[ Edição Nº 131] – Gonçalo Monteiro, presidente do Conselho de Administração da APSS.

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Edição Nº 13103/07/2000

Setúbal promete desenvolvimento portuário
APSS quer investir nos privados

          Dentro de seis anos, a zona portuária e ribeirinha da cidade de Setúbal poderá mudar completamente de figura. Com largos milhões de contos em investimento a chegar ‘aos bochechos’, o que o presidente do Conselho de Administração da APSS, Gonçalo Monteiro, gostaria era de ver o dinheiro da administração central chegar a horas. Tendo por objectivo virar a zona ribeirinha para a cidade e incrementar a actividade económica e empresarial do porto, a política da APSS é agora dar vazão à iniciativa privada e concessionar a maior parte das actividades.


Setúbal na Rede

Quando é que a APSS prevê completar o plano de recuperação da zona ribeirinha de Setúbal?

Gonçalo Monteiro

– Estamos a trabalhar com um horizonte de seis anos, as obras vão sendo feitas à medida que os financiamentos vão chegando e neste momento está já em curso um conjunto de obras de volume considerável. Estamos convictos de que as mudanças previstas vão servir bem a população e a cidade, de quem a administração portuária quer estar cada vez mais perto e numa ligação estreita. Entre outras obras, estamos a investir na zona da lota, no alargamento da Doca de Pesca que irá ser financiado pela Secretaria de Estado das Pescas, na via portuária já em curso, na reabilitação do cais 3 e do respectivo edifício, para o qual foi feito um protocolo com o Ministério da Ciência e Tecnologia e a Câmara de Setúbal com vista à instalação de um Centro de Ciência Viva.

A ideia é criar ali um centro de discussão sobre o estuário do Sado e a sua

protecção. Ainda ao nível da zona ribeirinha, estamos a desenvolver esforços para a recuperação da zona do parque de campismo e para a construção de uma marina. Mas como esta é uma obra na ordem dos 4 milhões de contos, terá de ser desenvolvida por privados. Já existem alguns grupos interessados, por isso vamos esperar para que as coisas se formalizem de acordo com a lei. Por seu lado, os estaleiros irão ser transferidos para a zona de Santa Catarina, junto à zona industrial ribeirinha, para onde irá também o estaleiro da Tecnogomes, actualmente instalado em Sesimbra.

SR

As docas têm-se manifestado insuficientes para as necessidades actuais?

GM

– O que gostaríamos era de ter uma doca para a pesca e outra para o lazer, mas como isso ainda não é possível vamos tentando resolver isto criando compromissos quer com um quer com outro lado, sem criar conflitos. A Doca de Pesca vai ser ampliada e a Doca de Recreio vai ser alvo de melhoramentos e de reabilitação. Por outro lado, estão já em curso as obras de modernização do terminal das Fontaínhas, cujos trabalhos deverão ficar terminados em Outubro deste ano. Quanto ao Clube Naval Setubalense, não podemos esquecer que é uma instituição com 80 anos e de grande importância para a cidade.

No entanto, pensamos que as instalações podem melhorar. A doca está em muito más condições e o edifício está degradado. Tivemos uma reunião com a

nova direcção e queremos intensificar esta relação no sentido de chegarmos a um entendimento para melhorar toda aquela zona. O clube poderia encontrar mais meios para se auto sustentar, no sentido de melhorar a sua situação financeira, dando também assim oportunidade ao pagamento de uma taxa correspondente à utilização daquele espaço do domínio público marítimo. Todos estes melhoramentos implicarão novos equipamentos e uma aposta na iniciativa privada ao nível da restauração e do lazer.

SR

A concessão da travessia do Sado está a terminar. Tendo em conta que o cais de Tróia vai ser deslocalizado, perspectivam-se problemas com a concessão?

GM

– A concessão termina em 2001 mas a Transado tem-se mostrado interessada. Temos duas hipóteses, ou o contrato de concessão é revisto ou abre-se novo concurso. É verdade que a deslocalização do cais em Tróia irá aumentar o tempo de percurso e os custos da travessia e é também verdade que não estamos em condições de compensar esses custos.

Contudo a Transado diz que talvez esse aumento de custos não seja assim tão grande se o cais for instalado um pouco mais para juzante. Estamos nesta fase e espero que o assunto seja resolvido rapidamente. Este é um problema que nos preocupa e que tem de ser resolvido porque a travessia do Sado não pode parar.

SR

Há pelo menos três anos que se ouve falar da recuperação da zona ribeirinha, mas até agora pouco tem sido dado a ver. As obras não andam como se pretendia?

