhecidos jornalistas. Aliás, gostaríamos de ter visto nestes dois casos uma tomada de posição firme do Sindicato dos Jornalistas).
A partir de 30 de Setembro, Portugal vai ter que aprender a viver sem a Expo. Nós, portugueses, vamos aprender também a viver sem a Expo, motivo de justificação de tantas situações. E os desempregados vão, sobretudo, habituar-se a viver sem emprego, o que é, neste caso, mais difícil.