• 20-12-2001 • |
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O Tsunami laranja e o distrito de Setúbal
Apesar de o distrito de Setúbal ser, normalmente, excepcional no que toca às questões eleitorais, é inegável que, de forma avassaladora, uma onda laranja varreu Portugal de Norte a Sul nas eleições autárquicas do último domingo e que tiveram, como consequência mais visível, a queda do próprio Executivo e a mais que provável dissolução do Parlamento com a convocação de novas eleições por parte do Presidente da República. O Governo e o PS colapsaram de forma simbolicamente mais ruidosa que as malogradas Twin Towers em 11 de Setembro!
Refira-se que, dificilmente, se preveria tal terramoto político mormente após uma enigmática mega – sondagem do Expresso publicada no dia anterior e que previa coisas tão incríveis como a vitória de João Soares em Lisboa com mais 10% dos votos, a vitória do PS em Faro, Sintra, Porto e Famalicão e até uma incrível ‘vitória’ do CDS em Vila Viçosa que se veio a revelar como o último dos partidos votados naquela autarquia!
Que interesses estranhos terão movido o Expresso? Com que rigor científico foi feita / encomendada a referida sondagem? Como se pode ‘errar’ tão clamorosamente? Como se pode comprometer a imensa credibilidade de um semanário como o Expresso perante os seus leitores desta forma tão caricata?
A 16 de Dezembro, dada finalmente a palavra aos eleitores, municípios tão emblemáticos como Faro, Cascais, Sintra, Coimbra ou Famalicão mudaram de partido. Mas as cerejas do bolo seriam mesmo as cidades de Lisboa e Porto quer por terem tido vitórias tangenciais, quer por terem sido obtidas contra as previsões de todos terão um significado ainda mais especial.
O distrito de Setúbal é uma excepção uma vez que, salvo em eleições legislativas, ao tempo dos Governos de Cavaco Silva, o PSD nunca obteve votações expressivas nos diferentes concelhos que o constituem.
As autárquicas do último domingo também não terão sido excepção se bem que se tenha notado uma melhoria em praticamente todos os concelhos mas que, à excepção da freguesia da Costa de Caparica, não lhe permitem ainda alcançar o poder.
Não deixa de ser curioso que este foi um dos distritos onde o Partido Socialista mais apostou para tentar compensar as previsíveis perdas de câmaras a nível nacional, tal facto foi visível, quer através dos meios financeiros de que as campanhas do PS dispunham nos diferentes concelhos do distrito, quer pelo facto de figuras destacadas do aparelho partidário terem integrado as listas.
Essa aposta teve como consequência a conquista de três importantes baluartes comunistas: Barreiro, Grândola e Alcochete. Se o primeiro quase que se adivinhava devido à vitória tangencial da CDU em 1997, o segundo e terceiro casos constituem talvez das poucas grandes vitórias do PS na calamitosa noite de 16 de Dezembro (para além da derrota no Porto que, segundo as más línguas, terá sido a única ‘vitória’ de Guterres devido à inimizade com Fernando Gomes). O problema foi mesmo na capital do distrito em que, uma disputa fortemente mediatizada, fez a CDU reconquistar o poder.
Este avanço do PS, que detém agora 5 dos 13 municípios do distrito, poderá perspectivar diferentes possibilidades para o PSD em futuros actos eleitorais autárquicos. Não deixa de ser curioso que, existe um paradoxo político dramático que terá de ser quebrado se o PSD quiser ser poder a médio prazo em autarquias do distrito: estrategicamente para o PSD é preferível que a Câmara seja comunista a ser socialista mas só pode almejar chegar ao poder se ela já for socialista.
O PSD correu, aliás, um grande risco nestas eleições no distrito de Setúbal: apesar da tendência nacional apontar claramente no sentido do reforço da sua votação, em Setúbal, todavia, a aposta forte do PS e a consequente tendência bipolarizadora poderiam ter levado a que as suas percentagens e o número de mandatos se ressentissem fortemente em baixa. Assim não aconteceu em boa parte devido ao planeamento cuidadoso e atempado da estratégia autárquica e à escolha criteriosa dos candidatos.
Assim à excepção do concelho de Setúbal, em virtude da mediatização e do ‘tudo ou nada’ em que, dramaticamente, as eleições na capital de distrito se transformaram, em todos os outros municípios o PSD manteve e subiu as suas percentagens e o número de mandatos aos diversos órgãos autárquicos.
