[ Dia 28-09-2001 ] – Cipriano Pisco, candidato BE ao Montijo.

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Setúbal na Rede – O que é que levou o BE a apresentar uma candidatura no Montijo?

Cipriano Pisco – É necessário apresentar uma candidatura diferente à Câmara porque, ao longo destes quatro anos de gestão socialista a oposição tem sido muito fraca, quer em qualidade quer em quantidade. Embora a maioria absoluta do PS tenha responsabilidades nisso, parece-nos que a oposição devia ter feito mais. O BE fez-me o convite pela minha experiência autárquica, nomeadamente na Assembleia Municipal, onde estive oito anos por um acordo entre a CDU e a UDP. É um desafio, pois o BE é uma força nova e vai concorrer às autárquicas pela primeira vez. Contudo, a nossa força vê-se, quer pela experiência dos militantes da UDP quer pelos elementos do PSR, para além de alguns antigos eleitos do PS que este ano integram a lista do BE.

SR – Quais são os objectivos da sua candidatura?

CP – Não temos a máquina nem o dinheiro que tem a maioria das outras candidaturas, mas estamos a fazer o possível para chegar ao eleitorado. Fala-se em igualdade entre candidaturas mas isso não acontece porque as diferenças começam logo nos meios que cada uma delas tem para a campanha. O nosso grande objectivo é elegermos, pelo menos, um vereador, e acabar com as maiorias absolutas no Montijo. Por outro lado, queremos estar representados na Assembleia Municipal. Se isso acontecer é uma grande vitória para o BE.

Temos hipóteses de conseguir votos de militantes de todas as forças políticas, nomeadamente uma parte importante do eleitorado do PS, tendo em conta o descontentamento gerado em volta da posição da Câmara sobre o cais dos Vapores. Por outro lado, também é possível obter votos dos eleitores da CDU, pois parece-me que as pessoas sabem que a coligação vai ter muitas dificuldades em ganhar a Câmara.

SR – Como é que vê as outras candidaturas?

CP – Parece-me que a candidatura da CDU não é para ganhar e isso vê-se pela escolha do candidato. Não tem a ver com a pessoa mas sim com o facto de que, se fosse para ganhar, a CDU ia apostar em bons quadros do Montijo para encabeçar essa luta. O que me parece é que as pessoas não estão disponíveis porque acreditam que não é uma luta para ganhar. Acredito que o PS possa vir a ganhar, mas não com maioria absoluta. E a nossa luta vai ser essa. Aliás, queria fazer um apelo à massa crítica do PS para travar uma situação que toda a gente critica, inclusivamente militantes daquele partido. O caso é que, tendo votado em Maria Amélia Antunes, a população já não sabe muito bem quem é que governa a Câmara: se é a presidente do município se é o presidente da Concelhia do PS, José Bastos. Quem perde com isto é o PS e, a continuar assim, quem perde mais é a população do Montijo.  

Por seu lado, o PSD apresenta um candidato forte. Contudo tem o senão de que, enquanto foi vereador, desempenhou mais o papel de um quinto vereador do PS do que o de um vereador social democrata. Quanto à candidatura do PP, protagonizada por Vítor Jingeira, pela expressão que tem no Montijo acho que não terá hipóteses de eleger um vereador.

SR – Se for eleito vereador, que tipo de oposição fará?

CP – A vereação do BE terá por objectivo fiscalizar o trabalho da maioria e apresentar propostas concretas para resolver os problemas do concelho. Não vamos fazer oposição por fazer, queremos contribuir para o bem estar da população e, por isso, se forem apresentadas propostas concretas para o desenvolvimento da terra não vamos votar contra, venham elas de que partido vierem.

SR – Se não forem distribuídos pelouros à oposição, que posição é que tomará?

CP – Não concordo com a não distribuição de pelouros à oposição porque os eleitos devem participar na gestão do concelho. Mas se isso acontecer, a oposição tem de exigir condições para trabalhar e tentar levar às sessões de Câmara as suas propostas e os problemas concretos da população.

