Edição Nº 91 • 27/09/1999 |
Capucho quer lobby pelo distrito de Setúbal
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– Porque é que aceitou liderar a lista do PSD por Setúbal? António Capucho – Aceitei porque é um distrito relevantíssimo no quadro das eleições legislativas e pela importância que tem como terceiro círculo nacional. Este distrito representa uma potência económica dentro do país. Temos três deputados por Setúbal, portanto a meta é eleger um quarto deputado. Ao fazê-lo, estamos a contribuir para a vitória do PSD a nível nacional de uma forma decisiva. E isso significa que, a haver o mesmo crescimento a nível nacional a vitória está assegurada ao nível do país. SR – Como é que vê o distrito em relação ao todo nacional? AC – O distrito sofre de custos de proximidade e há razões para isso. Quando combatemos a regionalização o grande argumento era de que a península de Setúbal seria a área mais prejudicada pelo centralismo de uma região de Lisboa e Vale do Tejo. Seja como for, Setúbal tem potencialidades próprias, massa crítica e infra-estruturas que lhe podem proporcionar um desenvolvimento sustentado sem uma permanente dependência das deliberações feitas em Lisboa. Não apenas feitas em Lisboa por terem como origem o Governo central, mas sediadas em Lisboa por terem como origem delegações de âmbito regional, como é o caso de delegações de alguns ministérios, que podemos deslocalizar para Setúbal. SR – O que é que falta para que Setúbal se desenvolva? AC – O distrito não se basta a si próprio nem pode deixar de se articular com a Área Metropolitana de Lisboa. No entanto, pode ser mais autónomo no seu desenvolvimento. A deslocalização dos serviços é uma das facetas dessa autonomia porque facilita o contacto da sociedade civil com a administração pública. É preciso que as decisões que passam pelo executivo central tenham em conta a realidade de Setúbal e o exemplo mais recente é o do aeroporto. Se a opção deste Governo não passa por Setúbal, pergunta-se qual é a alternativa como pólo de desenvolvimento. E a isto o Governo responde zero. Aqui está um caso em que os deputados eleitos por Setúbal podem ter um papel determinante, nomeadamente se actuarem em conjunto. Não posso ignorar que há sempre um certo vínculo dos deputados do partido que está no poder, com as orientações gerais desse Governo. Sabe-se que as coisas passam por uma certa disciplina partidária mas há limites a essa submissão. Na última legislatura, os deputados do PS foram totalmente submissos às orientações do Governo. Nós, não só não assumiremos essa submissão como estamos dispostos a trabalhar na defesa dos interesses de Setúbal, ao lado dos deputados dos outros partidos, estando nós no Governo ou na oposição. SR – Propõe um pacto entre os deputados de todos os partidos, eleitos por Setúbal? AC – Só poderemos ajudar o distrito se os deputados definirem na Assembleia da República, sem complexos, esta realidade: temos diferenças ideológicas mas todos temos a obrigação de defender os interesses de Setúbal e entendo que, em articulação com as associações mais representativas da sociedade civil, é perfeitamente possível chegar a consenso sobre um modelo de desenvolvimento. Posto isto, e a nossa disponibilidade é total, temos desde logo à nossa frente um conjunto de instrumentos fundamentais que se repetem anualmente e que aparecem episodicamente. Anualmente, no Orçamento de Estado e episodicamente a propósito da legislação que possa interessar ao distrito. Assumimos esse compromisso aqui, publicamente, porque é fundamental que os deputados eleitos pelo distrito reunam com as associações representativas, com as autarquias e com representantes dos outros partidos para tentarmos encontrar um consenso para defendermos o distrito junto do Governo. Qualquer investidor sabe que tem em Setúbal condições únicas para apostar. Com as infra-estruturas existentes e a construir, nomeadamente as redes viária e ferroviária, com o desenvolvimento das potencialidades dos portos de Sines e de Setúbal, com a proximidade dos mercados nacionais e internacionais há todas as razões para se apostar neste distrito. O fundamental é criarmos condições, em termos de liderança do país, com vista à criação de incentivos ao investimento para que se possa diversificar. SR – Preocupam-no questões como o desemprego provocado pela Lisnave, os receios de problemas ambientais na reabilitação da Torralta e as queixas de desajustamento do novo comboio à realidade do distrito? AC – O grande problema do comboio é que, até agora, não proporcionou uma redução significativa do tráfego automóvel na ponte 25 de Abril, o que é preocupante. E isso acontece pelas dificuldades que os utentes encontram relativamente aos preços. Há que rever essa situação e também a das questões do estacionamento junto às estações a preços acessíveis. Isto, a juntar às tarifas que são muito superiores aos outros transportes públicos, são matérias que têm de ser revistas rapidamente. E as portagens da ponte 25 de Abril também têm de ser revistas porque é insustentável manter os preços actuais. Quanto à Torralta, conheço aquela zona e é para mim uma dor de alma ver ao que está reduzido aquele pedaço