As alianças com o CDS em alguns municípios poucas vantagens trouxeram para alem de impedir que este partido pudesse concorrer isolado. Aliás o papel deste partido em alguns concelhos do distrito, onde concorreu isolado, muito se assemelhou ao de Paulo Portas em Lisboa: em nome de estratégias de pseudo – afirmação partidária prejudicar claramente o PSD. O paradigma disso verificou-se em Almada onde uma campanha eleitoral pautada pela ausência pura e simples de Narana Coissoró, à excepção de alguns vistosos outdoors pagos com dinheiros nacionais, teve como consequência impedir o PSD local de alcançar o seu terceiro vereador e de, assim, tirar a maioria absoluta à CDU.
Analisemos pois com algum detalhe as votações nos diversos concelhos do distrito de Setúbal:
Alcácer do Sal
Aqui nada de novo se passou. O presidente Manuel Rogério de Sousa Brito da CDU mantém-se com maioria absoluta mas a CDU e PS descem em percentagem, o PSD obtém aqui um ganho significativo passando de 5% para 10% (embora sem nenhum mandato na Câmara) facto tanto mais importante se tivermos em conta que a estrutura laranja local era inexistente e teve de ser criada “ad-hoc” para o processo eleitoral.
Na Assembleia Municipal a CDU perde um mandato que passa para o PSD mantendo todavia a maioria absoluta.
A nível das freguesias o PS ganha a de Comporta à CDU (embora sem maioria absoluta) que ganha e mantém as restantes: Santa Maria do Castelo, Santa Susana, Santiago, Torrão, São Martinho todas com maioria absoluta.
Alcochete
Novo presidente: José Dias Inocêncio. O PS ganhou com maioria absoluta. Não se entende muito bem porque é que o “dinossauro” Miguel Boieiro foi afastado de forma tão clamorosa mas as públicas desinteligências com o anterior presidente da Assembleia Municipal juntamente com os novos eleitores provenientes do desenvolvimento urbanístico recente e de um extracto ideológico e sociológico diverso do habitual não deverão de ser alheios. O PSD coligado com o CDS apesar de ter subido não consegue nenhum mandato, recorde-se que a estrutura partidária não existia no concelho e que foi apenas muito recentemente criada pelo que o resultado não se pode considerar mau. A abstenção foi relativamente baixa cerca de 38%.
Também na Assembleia Municipal o PS alcança a maioria absoluta.
O PS ganha as três freguesias: Alcochete (onde adquire maioria absoluta)e Samouco (ganha à CDU com maioria absoluta) e São Francisco (onde mantém a maioria absoluta.
Almada
Surpreendentemente, ou não, nada de novo se passou neste que é o mais populoso e desenvolvido concelho do distrito. A comunista Maria Emília Neto de Sousa mantém-se com maioria absoluta ainda que tenha baixado a percentagem de votos. A taxa de abstenção de mais de 53% é absolutamente incrível e se demonstra por um lado o desinteresse dos eleitores revela, por outro, que presidente é tolerada por muitos eleitores não comunistas que, de forma resignada, ou apenas por omissão, ajudam a perpetuar o poder numa zona que, sociologicamente, há muito que deixou de ser comunista – é este o paradoxo eleitoral almadense. O PS apesar de uma campanha agressiva e com muitos meios vê baixar a sua percentagem e perde um mandato na Câmara. O PSD mantém e reforça a “sua” freguesia da Costa de Caparica apesar do forte assédio de CDS, PS, CDU e de uma lista de independentes. De igual forma recupera um mandato na vereação e vários outros nas freguesias e Assembleia Municipal, sobe na percentagem de votos num resultado que se pode considerar bastante interessante se tivermos em conta a tradicional falta de meios financeiros colmatada sempre com um enorme espírito de militância e de empenhamento da estrutura local e apostando num candidato da terra, José Nascimento, figura de enorme estatura moral e prestígio. É do CDS que o PSD se deve queixar uma vez que esteve ausente da campanha que se resumiu aos vistosos outdoors e que impediram que os laranjas pudessem alcançar o 3.º mandato e terem assim tirado a maioria absoluta à CDU.
O facto de a CDU não dispor da maioria dos deputados eleitos na Assembleia Municipal é compensada pelas inerências dos presidentes das Juntas de Freguesia neste órgão que lhe darão a maioria absoluta.
A nível das freguesias tudo ficou na mesma: PSD mantém e reforça na Costa de Caparica (embora sem maioria absoluta); PS mantém a Charneca de Caparica (perdendo todavia a maioria absoluta); CDU mantém Cova da Piedade, Laranjeiro e Feijó (onde mantém a maioria absoluta) Trafaria, Caparica, Pragal e Almada (onde perde a maioria absoluta) Sobreda e Cacilhas (onde anteriormente também já não detinha a maioria absoluta).
