[ Edição Nº 106] – “O Diário de Lina” – parte II.

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10 de Dezembro

(A minha alma está cinzenta e o sono não vem)

Querido diário:

Hoje é a segunda vez que te falo. São três da manhã e não há meio de adormecer. Fiquei a pensar naquela cena do Américo no elevador e no que te disse ao terminar o meu relato, sabes? Aquilo… que ele até nem é má pessoa e… as mãozinhas de informático que ele tem. Oh! Meu querido amigo diário! Como posso ter escrito o que escrevi? Como posso escrever palavras simpáticas sobre aquele monstro? Sim, monstro! Pois ele não é casado e pai de filhos? Então se ele faz o que faz comigo, enganando a mulher… se fosse eu a sua consorte, a sua mulher, não me faria o mesmo? Quem sabe até se não seria com a sua actual esposa!!! Ah, os homens, os homens! Sempre prontos a dar a estocada, esquecem tudo quando vêm um par de pernas boas como as minhas (modéstia à parte), não têm o mínimo respeito pelo Amor! Traem como quem toma uma bica ao balcão! E são tão estúpidos que mesmo tendo a Lady Dy em casa preferem sempre uma Gina qualquer da rua. Bem, a Lady Dy também não é o melhor exemplo mas… mas também o Carlos é que começou, lá com a outra, acho eu! Com aquela Camela.. Carmília ou não sei quê.

Mas quero que sejas testemunha, querido diário, do meu arrependimento pelos pensamentos ligeiramente lúdicos lúbricos que me assaltaram ao pensar no assédio Américano no elevador.

Diz-me querido diário: será que são mesmo TODOS como o Américo? Uns sebosos, uns alarves sem sensibilidade que parece que olham para as minhas pernas como quem olha para um presunto de Chaves, para os meus peitos como para um peito de peru recheado, para a minha boca desejosa de paixão sincera como para um algodão doce da Feira Popular?

Bem, na verdade não posso negar que me fascinam aquelas mãozinhas de informático, tão delicadas e sem calos de esferográfica. Só pelas mãos quase poderia pensar que ele seria um possível príncipe. Só que não é o meu príncipe. Estou farta de príncipes das outras! Parece que atraio os homens comprometidos.

Agora até o Camané deu em ficar pelo beicinho com aquela lambisgóia da Cátia! Sim, que ele não me atira areia para os olhos! Pode dar-me murros nos olhos, como daquela vez, lembras-te, em que ele queria que eu fizesse certas porcarias com ele e eu me recusei? É que eu posso não resistir às vezes mas tudo tem limites e mesmo quando estou em brasa só vou até um certo ponto. Acho que esse ponto até tem um nome mas não me lembro bem… não sei se é o ponto crítico ou se é o ponto-cruz… Acho que é o ponto-cruz porque é quando a gente tem que cruzar as pernas para a coisa ficar por ali e não se vir a arrepender depois.

Além disso tu sabes, meu Diário, que eu não consigo mesmo fazer certas coisas porque estou sempre a pensar que está Nosso Senhor lá em cima a espreitar e a tomar nota no caderno para mandar pôr mais umas brasas no sítio do Inferno para onde me vai mandar se eu fizer maldades e coisas feias. Eu sei que Ele não deve ter tempo para estar a espiar os milhões de pessoas em todo o mundo, vinte e quatro horas por dia cada um… mas com o azar que eu tenho até aposto que a mim me apanhava sempre quando me viesse espreitar. Olha… foi assim que me educaram e não me consigo livrar dessa sensação de absorção.

Ai ai… Mas já estou a ficar com sono. Vês? Faz-me bem desabafar contigo. Bolas! Já são quase quatro horas da manhã e vou ter que me levantar às sete e meia. Pois é, mas areia para os olhos é que ele não mamanda ma manda me atira.

Até logo meu único e fiel amigo. Quem me dera conhecer um homem como tu, assim meigo, deixando-me tocar-te como eu quero, assim educado sem nunca discutir, assim pronto a ouvires as minhas confidências, assim pacato sem sair à noite para o café dos bilhares e dos matrecos com os amigalhaços.

PS: juro que já esqueci as mãozinhas de informático do Américo.

PT: Mas o Camané há-de cá vir comer à mão!!! Ai não que não áde háde há de… vai vir, vai vir.

PU: Amanhã vou almoçar com o Arlindo, lá do curso. Que me irá dizer?

PV: Que raio quererão dizer estes P qualquer coisa que tem que se pôr quando se acrescenta uma coisa que nos esquecemos?