• 23-07-2002 • |
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As pontes e o desenvolvimento
Com a realização do XXIV Congresso do PSD ficou encerrado o primeiro período de governação da coligação.
Nestes primeiros cem dias (período meramente simbólico ainda que não possa corresponder exactamente à centena de rotações planetárias), foram encetadas reformas inadiáveis e tomadas medidas de coragem, muitas consideradas impopulares mas sem dúvida que imprescindíveis.
Notaram-se, nestes cem dias, uma diferença de estilo: a governação preocupou-se em implementar as reformas necessárias. Mas fê-lo de forma tranquila, isto é, sem a obsessão do marketing político, fazendo exactamente aquilo que lhe competia e que, em rigor, é expectável de um Governo democrático: planeando e executando sem se melindrar ou apoquentar com sondagens desfavoráveis, as Cassandras políticas da nossa praça, os Velhos do Restelo imobilistas ou os tão glosados “lobbies que uivam”.
Algumas destas reformas eram urgentes principalmente porque foram negligentemente adiadas, mas peregrinamente evocadas, como argumentação eleitoral sem que, na prática, nos últimos anos de governação desastrosa, se concretizassem.
Se num plano nacional estes pressupostos são verdadeiros, num plano distrital não o são menos. Assim não deixa de ser curiosa a atitude dos eleitos do PS por Setúbal pela sua actual postura reivindicativa na Comunicação Social quando, no passado recente, exibiram uma cúmplice conivência com a falta de investimento e o desprezo, em matéria infraestrutural a que o Distrito foi votado nos últimos seis anos. Especialmente se tivermos em conta que, nesse período, as obras foram negligentemente adiadas e recorrentemente evocadas e esgrimidas como argumentos eleitorais sem que, todavia, na prática, se efectivassem.
Os exemplos são inúmeros mas talvez se possam destacar alguns casos risíveis e paradigmáticos.
Atente-se no exemplo dos famosos sete catamarãs do Barreiro cujo folhetim de aberturas e encerramento de concursos ainda se parece perpetuar e sem que os inúmeros utentes daquela carreira fluvial tenham sequer visto a cor das embarcações, como já noticiava o “Expresso” em 16/12/00: “O negócio da compra de catamarãs para a ligação entre o Terreiro do Paço e o Barreiro foi travado pelo ministro Jorge Coelho. Assim, a renovação da frota da empresa concessionária do transporte, a Soflusa, ficará suspensa até que o ministro receba um parecer que pediu a Sérvulo Correia” tudo devidamente apimentado com guerras de estaleiros, pareceres de júris desrespeitados e as respectivas acções judiciais dos concorrentes preteridos. O prejuízo fica todo, obviamente, com os utentes que continuam a utilizar os vetustos, desconfortáveis e lentos monocascos com laivos de um romantismo fluvial terceiro-mundista, porventura nostálgico, mas incompatível com o Portugal do século XXI.
Mas os exemplos caricatos desta bizarra governação socialista, no que aos setubalenses diz respeito, não ficam obviamente por aqui. Esta inusitada sanha reivindicativa fala-nos ainda do IC33/IP8, precisamente os mesmos itinerários que foram votados ao abandono nos últimos seis anos, basta termos a coragem de aí nos aventurarmos de carro para o verificarmos. Tanto mais estranho já que se torna óbvio que a modernização do porto de Sines (Terminal XXI) é incompatível com a manutenção daquele tipo de acessibilidade rodoviária: do IP8 (Sines, Beja, Ficalho) nem um centímetro foi acrescentado para além dos breves quilómetros de via dupla ainda construídos no tempo do Prof. Marcello Caetano!
Mas nem sequer o que existia e que constitui a actual única saída e entrada do Porto de Sines (IC33 – Santiago, Grândola Norte) foi mantido. O seu exemplar estado de degradação é bem o paradigma da incúria governativa socialista também em matéria de obras públicas.
Os exemplos multiplicam-se: também o IC32/CRIPS (Circular Regional Interior da Península de Setúbal) obra fundamental para permitir uma acessibilidade fluida no interior da península (concelhos de Almada, Seixal e Barreiro) com ligação ao anel de Coina, e permitindo, com a construção futura da travessia Trafaria – Algés, o fecho da CRIL durante o tal período de governação amorfa e ausente, a que já nos referimos, não avançou nenhum centímetro, para além do traçado anteriormente construído. Assim o IC32/CRIPS existente é claramente subdimensionado relativamente ao planeado sendo apenas uma estrada de utilidade meramente local (sublanço Charneca de Caparica) ou inútil e abruptamente interrompida como no caso do sublanço Pêra – Trafaria.
Também o prolongamento do IC20 (via rápida da Costa de Caparica) para sul, por forma a evitar a travessia urbana e o autêntico desaguar de viaturas no centro da vila na demanda das praias durante o período estival, foi obra que, não obstante a sua importância e necessidade, marcou passo ao longo do período de governação socialista.
Poderíamos ainda referir o caso do MST (Metro Sul do Tejo) planeado ainda no tempo de Ferreira do Amaral mas que ficou a marcar passo e levou dois anos e meio a ser adjudicado (!) e que só agora começará a ser construído, a despeito da obstrução política do PS almadense visível no seu sentido de voto e reserva mental na vereação e na Assembleia Municipal de Almada.
Outros exemplos poderiam ser evocados aqui mas cremos que, face ao exposto esta frenética e peregrina azáfama reivindicativa do PS distrital, para além de nos anunciar que entramos na silly-season, constitui, a um tempo, para além um desaforo moral ou uma tentativa de menorizar a memória recente dos cidadãos, sobretudo, um insofismável case-study digno de um manual de ciência política já que à inactividade governativa se sucede, agora, uma bizarra e histamínica actividade reivindicativa e planfetária procurando branquear o passado, aliviar as consciências e alijar as responsabilidades por tal inépcia.