Ministro do Ambiente
aprova co-inicineração na Arrábida
José Sócrates anunciou hoje (9 de Abril) a aprovação da co-incineração de resíduos industriais perigosos em cimenteiras, entre elas a do Outão, na Arrábida. Uma medida que diz ter sido tomada com base nos relatórios do grupo de trabalho médico e da Comissão Científica Independente e que, segundo avança, vai permitir os primeiros testes já no mês de Maio. A medida parece não ter surpreendido os movimentos cívicos de Setúbal, uma vez que, antecipando-se ao Governo, os Cidadãos pela Arrábida entregaram esta manhã, no tribunal de Setúbal, uma acção inibitória que pretende impedir a implementação da decisão.
Onze anos após o anúncio do primeiro projecto de queima de resíduos industriais perigosos (incineração dedicada), previsto para Sines, o ministro do Ambiente, José Sócrates, decidiu aprovar a co-incineração nas cimenteiras de Souselas, em Coimbra, e do Outão, em Setúbal. Uma aprovação que diz ser baseada nos estudos científicos e médicos mas que não convencem parte da opinião pública setubalense.
Prevendo tal decisão, o movimento cívico Cidadãos pela Arrábida entregou no Tribunal de Setúbal com uma acção inibitória que, de acordo com o jurista Manuel Salazar, um dos fundadores dos Cidadãos pela Arrábida e responsável pelas acções judiciais neste processo, visa “impedir” a implementação da co-incineração de resíduos industriais perigosos na cimenteira da Secil, instalada no Parque Natural da Arrábida.
Para já, sabe-se que os Cidadãos pretendem continuar a contestação a esta medida governamental, pois, de acordo com a posição defendida por Manuel Salazar ao longo dos últimos meses, “a luta vai até que o ministro desista ou se demita”. De resto, o jurista está plenamente convicto da existência de “ilegalidades” suficientes que permitam nova ‘travagem’ do processo.
Recorde-se que este processo começou em Abril de 1990, com o Governo de Cavaco Silva a lançar o concurso para uma central de incineração de resíduos industriais perigosos em Sines. A medida teve de voltar atrás no final do mesmo ano, por força da contestação da popular e dos ambientalistas.
Cronologia dos acontecimentos
Em Janeiro de 1995 é divulgado um estudo da Universidade de Aveiro sobre a localização da incineradora e unidade de tratamento físico-químico dos resíduos industriais e, em Maio do mesmo ano, a ministra do Ambiente, Teresa Patrício Gouveia, anuncia que a incineradora será instalada em Estarreja. Em Maio de 1997, é assinado um memorando de entendimento entre o Ministério do Ambiente, através da ministra Elisa Ferreira, e o sector cimenteiro.
Em Junho de 1997, o Conselho de Ministros aprova a co-incineração em cimenteiras e, um ano depois, surgem quatro hipóteses de localização no estudo de impacto ambiental – Maceira, Souselas, Alhandra e Outão. Dois meses mais tarde, dá-se início à consulta pública e à contestação quer das populações quer dos ambientalistas e dos socialistas de Coimbra. Em Dezembro, Elisa Ferreira decide que Maceira e Souselas vão receber a co-incineração.
Em Janeiro de 1999 o Governo cria uma comissão científica independente (CCI), e em Novembro o ministro Sócrates dá posse à comissão de controlo e fiscalização das cimenteiras. Em Maio do ano seguinte, a CCI dá o sim à co-incineração de resíduos industriais perigosos mas aponta o Outão em vez da Maceira.
A 15 de Julho de 1999, a Assembleia da República discute um projecto de lei dos Verdes para travar a co-incineração, que acabou aprovado pela oposição com o apoio dos deputados socialistas por Coimbra. A 27 de Julho o Presidente da República promulga a lei da co-incineração.
Em Agosto de 2000, o grupo de trabalho médico toma posse, com o presidente, Henrique Pinto Barros, a defender que as conclusões do grupo de trabalho não deverão ser diferentes do relatório da Comissão Científica. Em Dezembro, o grupo de trabalho médico diz que o processo não traz consequências de maior para a saúde pública. Contudo, a opinião não é consensual pois um dos membros do grupo, Massano Cardoso, vota contra.
Em Dezembro, o Ministério do Ambiente anuncia que os testes sobre a co-incineração começam em Abril ou Maio de 2001, e decide abrir a consulta pública a 28 do mesmo mês.
Já em Fevereiro deste ano, a comissão de luta contra a co-incineração apresenta um relatório que denuncia a existência de graves problemas de saúde na população de Souselas devido à poluição provocada pela cimenteira.
A 6 de Março, a Comissão de Petições do Parlamento Europeu dá provimento à queixa formulada pelo movimento de Setúbal, Cidadãos pela Arrábida, contra o Governo português por infracções na realização dos estudos sobre o processo de co-incineração.
No dia 27 do mesmo mês, a organização internacional Greenpeace diz que a queima de resíduos industriais perigosos junto de aglomerados populacionais ou de um parque natural é “condenável e irresponsável”.
No dia 2 de Abril, José Sócrates diz que vai emitir o despacho sobre a co-incineração na semana anterior à Páscoa, entre os dias 9 e 12 de Abril, e no dia seguinte são divulgadas as conclusões de um inquérito à população de Souselas indicando a existência de “particulares e significativos problemas de saúde”.