[ Dia 24-04-2001 ] – CARTAS DE MAREAR por Mendes Ferreira.

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CARTAS DE MAREAR
por Mendes Ferreira (ortopedista e médico do trabalho) Em nome da esperança Sou da geração que ainda tem na memória o que representou de esperança aquela madrugada em abril de 74.

Sou dos que imaginaram que a liberdade devolvida aos cidadãos lhes iria trazer a felicidade natural que representa o ser inteiro.

Sou dos que pensa que a democracia é o “modus vivendi” natural.

Mas, fazendo uma viagem retrospectiva devemos também fazer um balanço ao comemorar esta data.

Que fizemos nós da liberdade?

Podemos falar livremente?
E o que muda quando falamos?

Podemos eleger livremente os nossos representantes?
E o que fazem eles com o nosso voto?

Pagamos mais ou menos impostos?
E o que fazem eles com o nosso dinheiro?

Estamos num país mais justo?
E o que acontece aos criminosos? – São presos ou libertados?

Os nossos filhos têm melhor acesso ao ensino?
E o que lhes acontece depois?

Foram construídos mais hospitais?
Gasta-se mais dinheiro na saúde?
E como somos tratados se estamos doentes?

Construíram-se mais estradas e auto-estradas e podemos comprar carros melhores e mais seguros?
Mas, morre-se mais ou menos ao volante?

A habitação e construção aumentou?
A sinistralidade no trabalho diminuiu?

Deixámos de estar “orgulhosamente sós”. Mas, o que acontece quando nos comparamos com os nossos parceiros?

Se o conjunto de respostas a estas e muitas outras questões não foi inteiramente do seu agrado pode ter a certeza que você é co-responsável.

É mais cómodo dizer que a culpa é do governo dos patrões…, dos sindicatos…, da polícia…, dos magistrados…, dos médicos…, dos alunos…, dos professores………

Dá uma sensação de alívio porque nos vitimiza. Mas não resolve o problema.

Tudo isto funciona mal porque caímos todos num grande equívoco.

Em 25 de Abril de 74 deveríamos ter tomado nas mãos não a liberdade mas sim a cidadania. Aquela então viria por inevitabilidade.

Tratam-nos por contribuintes e não como cidadãos, porque o permitimos.

Tratam-nos como utentes e não como doentes, porque como cidadãos o abdicamos.

Tratam-nos como papalvos em tempo de eleições porque o cidadão fecha os olhos.

A crise de que hoje nos queixamos é tão somente uma crise de cidadania. Que cada um de nós assuma o controlo do que os deveres e os direitos de cidadão lhe impõe. E então sim!

“O Povo é quem mais ordena”

Porque você – cidadão – o exige.