[ Edição Nº 63 ] – DO CENTRO DA PENINSULA por José Carlos Sousa.

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barra-1964139 Edição Nº 63,   15-Mar.99

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DO CENTRO DA PENÍNSULA
por José Carlos de Sousa (Professor e director da Popular FM)

Violência na escola

           Cada vez mais os professores são vitimas dos mais diferentes atropelos que a sociedade lhes vai causando de uma forma desmedida e a que estes profissionais respondem sempre de uma forma em que se deixam enredar nas diferentes novas atribuições que lhes estão destinadas.           Nos dias 4 e 5 de Março cerca de cinco centenas de docentes reunidos num seminário organizado pela Associação Nacional de Professores do Ensino Secundário, em colaboração com a Associação de Professores Pró-Ordem, que decorreu no auditório da Escola Superior de Comunicação Social em Lisboa, aprovaram por unanimidade uma moção em que se solidarizavam com o professor da escola de Marvila agredido por um aluno. Este será mais um caso de policia do que um caso de indisciplina. Como pode a escola responder a estes casos?           Esta problemática foi discutida por estas cinco centenas de docentes que reflectiram sobre as condições mais ou menos lineares que provocam esta violência nos jovens.           Cada vez mais a classe docente sente estas situações. Os professores contactam no dia a dia com pessoas. Este sistema educativo em que vivemos, de mutações que rapidamente se vão sucedendo, é muito lento a reconhecer e a responder ao desencanto e mal-estar crescente dos professores. Por outro lado a sociedade que a todos diz respeito, falha no reconhecimento do contributo destes profissionais.           E dir-me-ão que muitos se estão positivamente borrifando para o ensino, para os alunos e para o contributo que estes darão à sociedade em que estão inseridos. Mas como em todas as profissões há bons e menos bons profissionais, pessoas que estão dispostas a dar aquilo que podem e outros que se limitam a passar o tempo de uma forma onde o emprego seja o seu único objectivo.           Depois os pais estão menos disponíveis para os seus filhos: é a escola e consequentemente os professores que têm de responder a estas necessidades, depois há mais violência na escola entre alunos, entre alunos e funcionários, entre alunos e professores, entre funcionários e professores e mesmo entre professores e as diferentes comissões executivas instaladoras.

          Na última sexta-feira a Escola Superior de Tecnologia em Setúbal recebeu um seminário sobre o tema “Saúde e Docência Stress Profissional” que reuniu mais de duas centenas de docentes essencialmente do distrito de Setúbal. A discussão teve a ver essencialmente com o facto de as condições dos docentes não serem as melhores, faltam horários, faltam turmas mais pequenas, faltam melhores condições nas escolas, falta motivação por parte dos docentes e neste seminário a Dra. Anita Vilar, psiquiatra e chefe de departamento da psiquiatria e saúde mental do hospital de S. Bernardo teve oportunidade de referir que muitos dos seus pacientes são professores. Outros contudo são alunos de vários professores que tentam não perder o “comando” dentro da sala de aula e que por isso tudo fazem e a tudo recorrem para continuar a estar num patamar de sapiência muito superior aos alunos, não conseguindo compreender que cada vez mais há necessidade de partilhar conhecimentos e experiências nas diferentes áreas do saber.

          Aproveito para citar uma comunicação de Maria Antónia Frasquilho da Escola Superior de Saúde Pública de Lisboa, num recente seminário em que participei, em que refere que, num inquérito realizado em 638 escolas durante o ano de 1998, entre os problemas prioritários identificados no contexto escolar ergue-se o domínio das relações inter-pessoais (20%); o de consumo de drogas lícitas e ilícitas (25%); a segurança (13%); a agressividade/violência (9%); problemas ecológicos (8%); insucesso, indisciplina e desmotivação cada um com 7% das citações. Todos estes elementos stressores podemos agrupá-los da seguinte forma: relativos aos alunos (indisciplina, heterogeneidade, valores); à instituição educação (problemas organizacionais; de planeamento; de comunicação com o ministério; a falta de incentivos salariais); às tarefas (burocracia; multiplicidade; ambiguidade; insuficiente formação); às condições de trabalho (insuficiência e desconforto) e ao mau clima social, ainda a factores psicológicos (o paradoxo da idealização) e sociais (a colisão com outros papéis pessoais).           Por outro lado o Centro da Área Educativa de Setúbal contabiliza 113 docentes colocados nas escolas de 1º ciclo, ao abrigo da portaria 622/B, que possibilita aos docentes que não se sentem capacitados para executar o seu trabalho directamente com crianças poderem dar outro tipo de apoio nas escolas a que estão agregados.           Este número representa, num universo de 2503 professores, 4,5%, o que nos levará a reflectir sobre o papel da escola, o papel da educação e essencialmente sobre o papel de cada um de nós enquanto, professores, pais, cidadãos de uma sociedade que sofre constante mutações obrigando-nos também, quer queiramos, quer não, a transformar as nossas condutas e adequá-las, sem que muitas vezes nos interroguemos sobre a forma como o estamos a fazer.

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