[ Edição Nº 84] – Mata Cáceres, presidente da Câmara Municipal de Setúbal.

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Edição Nº 8409/08/1999
Se os interesses de Setúbal forem acautelados
Mata Cáceres apoia recuperação da Torralta

          Apesar de ver com bons olhos a recuperação do complexo turístico da Torralta, em Tróia, o presidente da Câmara de Setúbal, o socialista Mata Cáceres, não deixa de ‘torcer o nariz’ a alguns pontos do projecto. É que, entre outros pontos, o edil receia a criação de impedimentos ao usufruto das praias, por parte da população em geral , razão pela qual já fez sentir esta preocupação junto das entidades competentes. A construção da marina de Tróia em Setúbal parece-lhe uma mais valia para o concelho, mas rejeita a construção de estacionamento só para os turistas. Por isso, já negociou com a Sonae a utilização do espaço pela população da cidade.


Setúbal na Rede

– Como é que vê o projecto da Sonae para a recuperação do complexo turístico da Torralta, em Tróia?

Mata Cáceres

– A aplicação deste projecto de recuperação do complexo é muito importante a vários níveis, e vejo-o com muito bons olhos porque vai reabilitar toda aquela área, captando assim os turistas e o investimento. No geral, isso significará uma mais valia para o desenvolvimento turístico do país e para a criação de postos de trabalho no distrito.

SR

– Que benefícios é que a cidade de Setúbal pode tirar disso?

MC

– Ainda é cedo para saber dos benefícios para Setúbal, que fica na outra margem do Sado. No entanto, já se percebe o que é que Setúbal poderá perder, e por essa razão mantenho algumas reservas quanto a alguns dos pontos deste projecto de recuperação e ao Plano de Urbanização de Tróia. É o caso das praias, que não devem ser retiradas à população do lado de cá do rio, visto que Setúbal sempre teve uma grande tradição no usufruto daquela península.

É que, para além das formas directas de evitar que os cidadãos utilizem as praias de Tróia, como foi o caso da instalação da cerca em volta, há já alguns anos, existem formas indirectas e mais subtis, como poderá ser esta ideia de mudar o cais de embarque dos automóveis para a zona dos Fuzileiros, e depois proibir o trânsito automóvel para a ponta de Tróia. Isso desmotiva as pessoas, porque irá obrigá-las à utilização de transportes públicos que levam mais de 20 minutos para chegar às praias.

SR

– O que é que Câmara tem feito para evitar o cenário que referiu?

MC

– Temos de ir com cuidado, porque não temos intervenção directa nesta matéria, visto ser negociada entre a Câmara de Grândola, os investidores e o Governo. No entanto, já fizemos sentir estas preocupações, junto dos intervenientes neste processo, de modo as coisas sejam acauteladas a tempo. E esperamos que assim seja, porque a população de Setúbal tem direitos a defender nesta matéria.

E não deixo de lamentar a posição do PCP nesta matéria tão importante para Setúbal, que permitiu que um funcionário daquele partido mandasse calar a vereadora do Urbanismo, durante uma sessão de esclarecimento sobre o Plano de Tróia, promovida pela Câmara de Grândola e pela Associação de Municípios do Distrito, em Setúbal. Mandou-a calar, com muita rudeza e má criação, só porque a vereadora colocou publicamente a questão do acesso dos setubalenses a Tróia. Isto mostra como eles podem ser cegos e não ligar nenhuma aos interesses da população, quando um projecto deste tipo envolve uma autarquia comunista.

SR

– Está preocupado com as mudanças que se verificarão na zona ribeirinha, quando for criada a marina de Tróia e o estacionamento para os turistas?

MC

– Esse é um outro assunto que nos preocupa, e pelo qual temos estado em negociações. É que, se por um lado recebemos bem a marina, que nos traz grandes mais valias, por outro temos de acautelar a questão da utilização do estacionamento. Ou seja, não admitimos que o espaço a criar seja utilizado apenas pelos turistas de Tróia, pelo que negociámos também a utilização do equipamento por parte da cidade de Setúbal, que muito precisa.

SR

– É favorável à ideia de criar um estacionamento em silo alto, feito em betão, numa zona que a Câmara pretende que seja um espaço aberto de lazer?

MC

– A equipa de arquitectos que estiver com este assunto em mãos terá de ter em conta todos esses aspectos, e por isso acredito que as coisas poderão ser conjugadas. Mas, para já, o que queremos é garantir que, pelo menos um terço do espaço desse estacionamento seja para a população de Setúbal. E acho que isso está garantido, depois de alertadas as entidades oficiais, porque não fazia sentido haver a tentação de utilizar a zona ribeirinha, que é de todos, apenas para o usufruto de alguns.