GM

– Por um lado, tem sido culpa nossa o facto de não haver informação sobre o assunto. Há muita obra em curso mas temos dado a conhecer pouco do que temos feito. Essa é uma lacuna que pretendemos preencher através da divulgação do nosso trabalho para que a população saiba exactamente a quantas anda a recuperação desta área e para que conheça aquilo que vai ser a zona ribeirinha dentro de algum tempo.

Estamos com um volume de obras considerável e estas vão sendo feitas à medida das nossas capacidades e de acordo com os financiamentos que nos são disponibilizados. E claro que em relação às necessidades que temos, gostaríamos que as verbas chegassem mais depressa, mas como isso não depende de nós temos de avançar à medida que o dinheiro surge.

SR

A melhoria da zona ribeirinha tem vindo a ser articulada com o desenvolvimento da área portuária?

GM

– As coisas têm vindo a ser feitas em articulação pois a zona portuária não pode ser dissociada da área envolvente. Assim, o terminal multiusos do porto de Setúbal está já em curso. Neste momento estão a ser feitos os caixotões para o alargamento mas são obras que só podem ser vistas com a maré baixa, por isso a população ainda não se apercebeu do avanço dos trabalhos. A obra está orçada em 4.6 milhões de contos.

SR

Este investimento está de acordo com as expectativas criadas pelos respectivos agentes em volta de um maior desenvolvimento comercial do porto de Setúbal?

GM

– A obra vai aumentar consideravelmente a capacidade do porto, pelo que vamos incrementar as concessões. Ainda não sabemos qual o modelo a utilizar, se por concurso ou se por outra via, mas o que pretendemos é criar uma nova dinâmica, integrar as empresas o mais possível e criar postos de trabalho. Aumentando a oferta, podemos incrementar o investimento e a competitividade da nossa zona portuária que actualmente é inferior às capacidades que o porto tem.

SR

Quais são os factores de competitividade do porto de Setúbal?

GM

– O porto tem mais valias extraordinárias, como os bons acessos rodoviários e ferroviários e uma boa capacidade de receber cargas de todo o tipo. A gestão do porto de Setúbal tem de ser vista de acordo com as suas capacidades, de acordo com o que faz melhor e tendo em conta o conjunto nacional de portos. E neste aspecto parece-me que, de certa maneira, complementa o porto de Lisboa. Até porque nós temos uma boa área de expansão e o de Lisboa não tem mais por onde crescer.

E o simples facto de fazermos as concessões no porto pode solidificar a nossa posição a nível nacional e projectar a nossa actividade portuária a nível ibérico. Para além de que há ainda uma outra área que promete e poderá vir a ser explorada, trata-se dos transportes de curta distância para os quais temos muito boas condições que vão desde os fundos estáveis até à excelente localização do porto. Estou plenamente convencido de que vamos ter um porto bastante desenvolvido e estável, até porque temos um potencial muito grande que é a Eurominas. Estamos apostados em recuperar aquela zona, em termos ambientais e dos próprios edifícios, embora ainda não existam projectos concretos para isso e para a sua futura utilização.

SR

O que é que a APSS tem feito para garantir a saúde do estuário do Sado que nos últimos anos tem vindo a sofrer com as obras do desenvolvimento do porto?

GM

– Somos responsáveis pela monitorização do estuário e pela recuperação das áreas degradadas, como é o caso dos sapais. Assinámos um protocolo com o Instituto Hidrográfico, de modo a termos uma carta actualizada dos fundos do estuário, firmámos um protocolo com o Instituto Português de Arqueologia para o acompanhamento dos trabalhos do terminal multiusos e subscrevemos um outro protocolo com o IPIMAR com vista à análise regular dos sedimentos, da qualidade da água e das suas componentes biológicas.

O porto tem uma grande componente comercial mas não podemos esquecer-nos da sua enorme componente ambiental, pelo que estamos a investir nesta área de forma a garantir a qualidade ambiental do estuário do Sado. E como esta é uma vertente que, à semelhança de muitas outras do porto, deve ser trabalhada em conjunto com as várias instituições envolvidas, estamos actualmente a investir nas comunicações e na rede informática que nos ligará permanentemente.

Como tempo é dinheiro, a ideia é facilitar a ligação entre a APSS e todas as instituições ligadas ao desenvolvimento do porto e à qualidade ambiental do estuário. Isto permitirá a simplificação dos processos e, consequentemente, acelerar a tomada de decisões sobre a gestão da zona portuária de Setúbal.

Os investimentos que temos vindo a fazer no porto e na zona ribeirinha correspondem a uma evolução na política para o sector, protagonizada pelo Livro Branco, e que pretende a revitalização da importância dos portos portugueses. Uma revitalização que, de resto, não pode ser feita de costas voltadas para a realidade que temos e muito menos de costas voltadas para os agentes económicos e para o poder local.

Entrevista de Etelvina Baía
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