Querido diário:
Na semana passada, disse para cá para comigo: “Chega de indecisões!”. E filiei-me. Tomei a decisão em frente da televisão, sintonizada na SIC, embevecida com os discursos arrasadores do Pedro (não percebo por que razão não puseram a marca indicativa do DOT no canto do écran). E filiei-me, hoje mesmo, com um desejo imenso de que o Pedro ganhe o próximo Congresso, vá a eleições legislativas e chegue a Primeiro Ministro. Não há-de ser difícil ganhar o Partido àquelas alimárias, sem chama nem brilho. O actual líder parece um bébé-chorão, com aquele ar de puto mimento, embirrante e trapalhão, tipo filho único, sempre zangado com tudo e com todos. O baixote, então, é de morrer a rir! É uma pãozinho sem sal. Faz-me lembrar o Topo Gigio, sempre aos saltinhos de um lado para o outro, querendo ser muito engraçado, mas sem conseguir ter piada nenhuma. O Pedro é diferente. É charmoso, fino, um autêntico cavalheiro, com um olhar que nos penetra alma adentro. Ali há garra, utopia, querer, sentimento, coerência. Há-de ir longe, se Deus quiser.
Filiei-me porque, hoje em dia, não se é ninguém nem se chega a lado nenhum se não se tiver o cartãozinho de um partido. É verdade que, por enquanto, são os outros que estão a mandar e a gerir os cartões e os respectivos empregos. Mas a mama está prestes a acabar! Em breve, a vaca cansa-se das bocas ávidas dos mesmos de sempre e começa a pensar em dar de mamar a outros (aos nossos, queira Deus!). Que se cuidem aqueles que julgam que são os donos das melhores mordomias e que podem viver sem sobressaltos às custas das cunhas que lhes arranjaram os amigalhaços. O Pedro vai pô-los na ordem! É verdade que ainda lhe falta ganhar o Congresso ao bébé-chorão, coisa que não vai ser fácil enquanto o Topo Gigio andar por ali a atrapalhar. Mas, uma vez ganho o partido, o país será dele! Aí se verá, então, que cartão conta mais: se o dos mamões que lá estão neste momento, se o meu, novinho em folha e sedento de um mamilo da vaquinha, por mais pequenino que seja!
Por enquanto, vou sonhando e contentando-me com o emprego de segurança lá no centro comercial. Mas já estou pelos cabelos com as faltas de respeito dos meus colegas, autênticos rambos analfabetos que por lá se arrastam, a passear as fardas, sem fazer nenhum e a fingir que metem medo aos ladrões. Não vejo o dia de iniciar funções como segurança num ministério, ou mesmo como secretária de um ministro. Quem sabe, até do futuro Primeiro Ministro. Estou mesmo a ver-me, jovem, entusiástica, desenvolta, farda sexy a moldar-me as belas curvas que Deus me deu, a guardar a antecâmara do gabinete do Pedro, prontinha para dar tudo por ele, e, assim, servir o Partido e o País.
O Camané é que não gostou nada que me tivesse filiado no Partido. Chamou-me parva, ignorante, deslumbrada e mulher do povo. Afiançou-me que os políticos eram todos iguais, que usavam argumentos diferentes para chegar ao poder, mas, uma vez lá, acabavam todos a fazer a mesma coisa: gerir interesses e dar poder e riqueza aos mesmos de sempre. Irritei-me com ele, claro! Acho que ele está invejoso, de má fé e ressabiado. No fundo, de nada lhe serve ser simpatizante do partido que está no poder. Vota neles, à semelhança do que vão fazendo milhões de eleitores ingénuos, mas não tem cartão. Tivesse ele essa chave mágica e todas as portas que dão acesso à arca do tesouro lhe seriam abertas. Assim, puro e independente como diz gostar de ser, só pode aspirar a ser um parvo útil, apaparicado quando se aproximam as eleições, anónimo e desprezado logo que as urnas dão legitimidade aos senhores que distribuem benesses ao clube restrito dos titulares dos cartões.
Finalmente, há uma promessa de futuro na minha vida. Calcula, querido Diário, que já me distribuíram um balde, um rodo e cola líquida: amanhã, vou começar a colar cartazes do Partido!
Lina