Barreiro
Novo presidente Emídio Bravo Xavier do PS. Algo que já se adivinhava uma vez que nas eleições de 1997 menos de 1% dos votos o tinham separado da CDU. A queda do Barreiro, para além de ser o colapso do baluarte comunista tem um valor simbólico de um local de tradição operária onde, mais do que em qualquer outro concelho do distrito, o partido comunista tinha a sua razão de existir. Foi um sério revés para a CDU. O PSD apesar da tendência bipolarizadora manteve o mandato e a percentagem de votos pelo que não pode ser acusado de mau resultado.
A composição da Assembleia Municipal não sofre alterações se bem que os comunistas tenham perdido duas presidências de freguesia. Quer neste órgão, quer na Câmara, todavia, o PS não irá dispor de maioria absoluta.
A nível de freguesias e, apesar de perder a Câmara e duas freguesias para o PS (Coina e Santo António da Charneca) a CDU ainda detém a maioria das presidências, cinco: Lavradio, Palhais, Santo André, Barreiro, Alto Seixalinho, e o PS três: Coina (com maioria absoluta) Verderena e Santo António da Charneca (ambas sem maioria absoluta).
Grândola
Novo presidente Carlos Vicente Beato do PS que ganha logo com maioria absoluta numa terra que tem também o valor simbólico para os comunista que lhe terá sido conferido pela canção de Zeca Afonso. De “vila morena” vermelha a rosa foi essa a vontade dos eleitores no passado domingo. O PSD foi algo penalizado por esta tendência bipolarizadora que levou o PS ao poder e perdeu alguma percentagem.
Na Assembleia Municipal o mesmo fenómeno de Almada, desta vez a favor do PS: a maioria absoluta é-lhe conferida através das inerências dos presidentes de Juntas e não dos deputados eleitos.
A nível de freguesias o PS ganha quatro: Carvalhal e Melides (eram CDU) Azinheira dos Barros/S. Mamede do Sado (com maioria absoluta e Santa Margarida da Serra (sem maioria absoluta) e a CDU uma Grândola (que já detinha, perdendo todavia a maioria absoluta).
Moita
Aqui a CDU continua a governar com maioria absoluta. Apesar de baixar a sua percentagem mantém os cinco vereadores e, quer o PS quer o PSD mantém a sua votação e o número de mandatos. Também aqui a percentagem de abstenção é elevada situando-se perto dos 54%.
Na Assembleia Municipal a situação complica-se para a CDU uma vez que, tendo perdido uma presidência de Junta de Freguesia para o PS, não disporá, agora, de maioria absoluta.
A CDU mantém a presidência das Juntas de Alhos Vedros e Moita (nas quais readquire a maioria absoluta), Baixa da Banheira, Gaio – Rosário (onde mantém a maioria absoluta) Vale da Amoreira (onde não consegue alcançar, de novo a maioria absoluta) e o PS: Moita e Sarilhos Pequenos (ganhas à CDU e onde alcança a maioria absoluta).
Montijo
O PS e Maria Amélia Macedo Antunes são os grandes vencedores já que reforçam a sua maioria absoluta com mais um mandato na vereação cedido pela CDU que se apresenta claramente em queda neste município. O PSD apesar de não conseguir segundo mandato vê a sua percentagem subir.
Igualmente na Assembleia Municipal a maioria é absoluta e clara.
A nível de freguesias destaque para o quase pleno do PS que alcança 7 das 8 freguesias: Canha, Alto Estanqueiro – Jardia, Atalaia (freguesias onde mantém a maioria absoluta), Afonsoeiro, Montijo, Santo Isidro de Pegões (agora com maioria absoluta) e Sarilhos Grandes (ganha à CDU mas sem maioria absoluta) à excepção de Pegões que foi ganha por uma lista de cidadãos independentes com maioria absoluta ao PSD.
Palmela
Ana Teresa Sá da CDU ocupa o lugar deixado vago por Carlos Sousa e igualmente com maioria absoluta, o único destaque vai para o lugar de vereador recuperado pelo PSD ao PS na pessoa de Bracinha Vieira a que não serão alheios quer o prestígio quer a empatia do candidato.
Na Assembleia Municipal haverá uma situação sui géneris um empate de 11 elementos entre o poder (CDU) e oposição (PS e PSD) entre membros eleitos e por inerência a 11 deputados.
