[ Edição Nº 94] – Ambientalistas contra queima de produtos com dioxinas na Secil da Arrábida.

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Edição Nº 9418/10/1999

Apesar da Scoreco afastar receios
Partidos e ecologistas contra dioxinas na Secil

          A queima de produtos com dioxinas nos fornos da cimenteira da Secil, na Arrábida, “é ilegal” porque “está completamente desenquadrada das decisões governamentais sobre a gestão de resíduos perigosos”. A denúncia é da associação ambientalista Quercus, no que é secundada pelo PCP e pelo Partido Ecologista Os Verdes. No entanto, a empresa responsável pela cimenteira, a Scoreco, afirma que os receios são infundados.

A denúncia de alegadas ilegalidades no processo que tem em vista a queima de seis toneladas de produtos alimentares, importados da Bélgica, suspeitos de conterem dioxinas, partiu de Rui Berkemeier, engenheiro do ambiente da associação ambientalista Quercus, como reacção à notícia avançada pelo jornal “Expresso”.

Este responsável contou ao

“Setúbal na Rede” que a presença das dioxinas terá sido confirmada pela recusa da empresa Valorsul – gestora da central de incineração da Grande Lisboa – em destruir os produtos por se tratar de resíduos perigosos.

Berkmeier diz-se preocupado com a possibilidade de queima dos alimentos na Secil, porque “não existem garantias” de que o processo de incineração tenha qualquer qualidade tendo em conta que esta cimenteira, tal como todas as cimenteiras do país, “não se encontra preparada para a

co-incineração”.

E embora admita que a quantidade de alimentos a queimar não emita dioxinas suficientes para causar problemas à qualidade do ar, o engenheiro do ambiente da Quercus continua a ser contra tal possibilidade porque “vai contra tudo o que se tem decidido sobre a co-incineração“.

Relembrando que a cimenteira da Secil “nem sequer está na lista das que irão receber os resíduos tóxicos“, Rui Berkmeier teme ainda que este “caso pontual” seja uma ‘porta aberta’ para outros casos pontuais, levando mesmo à generalização destas queimas. Por isso, defende o reenvio dos produtos para o país de origem e garante que vai exigir explicações ao Governo, através do Ministério do Ambiente, que terá já dado autorização para a incineração destes resíduos com dioxinas.

Uma posição que é secundada pelos dirigentes do Partido Ecologista “Os Verdes”, que no dia 14 de Outubro desencadearam uma acção de protesto junto à Secil, instalada no Parque Natural da Arrábida. É que, segundo conta a deputada Heloísa Apolónia, a decisão “representa um atentado à saúde pública” e à zona protegida da Serra da Arrábida.

Para tentar travar esta processo, os deputados de Os Verdes alertaram o Presidente da República e enviaram uma carta aberta ao Primeiro Ministro, solicitando uma intervenção urgente. Para além disso, é intenção de Heloísa Apolónia, levar o assunto a discussão na Assembleia da República.

Scoreco desdramatiza

Segundo o

“Setúbal na Rede” apurou, o caso tem vindo a desenvolver-se longe da opinião pública e das autoridades locais, de tal maneira que nem o Parque Natural da Arrábida tinha conhecimento da matéria. De acordo com fonte ligada ao PNA, esta entidade desconhecia o assunto, mas mesmo que o conhecesse pouco poderia fazer dado que as decisões finais são do foro do Ministério do Ambiente.

Quem também não sabia de nada era o executivo da Câmara Municipal de Setúbal, que na sessão pública da semana passada foi alertado pela oposição comunista na autarquia, na sequência da denúncia feita pela Direcção da Organização Regional de Setúbal (DORS) do PCP. E embora a autarquia setubalense não tenha responsabilidades nesta matéria, o presidente da Câmara, Mata Cáceres resolveu incumbir o vereador do pelouro do Ambiente, Mota Ramos, da recolha de informações sobre o assunto.

Quem não está preocupado com a situação é o consultor de ambiente da Scoreco, José Manuel Palma, que garantiu ao

“Setúbal na Rede” não haver razões para “tanto receio”. E a este propósito diz ainda lamentar “todo o aproveitamento político” em volta desta matéria que considera pacífica.

É que, segundo afiança José Manuel Palma, em causa estará “alguma confusão” instalada em volta dos alimentos deteriorados “com possibilidades” de conterem dioxinas que “noutros países tiveram de ser queimadas”. Garantindo que a cimenteira “não tem interesse” por este tipo de resíduos, o consultor da Scoreco afirma que a Secil “aceitou a tarefa porque se trata de um serviço a prestar ao país”.

Questionado sobre as razões que terão levado o Instituto de Resíduos a afirmar que a queima, prevista para esta semana, irias ser adiada por mais uns dias, José Manuel Palma diz que esse adiamento estará relacionado com a divulgação das análises entretanto feitas aos alimentos.

No entanto, esclarece que as análises nada têm a ver com as dioxinas, uma vez que essas não constituem problema tendo em conta que, dada a pequena quantidade de alimentos em causa, “os fornos queimam tudo sem prejudicar o ambiente”. É que, segundo garante “não há dioxina que resista aos mais de 1500 graus de temperatura”, uma vez que “não aguentam mais de 1100 graus“.

As análises em causa, segundo adianta o consultor ambiental da Scoreco, relacionam-se com a composição dos próprios alimentos, de maneira a que a queima se dê de maneira a não prejudicar a composição do cimento feito na fábrica da Arrábida.

Em todo este processo, José Manuel Palma não deixa de lamentar “as asneiras” proferidas “por quem não conhece o assunto”, que deveria estar mais preocupado com “as toneladas de lixos tóxicos espalhados por todo o país” e cujo tratamento continua sem solução.

As seis toneladas de alimentos suspeitas de estarem contaminadas com dioxinas terão sido importadas da Bélgica em meados de Agosto e estão armazenados em Alverca à espera de serem destruídos. Os produtos eram destinados ao mercado nacional e foram retirados de circulação devido à sua deterioração.

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