Edição Nº 114 • 06/03/2000 | |
MEMÓRIAS DA REVOLUÇÃO |
|
(Manifestação de esquerda contra comício do PPD em Setúbal) |
|
Esquerda contra comício do PPD No dia 7 de Março de 1975, centenas de manifestantes de esquerda invadiram o Clube Naval Setubalense para impedirem a realização de um comício do PPD. A polícia interveio e os confrontos levaram Setúbal ao rubro. 25 anos depois, Ricardo Botas, então oficial miliciano no Regimento de Infantaria 11 e membro da Assembleia do MFA, recorda os confrontos entre manifestantes e a polícia, dos quais resultou um morto e o descrédito da PSP de Setúbal. |
|
– Onde é que estava no dia 7 de Março de 1975? Ricardo Botas – Estava no Clube Naval Setubalense, em Setúbal, na noite do comício do PPD. Foi um comício bastante contestado pelas forças políticas de esquerda, uma vez que há 25 anos Setúbal era considerada a cidade vermelha. O comício foi de tal forma um motivo de efervescência que nos dias anteriores andou a preparar-se a contestação à presença dos dirigentes do PPD em Setúbal. SR – O que é que o levou ao comício? RB – Fui observar. Na altura estava na tropa, onde era oficial miliciano e estava ligado ao Movimento das Forças Armadas. Estava vestido à civil e fui até ao Naval para ver como estavam as coisas porque antes tinham ocorrido manifestações contra o comício. Lá dentro havia muito pouca gente do PPD e não era de admirar porque, numa altura como aquela, em que a contestação já estava anunciada, fazer um comício daqueles em Setúbal era mais para gente muito ligada àquele partido. Portanto, estiveram lá cerca de 300 pessoas do PPD e quase outras tantas de contra-manifestantes. Depois do comício se ter iniciado, os contra-manifestantes entraram no Naval gritando palavras de ordem e a partir daí gerou-se a confusão. Houve algumas manifestações de arrogância de uma parte e de outra e também do serviço de ordem do PPD. Penso que não foi nada premeditado, terão sido mais reacções e contra-reacções ao que se passava. Quando os manifestantes entraram, ocorreu também a intervenção das forças policiais para os retirar de lá e gerou-se a confusão. A polícia conseguiu retirá-los e eles revoltaram-se, houve troca de insultos e tentativas de agressão de ambas as partes. SR – A partir daí, que rumo tomaram os acontecimentos? RB – As ruas perto do Naval foram palco de uma autêntica guerra civil. Depois da entrada dos contra-manifestantes o comício acabou, aliás, penso que nunca terá chegado a começar. Depois da polícia os ter retirado de lá, foram todos para a rua e houve tentativas de agressão à polícia que tinha usado da força para que o comício se pudesse realizar. Entretanto, o número de contra-manifestantes foi engrossando e em dada altura os polícias eram insuficientes para responder à situação. A polícia começou a recuar para a esquadra e foi nessa altura que percebi que ia haver problemas. Assim, fui ao quartel buscar o jipe e o motorista para observar os acontecimentos já enquanto militar. O quartel ficava a cerca de 800 metros do Naval e da esquadra, por isso quando vinha do quartel reparei que os manifestantes estavam frente à esquadra e que os polícias estavam todos lá dentro. Mesmo antes de chegar ao local, vi e ouvi alguns disparos que vinham de dentro da esquadra da PSP. Eles dispararam porque tiveram medo, uma vez que os manifestantes estavam a apedrejar a esquadra e a tentar arrombar a porta para entrarem. Foi nessa altura que vi uma pessoa cair no chão. Dei a volta, passei pelos manifestantes que tinham recuado ao ouvir os tiros, aproximei-me e vi um jovem baleado no chão, junto da fonte luminosa. Eu e o motorista pegámos nele, pusemo-lo no jipe ao meu colo e levámo-lo ao hospital de São Bernardo. Não sei se morreu nos meus braços ou se ainda chegou com vida ao hospital, o que sei é que eu e o meu condutor fomos as últimas pessoas, de fora do hospital, a vê-lo com vida. Durante o trajecto para o hospital houve uma altura em que