de paraíso. Por isso entusiasmam-me muito, com todas as cautelas, os projectos que possam conduzir a uma reabilitação de Tróia. Isso pode favorecer a criação de postos de trabalho e ser um pólo de desenvolvimento turístico do distrito. Fiquei muito agradado com o facto de ver professores de ambiente, como Joanaz de Melo, ligados ao projecto de Tróia e acredito que são um garante da qualidade ambiental. E fiquei com a salvaguarda de que as praias não vão ser retiradas aos setubalenses, pelo contrário, as condições de acesso e de usufruto oferecerão muito melhor qualidade. No que diz respeito à Lisnave, não podemos ‘forçar a barra’ no sentido de pretender que as indústrias que necessitam de redimensionamento se mantenham num tempo que já não existe. Aguardamos com toda a atenção que os projectos em curso se desenvolvam com todo o respeito pelo estuário do Sado, para onde vão passar os estaleiros de Almada, e com o máximo respeito pelos direitos dos trabalhadores. SR – Como é que o PSD pretende combater o desemprego em Setúbal? AC – O distrito continua a ter o dobro da média nacional de desemprego e aqui conta muito o desemprego de longa duração que passou de 32% para 43% do total, o que é uma brutalidade. No programa eleitoral do PSD dizemos que iremos reduzir em média o IRS para 10% e isso pode ser feito, pelo que assumimos inteira responsabilidade. Já quanto a um dossier como o do desemprego é impossível quantificar sem, novamente, nos debruçarmos sobre ele. E neste momento não há elementos suficientes para podermos dizer o que faríamos. No entanto, insisto muito neste aspecto: numa economia de mercado a maneira de criar emprego é através do investimento e da criação de condições favoráveis a esse investimento. E é essa a preocupação fundamental do PSD. SR – Tendo o litoral alentejano problemas diferentes do resto do distrito, que medidas preconiza o PSD para aqueles quatro concelhos do litoral alentejano? AC – A grande aposta é na qualidade da agricultura e no desenvolvimento do turismo diversificado. Trata-se de um produto com uma crescente procura no país e no estrangeiro. Este desenvolvimento atrairia massa crítica para a região mas de uma forma complementar porque este desenvolvimento não pode ser dissociado do porto de Sines e das potencialidades industriais que decorrem da existência de um porto com aquelas condições e das próprias acessibilidades. Ou seja, quem investir industrialmente no litoral alentejano conta com condições de acessibilidade aos grandes centros urbanos e com a ligação à Europa através de Espanha. Mas para que o investimento se dê, há que ter em conta as especificidades daquela área e, por isso, os programas de incentivos têm que ser orientados consoante a natureza da própria região. O PSD tem uma filosofia genérica para isso, mas depois não pode deixar de se particularizar consoante os problemas. A filosofia genérica tem muito a ver com as isenções do ISC para as pequenas e médias empresas que se fixem no interior, e os concelhos do litoral alentejano podem beneficiar muito disso. Especialmente empresas com facturação inferior 100 mil contos por ano. SR – Que apreciação faz aos cabeças de lista dos outros partidos? AC – Não quero resvalar para apreciações de carácter pessoal e faço aqui uma ressalva de que tenho o maior respeito e consideração por todos os outros candidatos. Em relação a Jorge Coelho, está a fazer uma campanha que não entendo correcta na medida em que está a socorrer-se da máquina governativa para convencer o eleitorado. De resto, toda esta campanha eleitoral está algo viciada pela forma abusiva como o Governo se vale da sua situação e dos instrumentos de que dispõe. E embora alguns digam que não, é claro para todo o país o aproveitamento descabelado que está a ser feito da questão de Timor Loro Sae. Não é preciso vir o antigo bispo de Setúbal, Dom Manuel Martins, denunciá-lo porque este aproveitamento salta à vista de todos. Em relação a Octávio Teixeira, é alguém de grande competência e qualidade. Encabeça uma lista que já deu provas de combatividade no parlamento, mas é uma lista representativa do PCP e está nas antípodas do PSD, em termos ideológicos. Quanto ao PP, parece-me uma aposta relativamente desgarrada, pese embora o respeito que tenho por Rosado Fernandes, que não acredito que consiga repetir a proeza do saudoso Kruz Abesasis. Mas se o conseguir, não acredito que seja um deputado muito representativo do distrito. Em relação ao Bloco de Esquerda, é uma presença que saúdo porque acho negativo que a esquerda radical esteja dispersa em pequenos partidos. É interessante ter conseguido centrar-se em pessoas com peso político e considero-o uma lufada de ar fresco. Saúdo democraticamente a presença organizada de uma força à esquerda do PCP, nas eleições, que me parece interessante para inquietar as pessoas e nos chamar à responsabilidade. As sondagens apontam para a possibilidade de elegerem um deputado e acho preferível que a extrema esquerda tenha uma representação no parlamento do que a tenha apenas na rua. Não nos disputa o eleitorado e, portanto, o PS e o PCP que se cuidem em relação ao Bloco de Esquerda. |
Entrevista de Etelvina Baía [email protected] |