Edição Nº 127 • 05/06/2000 |
“O Diário de Lina” – parte XXIII (por Fernando Cameira) Produção de Arte Dabliu, Produtos Culturais, Lda. Querido Diário, Hoje estou tão desanimada! É porque… eu tinha andado a escrever umas coisas para agora te oferecer… e não é que perdi o meu caderninho? Estás admirado com esta história do caderninho, não é? Não é muito o meu estilo, eu sei, tens razão, mas esta história da Arrábida, do Pedro, a semana que fiquei aqui de férias em Setúbal, em casa da Mónica, fizeram despertar em mim uma alma nova. Sinto uma veia poética a latejar cá dentro (estás a ver? Agora vêm-me à ideia estas frases que até parecem de um escritor) e é por isso que comprei um caderninho daqueles de papel reciclado mas que custam os olhos da cara. Se continuar a escrever como tenho feito esta semana vou mas é comprar uma resma de papel de fotocópia que é mais barato e dura mais. Só que é menos cómodo para levar para o café ou para um passeio para poder registar aqueles flashes e inspirações de momento. Mas é verdade. Nesta semana de férias passeei pela serra e pelo cais da cidade, andei pelas praias e até fui lá para baixo para umas partes muito velhas e desertas onde há a Eurominas e achei que esta região tem coisas tão bonitas! Estou a ficar apaixonada. Pela região e pelo Pedro. Pois é. Lá vêm mais dilemas, mas já estás habituado, não é, meu amigo? É que o Pedrinho é tão… tão… é um pãozinho de leite com manteiga e fiambre! Então quando o vi na vigília com aquele colete sem mangas tipo radical!!! Eu acho que ele deve ter um jip e deve passar os fins de semana a fazer safaris aí pela serra. É mesmo o estilo dele. Ai eu só me imagino ao lado dele, a viver aquelas aventuras, aquelas emoções! É tão diferente de pensar numa vida caseira com o Arlindo, com o marido a ler o jornal económico e mais as actualidades políticas e depois o suplemento literário e o telejornal ao almoço e o telejornal ao jantar… Até me sinto já oprimida só de antever essa vida parada e os passeios saloios como o que demos no outro fim de semana. Está bem que gostei mas agora que penso que com o Pedrinho é quase o mesmo que namorar com aquele macho dos anúncios do Malboro… ah, isso sim. Não tem nada a ver. E é por isto que agora ando a escrever poemas e a pensar melhor nas frases para que sejam dignas do que sinto. Mas logo fui perder tudo, meu Deus. Talvez ainda me lembre do poema que era para começar esta confissão de hoje, acho que era assim: Mais uma semana que passou e eu cá estou Mais uma semana acabada e eu de novo apaixonada Eu tento resistir Mas não estou a conseguir Triste sina a minha Sempre indecisa como uma andorinha |
(já não tenho a certeza se era andorinha se era galinha…). Então que achas? Mas isto é de cabeça e eu acho que o original era mais bonito.
Com o Arlindo só tenho falado pelo telefone e ainda bem porque assim ele não vê que faço um frete. É que com o Pedro já houve uns encontros. Nada de muito íntimo, claro, porque também não posso atirar-me assim de cabeça, já me bastou a história do João. Mas eu percebo que ele sente algo por mim, uma atracção fatal. Por exemplo, logo no primeiro encontro ali na Inglesinha, eu pedi um carioca de limão e ele disse-me logo, assim a brincar:
– Ah, um carioca de limão é para aquecer o coração?
Eu até fiquei corada mas percebi logo onde ele queria chegar. Eu nem sabia o que responder mas lá lhe disse, meia a gaguejar com os nervos:
– Não é preciso, já está bem quente.
Bem, já por duas vezes que nos encontrámos num café e ele já me deu os números dos três telemóveis dele, que é um de cada rede, mais o de casa e o do emprego. Deu-me também os e-mails de casa e do emprego e mais um do ótemail ou lá o que é. Claro que eu não lhe dei o meu de casa porque às tantas era uma bronca se ele ligasse e estivesse lá o Arlindo mas dei-lhe o do emprego
Para a semana já vou trabalhar e tenho um pressentimento que a coisa vai aquecer. É que ele olha-me com aqueles olhos de carneiro mal morto… mesmo a dizer…. que quer algo de mim. E eu sei que o telefone vai tocar.
Vamos ver, vamos ver.
Que o céu me acompanhe e a minha alma encontre o amor verdadeiro.
Adeus amigo.
Lina
(
Continua)