SR – Qual é o seu diagnóstico dos problemas do concelho?  

CP – Um dos maiores problemas diz respeito à transferência do cais dos Vapores para o Seixalinho. Hoje, a maior parte das pessoas vai para o barco a pé porque tem condições para tal. E isso é positivo. O mesmo já não acontece se ele for transferido de local. Se for eleito vereador, este será o primeiro tema a abordar, no sentido de anular por completo a transferência do cais.

SR – Sendo este um projecto da Transtejo, o que é que a autarquia pode fazer para o impedir?

CP – Fazer aquilo que o PS fez em 1991, ou seja, denunciar publicamente que a Câmara não devia andar a reboque da Transtejo. Mas agora que o PS está no poder já tem outro discurso e é totalmente favorável à transferência do cais. Não é pelas pessoas passarem para o poder que podem mudar as suas posições. Um outro exemplo concreto: quando estavam na oposição, os vereadores do PS enviaram aos comerciantes uma carta a dizer que não permitiriam a construção de grandes espaços comerciais. Hoje, na gestão PS, está em curso a construção de um Carrefur e já se fala num Lidl. O comércio já está mal e, com estas medidas, a que se junta a desertificação da zona histórica, pode ficar a perder ainda mais.

A Câmara não quer saber do que se passa, não fala com as pessoas e não há qualquer ligação entre o executivo e a população que o elegeu. E isso foi notório por ocasião da votação da moção sobre o cais dos Vapores, pois a Câmara nem sequer permitiu a discussão da moção. É uma tal arrogância que já se chama os membros da oposição de débeis mentais e pessoas sem critério. Isto é uma forma de tentar intimidar as pessoas e acho que o eleitorado do Montijo enganou-se quando, há quatro anos, deu a vitória ao PS. As pessoas votaram PS porque pensaram que esta gestão iria contribuir para a melhoria da vida do concelho, mas ao fim de quatro anos estão a ver promessas sem cumprimento.

Chegou-se ao ponto de Maria Amélia Antunes, enquanto deputada, ter votado contra a inclusão de verbas no PIDDAC para comprar o Cine-Teatro Joaquim de Almeida, mas quando passou a maioria na Câmara, decidiu comprar o edifício. Mas o edifício continua por recuperar e continua cheio de andaimes à espera das obras. Mas como, com o PS, tudo vive em função do período eleitoral é provável que as obras avancem este ano. O projecto de recuperação da Praça da República é outro problema, entre muitos, pois as pessoas estão contra, quer o projecto propriamente dito, quer contra o facto da Câmara não ter discutido o caso com ninguém.

Há coisas que devem ser debatidas com os cidadãos e esta é uma delas. Agora, por causa disso há comerciantes que querem abrir os estabelecimentos e não podem por causa do estado em que está aquela zona. Mas tudo isto tem a ver, não só com a arrogância da gestão PS como também com a falta de planeamento para o concelho. O Montijo cresceu sem planeamento, nomeadamente no que diz respeito aos impactos da nova ponte embora o crescimento populacional não seja tanto como se pensava anteriormente. Aliás, isso nota-se porque há urbanizações em curso sem um único andar vendido.

Contudo o que se vê é que o concelho cresceu mais do que devia. Por outro lado, muitas obras que se vêem no concelho estão a ser feitas pelos empreiteiros como contrapartida pela criação de mais urbanizações. Entretanto, as infra-estruturas como o saneamento básico e o reforço do abastecimento de água não têm acompanhado as necessidades da população. E se não travarmos este crescimento, seremos cada vez mais um dormitório. Enquanto há uns anos atrás cerca de 80% da população trabalhava no concelho, com a situação criada os números estão invertidos e a maioria das pessoas que aqui vive trabalha fora, nomeadamente em Lisboa.

Uma situação que é agravada pelo facto de não haver incentivos às fixação de empresas pois, nos terrenos que eram de empresas que saíram do concelho estão a ser edificadas mais urbanizações. Ou seja, não há postos de trabalho suficientes para as pessoas que aqui vivem. É preciso encontrar soluções, em conjunto com os empresários, de modo a tornar o concelho mais atractivo ao investimento. É necessário mais espaço para as indústrias e as empresas e a Câmara tem a obrigação de o garantir.    