pensei que ele tinha morrido e, pela injustiça que era essa morte, entrei numa crise enorme e parti o vidro do jipe ao soco. Ainda hoje guardo o casaco cheio de sangue que saiu do ferimento na cabeça dele. Esse casaco ainda hoje permanece como estava porque não o mandei lavar. É uma das recordações do 7 de Março que me marcou bastante. SR – O tiro que matou esse jovem foi disparado pela polícia? RB – Eu não assisti a tudo, uma vez que quando isso aconteceu, ia do quartel para a esquadra. Quando se deram os tiros estava lá perto mas só vi o jovem quando ele estava no chão. Embora não tenha garantias disso, acho que os manifestantes não dispararam. Que a polícia disparou, não há qualquer sombra de dúvida porque quando entrei na esquadra enfrentei polícias armados. E fui eu que lhes pedi para deporem as armas. Ou seja, a polícia atirou contra os manifestantes e tudo o que sair daqui são conjecturas. Para além disso, acho muito estranho um manifestante disparar contra a polícia e acertar em alguém que está à frente na manifestação. Assim, a minha convicção é que o jovem morto naquela noite foi atingido por tiros disparados da esquadra da polícia. SR – O que é que fez, depois de ter deixado o jovem baleado no hospital? RB – Voltei ao quartel para ir buscar o pelotão que deixei de prevenção. Deviam ser onze horas ou perto da meia noite quando voltei ao quartel. Então fardei-me, fui buscar o pelotão e fomos todos à esquadra da PSP. Chegámos lá na altura em que os manifestantes tinham voltado a ganhar terreno e começavam a destruir as viaturas da polícia estacionadas frente à esquadra. Lembro-me de que uma das coisas que fiz foi pedir a duas ou três pessoas conhecidas que tirassem dali os carros da polícia porque eles estavam a atrair a atenção dos manifestantes. Sei que um desses carros foi depois encontrado na Arrábida porque, entretanto, houve gente que aproveitou para ir passear. A seguir, eu e o pelotão ocupámos a esquadra da polícia até chegarem os reforços, uma vez que tinha pedido ao quartel que comunicasse com o Estado Maior das Forças Armadas para lhe contar o que se passava em Setúbal. Mas os reforços levaram cerca de duas a três horas a chegar cá e lembro-me que a primeira força a aparecer foi a do meu companheiro de armas, Andrade e Silva, na altura capitão em Vendas Novas. Nessa primeira acção pedi à polícia que depusesse as armas e os agentes acataram esse pedido. Quando entrámos na esquadra fomos acolhidos com armas e de uma forma hostil, até porque naquela altura o MFA estava muito conotado com as forças de esquerda e com as contestações ao PPD. Mas quero dizer que o que a PSP fez no Naval foi cumprir o dever de garantir a segurança e a ordem democrática. Ou seja, se o PPD tinha autorização para fazer um comício então podia fazê-lo. Só que para os manifestantes, a polícia estava do lado da direita. Depois dos polícias terem deposto as armas fui falar aos manifestantes. Como eles me conheciam e como nessa época o MFA era a resolução de todos os problemas do país, aceitaram parar com os confrontos. Mas impunham a condição de que a polícia fosse castigada. Claro que não íamos deixar que isso acontecesse e nem íamos entregar os polícias aos manifestantes, por isso iniciámos uma fase de negociações que durou duas horas, com o pelotão em posição frente à esquadra da polícia. Havia gente muito irritada, com os ânimos muito exaltados de um lado e do outro. Por seu lado, a polícia quando via os manifestantes avançarem enervava-se e isto fez com que aquelas horas tivessem sido das mais difíceis da minha vida. Eu tinha 23 anos e estava com 15 militares a fazer frente a mais de 300 manifestantes. SR – Como é que um jovem de 23 anos consegue mostrar autoridade perante os agentes da polícia e os manifestantes? RB – A autoridade ou se demonstra em público ou não se demonstra e, tal como naquela época, não tenho problema em mostrar autoridade. A questão é que, naquela noite, vivia-se um