SR

– Como é que Setúbal se está a preparar para acompanhar o desenvolvimento de Tróia, nomeadamente ao nível da oferta turística e da mão de obra?

MC

– Estamos a desenvolver os projectos para a recuperação de toda a zona ribeirinha da cidade, envolvendo mudanças radicais naquela área por forma a que se possa desfrutar do rio e, ao mesmo tempo, dos diversos tipos de equipamentos de lazer a instalar. Ao nível da mão de obra, estamos já a preparar tudo para a formação de novos profissionais nesta área, que poderão ser absorvidos pelo complexo turístico de Tróia e pela própria hotelaria do concelho. Assim, estamos a preparar a entrada em funcionamento, dentro de cerca de um, ano, da Escola de Turismo. Ficará instalada no edifício do antigo Regimento de Infantaria 11, será a maior escola do género no país, custa dois milhões de contos e terá uma capacidade inicial para 600 alunos.

SR

– As áreas do concelho que não são tão influenciadas pelo turismo também vão ser beneficiadas com investimentos?

MC

– Costumo dizer que estamos a preparar o concelho para o terceiro milénio, por isso temos projectos para Setúbal inteira. Ou seja, neste mandato temos feito um esforço gigantesco para desenvolver trabalho e o resultado é, finalmente, a construção da Estação de Tratamento de Águas Residuais, que irá evitar mais poluição no rio Sado. A construção começa no final deste ano e serão investidos ali mais de três milhões de contos. Temos vindo a renovar boa parte da rede de saneamento básico e da rede de abastecimento de água, onde gastámos mais de três milhões de contos.

Até ao final do mandato vamos investir mais, quer para terminar estes trabalhos quer para arrancar com os parques verdes que faltam, como é o caso do da Algodeia e do Parque da Várzea. Ao nível do desporto, temos sete campos desportivos com qualidade, já assinámos os documentos para a construção da pista de atletismo, temos duas piscinas municipais a funcionar e uma terceira em construção. Para além disso, continuamos a investir na construção de habitações sociais para erradicar, de vez, os bairros de barracas do concelho, e na recuperação do património, como é o caso do Convento de Jesus. Na área dos serviços ao cidadão conseguimos do Governo a garantia de instalação de uma Loja do Cidadão, vamos ter uma nova Biblioteca Municipal, um novo Arquivo Distrital e um Centro de Ciência Viva, apoiado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia.

SR

– Que leitura faz das críticas da oposição que, face aos investimentos governamentais, diz que o executivo estará a beneficiar a Câmara por ser socialista?

MC

– Isto não tem nada a ver com compensações, mas sim com muito trabalho reivindicativo da Câmara, junto do poder central. E embora tenha conseguido vitórias, ainda acho que perdemos algumas coisas, como foi o facto de não termos conseguido negociar com sucesso, o financiamento para a recuperação do Cinema Charlot e do Cine-Teatro Luísa Todi. Não percebo a crítica porque não me revejo nela, aliás, tudo o que temos conquistado tem sido à força de muita pressão e negociação com o Governo. Por outro lado, esse argumento, geralmente utilizado pelo PCP, também serviria para as câmaras comunistas. É que eu também podia dizer que há uma beneficiação, por exemplo, da Câmara de Almada, por ter conseguido 400 mil contos para o Cine- Teatro.

No nosso caso, tem funcionado a legitimidade das reivindicações que fazemos, com a autoridade que adquirimos ao longo de muitos anos de luta a favor da melhoria da qualidade de vida.

SR

– Com as eleições legislativas à porta, e sendo candidato a deputado pelo PS, o ritmo de trabalho da Câmara irá diminuir?

MC

– Nem de longe, porque apesar de ter de cumprir a lei e pedir a suspensão de mandato no dia 27 de Agosto, altura em que o PS faz a entrega formal das listas distritais, está tudo preparado para continuar o mesmo ritmo de trabalho. E não deixo o trabalho por muito tempo, porque tenho que vir cá frequentemente para ver como estão as coisas e acompanhar o andamento dos projectos.

SR

– O facto de se empenhar directamente na campanha eleitoral, quer dizer que acredita nesta lista e no seu líder, Jorge Coelho?

MC

– O meu empenho nestas eleições vai muito para além do facto de eu próprio ser candidato a deputado, primeiro porque acredito nesta lista, e segundo porque acredito muito nas capacidades de Jorge Coelho. Acho que é um cabeça de lista bem escolhido, é um político frontal e empenhado em trabalhar a sério em tudo o que se propõe fazer. Tem todo o meu apoio porque sei que, embora não seja de Setúbal, conhece muito bem toda esta realidade, é um grande democrata e um homem de acção. E o facto de ser um homem de acção é muito importante, porque a melhor forma de aplicar a política de esquerda é ter gente de acção que resolva os problemas no terreno.

Entrevista de Etelvina Baía
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