Edição Nº 66, 05-Abr.99
CRÓNICA DE OPINIÃO
por Carmen Francisco (deputada do Partido Ecologista “Os Verdes”)
Uma situação insustentável
no Porto de Sesimbra
Uma delegação do Partido Ecologista “Os Verdes” visitou, no âmbito de uma visita ao distrito de Setúbal, no passado dia 23 de Março, a zona de construção naval do Porto de Sesimbra. Aquilo que vimos deixou-nos perfeitamente abismados e, simultaneamente, convictos de que a situação é incomportável para os construtores navais que legitimamente utilizam aquele espaço. É incompatível ao nível da segurança e do ambiente. A situação não é nova, o que ainda a torna mais grave. Aquilo com que nos deparámos foi com a usurpação de grande parte da totalidade do espaço destinado à construção e reparação naval em madeira por uma empresa de construção naval em aço. Uma empresa que em nada presta serviços à comunidade piscatória sesimbrense.
O modo como pessoas, embarcações e materiais estão encafuadas num espaço assim tornado exíguo, coloca várias questões relacionadas com a segurança. Desde logo, a existência num local assim densamente “povoado” de uma grua, que transporta chapas de aço, a que os construtores chamam “guilhotinas”, por pairarem por sobre as cabeças de toda a gente.
Um acidente com a grua já aconteceu a 12 de Fevereiro, tendo esta caído, sem que, até à data, se reconheça o apuramento de quaisquer responsabilidades por parte dos responsáveis, a Administração do Porto de Setúbal a Sesimbra.
A responsabilidade da APSS é a de quem gere o espaço, permitindo a manutenção de uma situação a todos os níveis ilegal. Ilegal porque aquele não é um estaleiro naval. É um espaço destinado a dar o apoio indispensável à frota pesqueira sesimbrense. Ora a Tecnogomes, a empresa em causa, constrói embarcações que nada têm que ver com este propósito.
Ilegal porque a Tecnogomes permanece naquele espaço sem para tal ter licença. A licença provisória de que dispunha, para poder consertar uma embarcação naufragada em Sesimbra há anos, há muito que caducou. Ilegal porque, não estando licenciada não foi obrigada a construir e manter instalações de apoio para os seus trabalhadores, não é obrigada a manter equipamentos de segurança, ao contrário do que acontece com todos os construtores navais em madeira, os quais tiveram de fazer investimentos nestas áreas para poderem trabalhar. Situação ilegal porque se nota no espaço a inexistência de regras para o acomodar dos materiais. Porque existem dois depósitos de materiais inflamáveis onde não deveriam existir. Para além de perigosa, para além de causar sérios prejuízos aos legítimos utilizadores do espaço, a situação tem óbvias implicações ao nível do ambiente. A zona de construção naval é contígua à praia de Sesimbra e a uma área residencial. Pela natureza dos materiais utilizados, pelas operações de decapagem, pelo ruído envolvido, não é seguramente uma zona indicada a um estaleiro naval. Acresce que a empresa Tecnogomes não tem instalados equipamentos e mecanismos de minimização dos impactes ambientais causados pela sua actividade. Não pode ser assim que se gere um porto. Não pode ser assim que se apoiam as actividades tradicionais, como a pesca e as que lhe estão associadas. Não é assim que se consegue oferecer um turismo de qualidade. Pela nossa parte, pressionaremos o governo para que actue no sentido de devolver aquele espaço à sua vocação inicial, a de apoio à actividade piscatória em Sesimbra, melhorando as condições de segurança e ambientais. [email protected]