estado diferente do normal porque o normal é cada pessoa conhecer o seu papel. Naquela noite toda a gente estava excitada e alguém tinha que manter a cabeça fria. Neste caso fui eu. Mantive-me assim durante toda a noite, a não ser a caminho do hospital quando pensei que o jovem baleado tinha morrido nos meus braços. E os soldados que foram comigo também se mantiveram de cabeça fria porque antes tive o cuidado de lhes explicar o que íamos fazer. Claro que muitos deles tinham vontade de bater na polícia, aliás alguns bateram mais tarde. O nosso papel era o de evitar os confrontos e, nesse aspecto, a acção dos militares do Regimento de Infantaria de Setúbal foi decisiva. Acho que se não fosse a nossa acção durante aquelas duas horas, hoje em vez de lamentarmos um morto na noite de 7 de Março lamentaríamos muitos mais mortos porque as cabeças estavam completamente perdidas. SR – Então evitaram que a polícia fosse castigada? RB – Os polícias não foram castigados mas apanharam uns bons safanões. Cerca de duas horas depois de termos tomado conta da esquadra, chegaram reforços com pessoal da Marinha e com unidades blindadas. Durante a madrugada a polícia foi tirada de dentro da esquadra mas, por seu lado, o número de manifestantes tinha engrossado. Os militares fizeram um corredor para que os polícias passassem mas os manifestantes pressionaram o corredor, pelo que os polícias ainda apanharam alguns pontapés. Lembro-me perfeitamente que alguns militares também fizeram o gosto ao dedo. Hoje, a 25 anos de distância, já se pode dizer isto: do ponto de vista ideológico, muitos dos militares estavam mais próximos dos manifestantes do que da polícia. Não direi que isto seja lógico, mas situando-nos no período revolucionário era isto que acontecia e algumas vezes assisti a essas cenas. Para um jovem da minha idade foi uma experiência muito enriquecedora enfrentar o comandante da polícia, uma pessoa que não queria perder a autoridade que tinha. Mas acabou por perdê-la e cheguei mesmo a vê-lo chorar. A polícia deixou de ter autoridade quando o pelotão que eu comandava entrou pela esquadra dentro e lhes pediu para guardarem as armas. SR – Depois desses acontecimentos deixou de estar lá a polícia? RB – Nessa esquadra sim, mas essa esquadra não era toda a força policial da cidade. Na altura o país estava bastante dependente das Forças Amadas e lembro-me de ter feito e comandado patrulhas mistas em Setúbal, com militares e com polícias. Isto no sentido de voltar a dar credibilidade à polícia. No dia seguinte a estes acontecimentos não se viam polícias na rua, mas agora é preciso pormo-nos no lugar do comandante da polícia, um homem de mais de quarenta anos que vê um miúdo de 23 à frente de meia dúzia de outros miúdos, a tomarem conta da esquadra. No entanto, ele acabou por perceber que nós estávamos lá para lhes salvar a vida. Tenho ideia de que o chefe da esquadra, que também era militar, acabou por colaborar connosco. Como a PSP perdeu credibilidade em Setúbal, a pedido do MFA organizámos patrulhas conjuntas durante mais de 15 dias no sentido de que a polícia voltasse a ser aceite pela população. SR – Com os militares nas ruas e a polícia sem credibilidade, pode dizer-se que Setúbal estava em estado de sítio? RB – Naquela noite, Setúbal foi mesmo uma cidade em estado de sítio. Nos dias seguintes isso já não terá ocorrido e por uma razão muito simples: na altura o MFA comandava tudo em Portugal. Ou seja, havia um Governo mas era presidido por um militar, o presidente da República era um militar, a autoridade máxima do país era a Assembleia do MFA, por isso eram os militares que mandavam em Portugal. Acontece que os militares dirigiam tudo, quando foi o 28 de Setembro de 1974 foram os militares que ergueram barricadas e no 11 de Março de 1975, dias depois dos acontecimentos em Setúbal, foram outra vez os militares que resolveram as coisas. SR – De alguma forma, o 7 de Março terá estado relacionado