Edição Nº 40, 05-Out.98
HOJE VOU SER SINCERO
por António Manuel Ribeiro (cantor e compositor dos UHF)
A música portuguesa existe
Há uma pergunta triste que regularmente me colocam.
Quando ando em trabalho de promoção de um novo disco, visitando rádios, jornais e TV’s, fazem-me invariavelmente uma sacrossanta e terminal pergunta: “Como é que vamos de música portuguesa?”, como se uma opinião minha (profissional) colasse um certificado de garantia no estado das coisas. Há vinte anos que faço espectáculos e gravo discos, como centenas de outros artistas portugueses. A rádio tem música portuguesa. Os programas televisivos usam-na. O povo canta-a nas ruas, nas romarias, nas salas de concerto.
As editoras que por cá existem gravam quilos de boas e más notas musicais, gostosas ou fáceis. Aliás, as multinacionais do disco continuam a abrir escritórios em Portugal, o que, só por si, demonstra que os nossos autores e os nossos artistas produzem música válida e valiosa, passível de alimentar um mercado específico. Posto isto, ou apesar disto tudo, ainda há quem considere que a forma mais académica de encerrar uma entrevista com um artista português é perguntar-lhe “Como é que vamos de música portuguesa?”, moderna ou vintage.
Será que ao Dylan (Bob) lhe é colocada a mesma pergunta?
A música portuguesa há muito que não é um projecto, antes uma realidade de múltiplas correntes artísticas mais ou menos comerciais. Não é menor, existe, respira e ouve-se no éter.