A nível de freguesias o PS mantém as duas que detinha: Marateca (renova a maioria absoluta) e Palmela (de novo sem maioria absoluta) e a CDU Pinhal Novo e Poceirão (freguesias onde renova a maioria absoluta) e Quinta do Anjo (onde perde a maioria absoluta).
Santiago do Cacém
A queda visível da CDU não foi suficiente para tirar a presidência à CDU mas retirou-lhe a maioria absoluta em favor do PS que viu aumentar o número de vereadores de 2 para 3. Refira-se que o PS apostou forte neste concelho tendo apresentado, inclusivamente, o Secretário de Estado da Administração Pública, Alexandre Rosa a cabeça de lista à Assembleia Municipal. O PSD sobe ligeiramente a sua percentagem e reelege um vereador.
Na Assembleia Municipal, tal como em Palmela, novo empate desta vez a 16 elementos. A nível de freguesias a CDU baixa para 7: Abela (conquistada ao PSD mas com um equilíbrio tremendo de 3 mandatos para os 3 partidos) Cercal (onde perde a maioria absoluta) Santiago do Cacém e S. Francisco da Serra (ambas de novo sem maioria absoluta) São Bartolomeu da Serra e São Domingos (freguesias onde mantém a maioria absoluta) Vale da Água (onde conquista a maioria absoluta). O PS sobe para 4: Alvalade e Ermidas-Sado (freguesias onde falha de novo a maioria absoluta) Santa Cruz (ganha à CDU e com maioria absoluta) Santo André (ganha à CDU mas sem maioria absoluta).
Seixal
Aqui nada de novo, Alfredo Monteiro e a CDU mantêm a presidência e a maioria absoluta embora tendo baixado em percentagem de votos, PS e PSD sobem ligeiramente mas sem alterarem o número de mandatos na vereação. O mesmo fenómeno de Almada pode ser apontado aqui no Seixal e igualmente também uma percentagem grande de abstenção – quase 55%.
Também a nível da Assembleia Municipal a CDU mantém a maioria absoluta.
A CDU efectua de novo o pleno das presidências de Juntas de Freguesia. Aldeia de Paio Pires, Arrentela e Seixal (onde renova a maioria absoluta) Corroios (onde perde a maioria absoluta) Amora (onde perde todavia a maioria absoluta que detinha e com empate em número de mandatos) Fernão Ferro (de novo sem maioria absoluta)
Sesimbra
Amadeu Penim e o PS mantêm a Presidência perdendo, todavia a maioria absoluta e baixando a percentagem de votos de 45% para 40% e transferindo um vereador para o PSD que subiu 4 pontos percentuais. Foi o melhor resultado percentual do PSD em todo o distrito.
Na Assembleia Municipal mais um empate a 12 deputados entre membros eleitos e por inerência.
A nível de presidências de Juntas de Freguesia o PS faz de novo o pleno: Quinta do Conde e Castelo (de novo sem maioria absoluta) e Santiago (onde renova a maioria absoluta).
Setúbal
Sem dúvida o embate autárquico mais mediatizado e cujo resultado foi o que se previa ou seja, a derrota do PS e de Mata Cáceres. Carlos Sousa e a CDU vieram, viram e venceram com maioria absoluta. O PSD foi vítima da bipolarização induzida por essa mesma mediatização tendo visto muitos dos seus votos habituais escaparem-se para o PS numa tentativa desesperada de alguns eleitores de evitar o regresso da presidência da Câmara aos comunistas, perdendo percentagem de votos e um mandato de vereador.
Também na Assembleia Municipal a maioria absoluta está assegurada pela CDU.
Ela é consubstanciada no pleno das oito juntas de freguesia que alcançou: Nossa Senhora da Anunciada, S. Julião (conquistadas ao PS mas sem maioria absoluta) São Lourenço (mantida de novo sem maioria absoluta), São Sebastião e Santa Maria da Graça (conquistadas ao PS e com maioria absoluta), São Simão, Gambia/Pontes/Alto Guerra e Sado (mantidas todas de novo com maioria absoluta).
Sines
Nada de novo neste concelho onde a CDU mantém a maioria absoluta e o PS os 3 mandatos. O PSD não conseguiu descolar alcançando o pior resultado do distrito apesar de ter subido a sua percentagem de votos. Na Assembleia Municipal novo empate. Sendo que a CDU ganha de novo a presidência da freguesia em Sines, desta vez com maioria absoluta e o PS ganha a de Porto Covo de novo também com maioria absoluta.