com os acontecimentos ocorridos a 11 de Março? RB – Há teorias que defendem que o 7 de Março terá sido uma preparação mas eu não acredito que, maquiavelicamente, se tenham servido do 7 de Março para preparar o 11 de Março. Penso que havia um crescendo das forças conservadoras para que houvesse uma tomada de pulso para ver até onde as coisas podiam ir. E o 11 de Março aparece numa sequência lógica do que se passou no dia 7. Setúbal era um baluarte das forças de esquerda e fazer um comício do PPD em Setúbal era, de facto difícil. Não direi que era uma provocação porque a democracia deve permitir isso, no entanto para grande parte dos manifestantes a democracia era ser de esquerda e mais nada. Esse poderá ter sido um dia para testar reacções em preparação do 11 de Março mas não aceito que, maquiavelicamente, se tenham ponderado os pormenores. Até porque o resultado foi imediato, o comício não se realizou, a cidade foi tomada pelos militares e foram eles que evitaram que coisas mais graves tivessem ocorrido naquela noite. SR – Esta foi a sua primeira participação no movimento revolucionário? RB – Com 17 anos participei nas campanhas eleitorais de 1969, colando cartazes da Oposição Democrática e participando em comícios contra o Governo. Em 1973 participei mais activamente, embora já estivesse na tropa. No dia 25 de Abril de 1974, quando soubemos que a coluna de militares de Estremoz estava a descer em direcção a Lisboa, era eu o oficial de dia no quartel. O comandante quis interceptar a coluna e nós achámos ridículo uma unidade de infantaria que nem morteiros tinha, agora ir interceptar uma coluna de blindados. Achámos que não devíamos sair e foi na sequência disso que os militares de Setúbal se organizaram para contestar as opiniões do comandante da unidade. Ora como eu era o oficial de dia participei activamente nessa contestação. Com isso, o comandante acabou por ver diluída a sua autoridade. No dia 26 ou 27 fomos às instalações da PIDE mas quando lá chegámos não havia PIDE em Setúbal. Mesmo assim conseguimos apanhar uma parte dos arquivos que foram armazenados no quartel. A partir daí, de uma forma natural, acabei por fazer parte da Assembleia das Forças Armadas da Região Militar de Lisboa, depois da Assembleia do Exército e a seguir da Assembleia do MFA. SR – Como jovem que era, como é que viveu essa época? RB – Participei intensamente em todas as actividades pelo estabelecimento da democracia ocorridas entre Abril de 1974 e Agosto de 1975, altura em que deixei o serviço militar. Estive nisto com muita emoção porque vinha de uma família de pequenos proprietários agrícolas, os meus avós maternos eram operários da indústria conserveira, o meu pai era operário fabril e pequeno agricultor, portanto a minha consciência de classe estava bastante desenvolvida e o restabelecimento da democracia em Portugal foi para mim muito importante. Cometi alguns exageros, reconheço, alguns em defesa daqueles que posteriormente criticaram a minha actuação. Dou apenas um exemplo estilo anedota: em Setúbal há uma loja conhecida por Zé da Mota, e em determinada altura algumas pessoas partiram-lhe as montras e aproveitaram para roubar artigos. Quando lá cheguei, acompanhado por uma unidade do Regimento de Infantaria, vi gente dentro da loja e tomei uma posição pela defesa da propriedade privada. Nessa altura, as pessoas que lá estavam a destruir e a roubar, e que se diziam manifestantes de esquerda, viraram-se contra mim e acusaram-me de pactuar com o proprietário, o que queria dizer que ideologicamente eu não estaria muito longe dele. SR – A 25 anos de distância, como é que vê os ideais que defendia? RB – Continuo a ser comunista. Não o ostento e não o nego, assumo-o e não poderei ser outra coisa na vida. Porque sei aquilo que a vida me custou, continuo a defender as minhas ideias e alguns daqueles que criticaram os meus impulsos e a minha fachada radical de esquerdista, hoje já não são comunistas e eu