[ Edição Nº 127 ] – Denúncia do “Setúbal na Rede” salva estação arqueológica de Sines.

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Edição Nº 12705/06/2000

Denúncia do “Setúbal na Rede” deu resultado
MAEDS salvou estação arqueológica de Sines

          A estação arqueológica de Vale Pincel, entre Sines e a praia de S. Torpes, está a ser alvo de intervenção por parte da equipa de arqueólogos do Museu de Arqueologia e Etnografia do Distrito de Setúbal (MAEDS) que, desta forma, pretende salvar o máximo possível de espólio ali encontrado, antes das máquinas entrarem no terreno para a construção do gasoduto da Transgás. Uma intervenção que, segundo garante Carlos Tavares da Silva, director do Centro de Estudos Arqueológicos daquele museu, se deveu à denúncia efectuada pelo “Setúbal na Rede” e de que a Transgás e o Instituto Português de Arqueologia tiveram conhecimento imediato.

As escavações, identificação e recolha do espólio, efectuadas de emergência naquela zona da Costa Vicentina, ocorrem depois da denúncia do MAEDS, de um possível desaparecimento da estação devido ao projecto do gasoduto. As queixas acabaram por ter eco junto do Instituto Português de Arqueologia (

IPA) e da Transgás, que decidiram unir esforços para salvar o máximo de espólio possível, uma vez que o traçado do gasoduto da Argélia para Portugal não pode ser alterado. Assim, as investigações vão decorrer até dia 16 de Junho, altura em que o projecto da Transgás começará a ser aplicado no terreno.

Embora lamente não ter conseguido salvar o sítio arqueológico na totalidade, uma vez que “não existe outra passagem possível” para o gasoduto, o arqueólogo Carlos Tavares da Silva diz-se satisfeito com o desfecho do caso e adianta tratar-se de uma medida governamental que “incentiva ao exercício da cidadania” em defesa do património do mundo. Crente dos benefícios da intervenção em curso, garante que esta irá permitir a recolha, o estudo e a identificação daquele povoado, bem como deixar para a posteridade os legados ali recolhidos ao longo de cerca de um mês.

Depois de ter visto aceite a denúncia sobre a destruição daquele espaço, Tavares da Silva conta agora com o apoio da Transgás, que financia as escavações e as investigações que irão dar lugar a um livro sobre a importância daquele povoado (orçadas em cerca de 40 mil contos) bem como com a ajuda da Administração do Porto de Sines, da Câmara Municipal de Sines e do Parque Natural da Costa Vicentina.

Sines dá lições de História

As escavações de emergência em Vale Pincel têm dado resultados “muito frutuosos”, uma vez que se trata de um local “bastante rico”, afirma o arqueólogo que espera salvar o máximo possível de vestígios e de registos que, posteriormente, serão distribuídos para exposição no MAEDS, no futuro museu de arqueologia de Sines e até mesmo no Museu Nacional de Arqueologia, em Lisboa.

E pelos vistos, para além de produtivo em termos da quantidade de espólio encontrado pelos arqueólogos, o povoado pré-histórico está a dar “uma importante contribuição científica” para o avanço do conhecimento da história da ocupação humana do Alentejo litoral. De acordo com Carlos Tavares da Silva, a área intervencionada revelou numerosas estruturas de carácter habitacional maioritariamente constituída por empedrados de combustão com funções culinárias, bem como diversos outros vestígios da actividade humana que durante a Pré-História teve como palco o sítio de Vale Pincel. No local foram ainda encontrados diversos artefactos em pedra relacionados com a caça, a recolecção, a ceifa a farinação, o tratamento de peles, o trabalho sobre a madeira e os recipientes em cerâmica.

De acordo com Carlos Tavares da Silva, o sítio arqueológico de Vale Pincel é tanto mais importante quanto se sabe que se trata de um exemplo raro da viragem do processo evolutivo da Humanidade. Ou seja, é em Vale Pincel que os arqueólogos conseguem ver e estudar o período de passagem do Homem, da fase de recolector à fase de agricultor. Este sítio arqueológico de Sines explica como a fase charneira da evolução humana ocorreu, por isso Tavares da Silva chama a atenção para o facto de, em toda a Península Ibérica, ter sido este o local onde melhor se escreveu a época que alterou definitivamente a vida humana e as sociedades: a revolução agrícola que teve como consequência o início do actual modelo de sociedade sedentária.


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