[ Edição Nº 127 ] – MIRADOURO por Brissos Lino.

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          Os candidatos presidenciais começam a perfilar-se. É bom que entendam bem o que o País espera deles, e que falem aquilo que, de facto, precisamos ouvir.

Acima das tricas da baixa política, onde alguns chafurdam com gosto, estão, ou deveriam estar, os desígnios nacionais.

Aviso já que não estou a falar de nacionalismos retrógrados, culto da raça e quejandos, mas tão somente do nosso destino como nação e como povo. A nossa razão de ser.

Fala-se muito em país real por contraste com o país virtual, e no país profundo em oposição à futilidade das “tias” da Linha, que não passa de um certo tipo de país das revistas de sociedade. Todavia não se entende bem o que pretende a classe política para o País.

Logo depois do 25 de Abril havia que restaurar e assegurar – nas leis ordinárias, na Constituição e na prática quotidiana – as liberdades democráticas, permitindo a todos os cidadãos uma participação cívica num país que agora era de todos e não só de alguns. Havia que dar voz aos excluídos, marginalizados e reprimidos, integrando-os a todos no processo de construção política de Portugal. O melhoramento das condições de vida foi, para lá da participação universal dos cidadãos na vida cívica e política, o objectivo central que passou a ocupar a sociedade portuguesa.

No entanto, em termos estruturais no que toca ao futuro, e passados vinte e seis anos, pouco se fez à excepção da adesão à então Comunidade Económica Europeia (CEE), hoje União Europeia (UE). Essa sim, foi uma opção de fundo, importantíssima, e que veio estabelecer linhas mestras no nosso futuro colectivo.

Quanto à Educação, continuamos a fazer experiências pedagógicas contínuas, persiste o divórcio entre o sistema de Ensino e o sistema de Formação Profissional, com todos os inconvenientes que daí advêm, e o ensino superior está saturado de cursos que não servem para nada já que foram concebidos de costas voltadas para o mercado de trabalho.

No que toca à Saúde, continuam as infindáveis listas de espera, as unidades de saúde degradadas, subaproveitadas ou por equipar, a falta de pessoal qualificado, a ênfase na medicina curativa em vez de apostar na preventiva.

Quanto à Cultura, continuamos a não saber conquistar as populações, salvo casos pontuais, e a não valorizar o património histórico, nem arquitectónico, nem documental, nem monumental.

Embora em termos diplomáticos possamos dar algumas cartas, a verdade é que quanto à nossa ligação com as ex-colónias, é aquilo que se vê. Angola está como está., e só ela vale por todos os outros países africanos de expressão portuguesa juntos, pela importância e dimensão que tem, e contudo ainda não acertámos o passo com ela.

São apenas quatro indicadores da falta de rumo do País, em termos de fundo. Preocupamo-nos muito com as corridas de velocidade e esquecemos as de fundo. Corremos para evitar a bancarrota nos anos oitenta, e conseguimos. Corremos para o Euro nos anos noventa, e conseguimos. Só o que não conseguimos é um desígnio para o País.

Há que entender o País que somos, tirar partido da nossa natural e privilegiada relação com África e o Brasil, e enquadrarmo-nos no contexto europeu, especializando-nos em sectores nos quais sejamos melhores do que os outros.

Mas como é que o País pode querer afirmar-se no contexto europeu e internacional pela diferença, pela especificidade, pela aposta forte nos sectores onde tem reais condições de competitividade, se essa mesma cultura está por afirmar na panorâmica local e regional?

Onde está a preservação das características das nossas cidades? Porque é que a Setúbal urbana não difere assim tanto de Santarém, ou Almada da Amadora? Dizer que é devido à cultura de globalização é pouco. Será talvez mais por causa de uma concepção provinciana de progresso.

Fala-se muito em desenvolvimento regional mas, a existir, ele não pode ser outra coisa senão o desenvolvimento das características e capacidades de uma dada região, sublinhando as potencialidades existentes com vista não só a um progresso com marca local, como a um desenvolvimento que realce a diferença. É por isso que a co-incineração em plena Arrábida, no coração da Costa Azul, zona de património natural protegido, é não apenas uma incongruência como ainda a típica expressão de uma globalização saloia no seu pior.

Vêm aí as eleições para o Palácio de Belém. Seria bom que os candidatos contribuíssem seriamente para esta reflexão sobre o futuro do País, e dispensassem argumentos idiotas para justificar o voto. Não temos muitas outras oportunidades para assistir e participar no debate sobre os desígnios nacionais. Portanto, senhor Eng. Ferreira do Amaral, senhor Dr. Jorge Sampaio, senhor Dr. Basílio Horta, e outros que vierem, por favor poupem-nos ao espectáculo da demagogia barata. A gente sabe que ao presidente não compete governar, por isso façam-nos o favor de nos considerar minimamente inteligentes e informados. Basta que nos digam desde já, além do modus operandi presidencial que preconizam, qual é a vossa ideia concreta para Portugal.

Já agora, agradecíamos…