SR – De que modo é que a cultura do Montijo e as suas capacidades naturais podem potenciar o turismo?

CP – Temos muita coisa que pode ser aproveitada e divulgada pela Câmara, como é o caso da gastronomia, do património e das zonas naturais, nomeadamente da zona ribeirinha. Mas para isso é preciso cuidar do rio. E para cuidar do rio é preciso pôr a ETAR do Seixalinho a funcionar. Há doze anos era a bandeira da oposição PS, e agora que está no poder a ETAR continua por construir. Trata-se de um equipamento fundamental para a despoluição do rio que foi uma das mais importantes fontes de desenvolvimento da cidade.   

O projecto de recuperação da zona ribeirinha, definido pela Câmara, parece-me bastante polémico. A começar pelo facto do executivo não saber se quer um espelho de água ou se quer uma marina. E a continuar assim, corremos o risco do rio ficar assoreado como, aliás, já aconteceu na Moita. Não estou contra um plano de melhoramento mas é preciso pensar bem no que se vai fazer na zona ribeirinha, pois o rio corre o risco de deixar de ser navegável a partir do cais do Seixalinho.

SR – Quais são os maiores problemas da população do concelho?

CP – Um dos maiores problemas diz respeito à dificuldade com que os jovens se deparam para comprar casa, pois os preços são demasiado altos. Há possibilidade de se inverter essa situação, deste que a Câmara o queira, através da construção de habitação a custos controlados. É o caso do bairro onde vivo. Isso pode ser feito através da Câmara, com o Estado ou mesmo com os promotores das urbanizações em curso. Por outro lado, e no que diz respeito às novas urbanizações, é preciso baixar a altura dos prédios para três andares de forma a não provocar a descaracterização daquelas zonas. Para além disso, é preciso obrigar os construtores a fazerem garagens subterrâneas para que o espaço ocupado pelos carros sejam implantados equipamentos e zonas verdes.

Depois temos carências ao nível da saúde. Uma das bandeiras do PS, que era o Centro de Saúde do Afonsoeiro, acabou por não ser concretizada pois, não se sabe porquê, a construção foi feita noutro sítio e as pessoas a quem devia servir têm que percorrer quilómetros para lá chegar. E isso veio mexer com o Centro de Saúde do Montijo porque os médicos que lá estavam acabaram por ser transferidos para o novo equipamento. Actualmente, o utentes do Montijo têm de se deslocar ao Afonsoeiro para terem uma consulta. Precisamos de um Centro de Saúde novo na sede de concelho e de um hospital novo porque o que existe não consegue satisfazer a população. De resto, o actual hospital poderia ser aproveitado para um grande Centro de Saúde.

SR – Quais são as propostas do BE para a área da educação?

CP – É necessário melhorar os equipamentos do ensino básico e garantir uma boa rede de pré-escolar. Há muitas escolas a precisar de obras e isso não tem sido acautelado a tempo. De tal maneira que há escolas, como a do Bairro da Caixa, que não têm aulas por falta de condições. Por outro lado há que criar mais estabelecimentos de ensino secundário e condições de transporte para as pessoas que estudam à noite para evitar coisas como a deslocação diária de dezenas de pessoas de Pegões para estudarem no Montijo, num percurso de quase 100 km.

Chegamos ao ponto de, para as pessoas que vivem em zonas rurais como Canha ou Pegões, ser mais fácil ir estudar para Vendas Novas que fica a poucos quilómetros e tem melhores acessibilidades. A solução para isto era a construção de uma escola secundária na zona rural do concelho.  O que é preciso é um plano integrado para a educação, que abranja as necessidades de todos os graus de ensino, incluindo o ensino superior. À falta deste estabelecimento, a maioria dos estudantes do Montijo estuda em Lisboa ou em Setúbal e isso é negativo para um concelho que precisa cada vez mais de massa crítica. seta-8851781