• 07-08-2002 • |
ASSENTO PARLAMENTAR |
A paciência tem limites
Como já vem sendo habitual, a revista Visão, propriedade do Dr. Pinto Balsemão, publicou no seu número 491 do passado dia 1 de Agosto, mais um artigo de opinião sobre a vida interna do PCP, desta vez da autoria de Mega Ferreira.
Como convém e para não fugir à regra, também o artigo de Mega Ferreira seguiu uma lógica de mediocridade, de quem escreve sobre um assunto que não domina e sobretudo, porque faz parte de uma família política a quem o PCP incomoda e muito.
Escreveu o autor da prosa, que um dia destes, à roda de uma mesa de jantar em que o assunto do dia era a «crise do PCP», ficou muito surpreendido com a intransigência com que os presentes, todos homens e mulheres de esquerda, apreciaram o que ele define como a crise do PCP e sobretudo a constatação que eles faziam, de que o PCP não podia mudar porque deixaria de ser um partido comunista e também, que o destino dos «renovadores seria o PS». Pelos vistos uma e outra opinião desagradaram muito ao Dr. Mega Ferreira, que contestou certamente com toda a veemência de quem nem precisa de ouvir outros argumentos, porque nestas coisas não há nada como seguir a moda, não vá o Dr. Balsemão tirar-lhe a página e depois não poder mais «jogar com as palavras».
O Dr. Mega Ferreira que é tido como um homem culto e um bom gestor, como ficou demonstrado na Expo’98, estranhamente ou não optou por entrar no lote daqueles, que a troco sabe-se lá do quê, enchem páginas de jornais e blocos noticiários de vulgaridades, ávidos de exteriorizarem preconceitos tão antigos em Portugal, como os anos que o PCP tem.
Como muitos dos que acusam o PCP, de práticas anti-democráticas, também ele próprio tem como ponto de partida para a análise que faz, uma tese profundamente anti-democrático, que é dividir os membros do PCP em bons (os chamados renovadores) e maus (os chamados ortodoxos), bastando para integrar o primeiro grupo, que o membro do Partido manifeste na praça pública uma opinião diferente da opinião da esmagadora maioria dos seus camaradas. E depois vai mais longe, quando afirma que os primeiros são comunistas democráticos e os outros fazem parte da «tralha» estalinista do PCP.
É interessante verificar, que aqueles que olham para o PCP de fora e sobre ele dão opiniões devastadoras, só descubram problemas de democracia interna quando se trata de congressos ou conferências do PCP.
Nós temos os nossos padrões, exigências e ambições de funcionamento democrático, onde os membros do Partido têm inquestionavelmente mais direitos de participação, que em qualquer um dos outros partidos.
Ou será que o Dr. Mega Ferreira não sabe que por exemplo no PS, os delegados ao congresso só são eleitos depois de estarem entregues as moções de estratégia, sem que os militantes desse partido possam ter qualquer intervenção, ao contrário do PCP, onde são os próprios militantes que dão uma contribuição decisiva para a definição, num processo dinâmico da base ao topo, das orientações para a intervenção futura do Partido?
Nós no PCP rejeitamos que nos dividam pelas nossas opiniões e também rejeitamos que as naturais diferenças que se manifestem no debate das ideias, sejam esgrimidas na praça pública, dando o triste espectáculo que outros dão, em que tudo vale e que a partir de certa altura o que determina a decisão já não é o valor das ideias, mas a força e a dimensão do insulto.
Aliás, tem sido esta forma de fazer política, que tem afastado os portugueses de participarem activamente na vida social e política do país, mesmo considerando que o sistema vigente lhes tem vindo a condicionar cada vez mais essa participação.
No PCP sabemos o que é o debate das ideias, um debate fraterno, franco em que os únicos limites são o respeito pelas opiniões dos outros e o respeito pela Lei Fundamental do PCP, que são os seus estatutos os quais determinam a obrigatoriedade de todos assumirem dentro e fora do Partido os resultados do debate depois de terminado.
Esta “casa comum de todos os comunistas portugueses” que é o PCP, por força da vontade dos seus membros, não se transformará num “albergue espanhol” onde cada um faz o que quer e lhe apetece.
O PCP, será sempre aquilo que a maioria dos seus membros quiserem e não será nunca uma espécie de produto descartável que se utiliza quando dá jeito e se deita fora quando deixa de interessar.
Não seremos nem um Partido da esquerda folclórica, nem muito menos consciência crítica de outros, que emanando do próprio sistema e ávidos de satisfazer uma clientela exigente, são capazes de vender a alma ou fechá-la numa gaveta, mas não abdicam do poder a qualquer preço.
Independentemente da vontade de alguns, que teimam em confundir o seu próprio desejo com a realidade, os trabalhadores portugueses não deixarão de ter o seu Partido de classe, porque eles sabem que na luta que travam todos os dias é determinante para o seu êxito a existência de uma organização coesa, política e ideologicamente, determinada e combativa.
Mais do que nenhuma outra força política, nós procuramos conhecer e interpretar as realidades da sociedade portuguesa. Sabemos que não existem receitas fáceis para a complexidade dos desafios que se colocam à nossa luta e que teremos de conviver com muitas dúvidas e incertezas, mas não abdicaremos de lutar pela justeza dos nossos ideais e do nosso projecto de transformação social, por muito que isso custe aos Megas Ferreiras deste país.