Edição Nº 129 • 19/06/2000 |
Lei sobre co-incineração vai a tribunal
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– Qual é a leitura que o PS faz da aprovação do projecto lei dos Verdes no parlamento? Ana Catarina Mendonça – Neste processo há duas coisas que têm de ser separadas: uma é a visão integrada sobre o que é a actual política do ambiente em Portugal, e a outra é ver, neste momento, a co-incineração como a melhor forma de tratamento dos resíduos industriais perigosos. O que aconteceu no parlamento, por parte das oposições, e não falo dos deputados do PS por Coimbra, porque tinham assumido um compromisso com a população que temos de respeitar, foi um acto de irresponsabilidade. Com a agravante de que se a votação tivesse sido feita uninominalmente talvez o projecto lei não tivesse passado. Se assim fosse, acredito que algumas pessoas da oposição tivessem alguns pruridos e se tivessem abstido sobre este assunto. A aprovação do projecto lei não faz sentido porque o Governo tem medidas muito concretas na área do tratamento dos resíduos e, neste momento, dispõe de boas condições para continuar a desenvolver uma correcta política ambiental. Por outro lado, a oposição esqueceu-se de um dado importante: numa sondagem efectuada por um órgão de comunicação social nacional, 64% da população concorda com o método da co-incineração dos resíduos tóxicos. Portanto, é grave os partidos da oposição não terem este dado em conta. SR – Porque é que o PS continua a considerar ilegítima a posição dos partidos da oposição no parlamento? ACM – Porque não havia qualquer razão para aprovar o projecto lei dos Verdes. A Assembleia da República aprovou a constituição da Comissão Científica Independente para avaliar das vantagens e desvantagens e da localização da co-incineração em Portugal. Isso foi feito, mas ainda antes de se conhecer o relatório completo já haviam vozes discordantes. O que acontece é que não podemos colocar em causa uma comissão constituída independentemente dos partidos e com carácter claramente científico e técnico. Por outro lado, se nos lembrarmos bem, não foi o Governo que propôs a localização do Outão porque no tempo da ministra Elisa Ferreira essa hipótese foi abandonada, tendo-se optado por Maceira e Souselas. E é a comunidade científica, saída da decisão do parlamento que abandona a hipótese de Maceira e volta a indicar a cimenteira do Outão como a melhor localização. Portanto, a polémica em torno da co-incineração e a votação no parlamento a favor do projecto lei dos Verdes não passa de uma questão meramente política, tendo a oposição utilizado esta situação como arma de arremesso contra o Governo. Talvez com o intuito de fragilizar o Governo e não para discutir o dossier co-incineração. Aliás, durante o período de discussão antes de se votar o projecto lei viu-se que aquilo foi tudo menos uma discussão técnica. SR – Se, como diz, a população concorda com a medida do Governo, como é que explica os protestos populares em Souselas e em Setúbal? ACM – Trata-se de alguma falta de esclarecimento sobre este assunto, e isso deve-se a uma falha nossa porque devia ter-se procedido ao esclarecimento da população sobre as vantagens e as desvantagens da co-incineração. Aliás, já propus isso no seio da JS de Setúbal e brevemente iremos colocar também essa proposta junto do Governo porque é necessário sensibilizar as pessoas para os benefícios deste método de tratamento. SR – Como é que vai convencer os setubalenses a instalar a co-incineração num Parque Natural? ACM – O grande problema em relação a esta localização, e aí até posso admitir os receios da população, é no que diz respeito ao transporte dos resíduos tóxicos. Mas duvido muito que haja perigo no transporte porque estão previstos cuidados nessa matéria. Ou seja, esta situação está já prevista até porque se não o estivesse não faria qualquer sentido propor-se a localização. SR – O PS vai avançar com um pedido de inconstitucionalidade da lei agora aprovada? ACM – Tendo em conta que os cientistas cumpriram o que lhes foi pedido, e tendo em conta que o Conselho de Ministros já deliberou sobre isso, vamos avançar com um pedido de inconstitucionalidade e ver se ele tem ou não provimento. Isso quer dizer que o processo vai arrastar-se durante mais algum tempo. Contudo o Governo deve prosseguir na aplicação de todas as outras medidas ao nível da política ambiental. SR – Do ponto de vista prático, o processo da co-incineração está suspenso? ACM – Aquilo que os Verdes conseguiram foi atrasar o processo. O tempo gasto com o andamento do pedido do PS para verificar a constitucionalidade da lei aprovada pela oposição vai depender um pouco do Tribunal Constitucional mas, seja como for, o que os Verdes pretendem é fazer passar a mensagem ao eleitorado de que agora tudo está bem em vez de esclarecerem a população sobre o que está a acontecer e sobre as razões concretas que os levaram a pedir a suspensão da lei 20/99. Contudo, estou optimista em relação à decisão do Tribunal Constitucional sobre a inconstitucionalidade da medida aprovada pelo parlamento. E a acontecer, isso só prova que o Governo e a comunidade científica tinham razão e que a co-incineração vai avançar a bem da saúde pública. |
Entrevista de Etelvina Baía [email protected] |