continuo a sê-lo. Outros vieram da direita para a esquerda e eu continuo sempre no mesmo caminho. Nunca se perde a impetuosidade com que se nasce, aprende-se a viver com ela e a moderá-la. Se calhar, a impetuosidade de que nos acusam era apenas a grande vontade de querer contribuir para o restabelecimento de uma ordem que esteve 48 anos arredada de Portugal. Lembro-me de ter feito 225 sessões de esclarecimento pelo MFA e não há aldeia nos concelhos de Alcácer do Sal, Grândola, Santiago do Cacém e Sines onde não tenha esclarecido as pessoas sobre a revolução, porque é que os militares tinham feito o 25 de Abril, sobre a Reforma Agrária e de todo o processo revolucionário. Mas também aprendi muita coisa nessas sessões e nas assembleias do MFA ao assistir às grandes lutas verbais entre os homens de direita e os homens de esquerda, nomeadamente Jaime Neves, Vasco Lourenço e Melo Antunes. Entretanto, trabalhei com Otelo Saraiva de Carvalho que, tendo conhecimento da onda de ocupações de casas em Setúbal pediu-me para acabar com isso. Perguntei-lhe como é que podia acabar com o problema e ele respondeu-me: “Não sei, desenrascas-te”. Foi assim que convoquei uma reunião no Naval e no dia do encontro estava o pavilhão cheio de gente para falar das ocupações. Se calhar pensavam que eu ia lá para as ajudar nas ocupações, mas quando fiz a minha intervenção ao lado do capitão Chumbinho, agora comandante da PSP do Porto, disse que algumas ocupações não se justificavam e que o melhor era parar com elas e deixar que o MFA fizesse o levantamento das casas, com a colaboração da Câmara Municipal. De facto, assistiu-se a uma grande diminuição da onda de ocupações. Portanto, esse ímpeto de que me acusam sempre foi utilizado para defender causas que considerava justas. SR – Não está arrependido de ter participado activamente no processo revolucionário? RB – Não me arrependo de nada do que fiz. Algumas coisas terei feito com pouca convicção, outras fiz com convicção demais. Não me arrependo de nada e só lamento não ter feito algumas coisas como por exemplo não ter cumprido promessas que fiz às pessoas nas sessões de esclarecimento. Uma dessas promessas estava contida numa frase que dizíamos sempre: “O 25 de Abril não voltará atrás e se for necessário voltaremos a fazer outro 25 de Abril”. Fizeram o 25 de Novembro, já eu não estava na tropa, e não conseguimos fazer um outro 25 de Abril. Se calhar as coisas até se terão equilibrado com os anos, mas essa foi uma das mágoas que me ficaram. Ficou ainda a mágoa de não ter participado nas campanhas de dinamização cultural no norte do país. E lamento, sobretudo, não me ter empenhado mais em todo o processo de restabelecimento da democracia em Portugal. SR – É esta a democracia que esperava para Portugal? RB – Não era isto que esperava. Estou um pouco como José Saramago quando diz que o 25 de Abril foi uma coisa inútil porque se não tivesse ocorrido nós estávamos exactamente no mesmo ponto em que estamos. Penso um pouco assim porque, mais tarde ou mais cedo, Portugal teria que entrar neste esquema de social democracia. Sobretudo, o 25 de Abril permitiu à geração dos anos 50, que é a minha, viver intensamente a transição entre a juventude e a idade madura. Se não tivesse vivido este período, eu era capaz de dar 10 anos da minha vida para o viver. Mas para o meu filho, que tem hoje 25 anos, se calhar o 25 de Abril não trouxe as vantagens que poderia ter trazido. As que hoje tem, se calhar usufruiria delas de qualquer maneira porque estou convencido que o Governo de Marcelo Caetano tornar-se-ia mais maleável até chegarmos àquilo que hoje temos. Claro que situações como a descolonização, a Reforma Agrária e o controlo operário não se viveriam tão intensamente se a transição se tivesse dado de outra forma. Mas isso percebe-se porque nenhum país da Europa tinha vivido um período de ditadura tão grande como Portugal. |
|
Entrevista de Pedro Brinca [email protected] |