• 29-07-2002 • |
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As pontes e o desenvolvimento
Todos nós, europeus, estamos actualmente convocados para participar num dos mais relevantes debates sobre o nosso futuro comum! No momento em que este continente se vê confrontado com uma vasta panóplia de desafios, especialmente os que têm a ver com a xenofobia, a criminalidade organizada, as centrais nucleares obsoletas, a insegurança alimentar ou os organismos geneticamente modificados exige-se-nos, com premência, um esforço suplementar, quer para compreender, quer para motivar, concertar e agir em defesa da causa europeia. Torna-se, por isso, imperioso, recriar o entusiasmo que levou à Declaração de Robert Schuman, em 1950, i.e., dar um novo impulso político aos ideais de solidariedade, de tolerância e de paz.
Em qualquer reflexão sobre o futuro da Europa, na sequência da liberdade e da democracia, a sustentabilidade ambiental, constitui um assunto crucial! Como sabemos, o conceito de desenvolvimento sustentável tem vindo a fazer o seu caminho, estando hoje bastante popularizado, embora a necessitar de ser expurgado de alguma ambiguidade que ainda o envolve. Um primeiro passo nesse sentido foi já concluído, com a realização do Conselho Europeu de Gotemburgo, onde o ambiente passou à “alta política” europeia, ao ser aprovada a Estratégia Europeia para o Desenvolvimento Sustentável. Convém recordar igualmente que, decorrente das conclusões desse Conselho, os Estados-membros ficaram obrigados a preparar as suas próprias estratégias, sendo que a portuguesa, tanto quanto sabemos, continua por elaborar. Acresce que a Estratégia Europeia para o Desenvolvimento Sustentável, assume também a maior relevância, dada a proximidade da Cimeira Mundial do Desenvolvimento Sustentável, a efectuar em Joanesburgo, em Agosto/Setembro de 2002, cujo debate irá incidir na governação ambiental e no processo de desenvolvimento sustentável à escala planetária. Trata-se, portanto, de um desafio político de enorme amplitude, que exige fixar objectivos claros, realistas e rigorosos, sobretudo no domínio das políticas económico-sociais.
Para onde vai a Europa? Eis uma questão obrigatória que nos deve interpelar quotidianamente, pois são cada vez mais visíveis nos domínios, social, ético, ambiental… os sinais da crise contemporânea.
A aprovação da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, em 2000, contempla uma nova geração de direitos e constitui um facto positivo, mas fica aquém das exigências societais modernas: a “sociedade dos indivíduos” iguais em direitos e deveres, onde prepondera a solidariedade humana.
Se o alargamento a Leste – imperativo ético de reconciliação da Europa consigo própria – atingiu a sua fase decisiva, a necessidade de reorientar objectivamente as políticas europeias constitui, indiscutivelmente, uma grande prioridade!
Sigo aqueles que afirmam estar um pouco menos preocupados com o modelo de arquitectura institucional da União, mas muito mais com o curso de um projecto de sociedade que se quer solidário e humanista. O grande debate sobre o nosso futuro comum, corporizado na Convenção sobre o Futuro da Europa – cujos trabalhos decorrem, presentemente, com a participação de eurodeputados, parlamentares dos Estados-membros e dos países do alargamento, entre outras entidades, que culminará em 2004, com uma nova reforma dos Tratados – tem, deste ponto de vista, de ser consistente, ambicioso e atingir um sentido político inequívoco!
Como diz Edgar Morin, temos de abandonar a ideia de que o crescimento técnico-industrial só nos trás bem-estar. Para ele a auto-estrada da história chamada progresso, não nos encaminha, inevitavelmente, para um futuro radioso, visto chegarmos à conclusão de que é preciso – e nalguns aspectos com urgência – mudar de caminho, visto que a noção de desenvolvimento é muito mais complexa do que aparenta.
Com efeito, as actuais tendências de degradação ambiental não são uma fatalidade. Acreditamos que é possível uma nova política europeia, com um reformismo ambiental audacioso, sem que tal represente ameaça ou entrave ao crescimento económico da União, antes constituindo um elemento referencial do seu próprio desenvolvimento. A sociedade europeia do “desperdício” tem, pois, de dar lugar à sociedade europeia da sustentabilidade! À União Económica e Monetária (UEM) tem de suceder-se uma União Ecológica e Sustentável (UES). As grandes causas não morreram, nem faltam os intervenientes dispostos a corporizá-las. Veja-se o caso da mobilização dos franceses nas últimas eleições presidenciais. Mas, para que se ganhem tais causas, torna-se incontornável mudar as políticas públicas europeias. Só deste modo se pode retomar a confiança dos cidadãos. Só uma Europa assente no seu património de defesa da liberdade e dos direitos políticos e sociais, dispõe de condições para liderar e estabelecer um compromisso entre a economia e a ecologia. Uma Europa que seja sinónimo de mais democracia e de melhor ambiente!