[ Setúbal na Rede] – Ambiente – Opinião

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OPINIÃO
José Manuel Palma (professor na Universidade de Lisboa  e ex-presidente da Quercus)
A negação do risco

Esta crónica não deveria ser feita agora. Mas como fui até ao ano passado Presidente da Sociedade de Analise de Risco da Europa, e trabalhando nesta área, não posso deixar de a escrever (a propósito a Society of Risk Analisys é uma sociedade mundial cientifica e técnica com uma secção europeia a que tive a honra de presidir).

Há cerca de duas dezenas de anos num pequeno concelho no meio dos Estados Unidos havia um tipo considerado por todos meio maluco. Era o chefe da protecção civil desse lugar que, com uma tenacidade única, e durante anos, preparou polícia, bombeiros, hospitais e população para a resposta a desastres, catástrofes e outras coisas do mesmo tipo, que andam na boca de todos apesar de pouco nas mentes e nos corações. Todos o conheciam porque era de facto um tipo muito chato perturbando o normal “ram-ram” com todos os exercícios e preparação. Um belo dia caiu um avião … e por sorte ou por azar caiu mesmo nessa área. Resultado? A equipa conseguiu salvar muitas dezenas de pessoas e por muito tempo foi estudado como é um “pacóvio” tinha preparado tão bem toda uma zona para responder a desastres chegando à conclusão que, se o avião caísse noutro lugar, poucos teriam escapado.

Em Portugal existem muito pouco pacóvios deste género, e não conseguimos deixar de apreciar os bombeiros quando os vemos na TV com olheiras, sem dormir e com fome a arrastar-se por esses montes fora sem saber os caminhos, quando os carros que usam não são apropriados, não havendo indicação precisa dos pontos de água, quando dormem no chão de cimento, não existe uma correcta comunicação de prioridades, nem utilização adequada de GPS e cartografia digitalizada, ou quando se tem de atravessar meio país para reabastecer um avião, etc. etc.

Tudo o que se faz em Portugal nesta área, leva-nos a estar de alma e coração com os que lutam tal David contra os muitos Golias que surgem não se sabe donde. Precisamos de heróis e os bombeiros são-no.

Mas, desculpem-me a ousadia, não preciso dessas cenas que, dado o conhecimento que existe hoje na área da prevenção, nos mapas de risco, nos ataques precoces ao desastre, na coordenação logística de apoio em catástrofes, etc., são apenas cenas perversas porque completamente desnecessárias.

Como em tudo na vida no poupar é que está o ganho. Mas será na racionalização e no uso da ciência e técnica que pouparemos porque senão gastaremos e … muito.

Na área do risco, da resposta aos desastres, na prevenção, estamos num sítio inimaginável, numa zona muito terminal da tal cauda da Europa. Não só perante os outros países mas, acima de tudo, perante o conhecimento que existe para ser aplicado.

Sabem quantos sócios portugueses tem a tal Sociedade de Risco que referi acima? Não chega a meia dúzia. Sabem quantos portugueses foram a um congresso europeu que organizei em Lisboa em 2001? Cerca de 20 contanto com os que eu convidei e não pagaram.  

 Voltarei a este tema e proporei aos leitores alguma discussão sobre certas ideias feitas que não podem ser, como tal aplicadas.