• 25-09-2002 • |
ASSENTO PARLAMENTAR |
Levantadas do chão
Circunstâncias várias com expressão pública levaram-nos muito recentemente a recordar a dissertação em 1967 de um francês segundo a qual uma vitória de Israel em plena “Guerra dos Seis Dias” (de que resultou a ocupação dos territórios árabes da Palestina, da Síria e do Líbano) estaria mais conforme o sentido da história, na medida em que um estado ‘moderno’ na região viria a produzir rapidamente, pela via da industrialização, uma classe operária em condições de melhor liderar um processo revolucionário naquela zona atrasada do globo.
No desenvolvimento desta temática defendemos que, ao contrário do que pensava e desejaria o francês (nas suas honestas formação marxista e convicções anti-sionistas), “a classe operária é como a Revolução: não se exporta. Sempre sob a forma dos explorados, cresce no mundo, e quando disso resulta a criação de um movimento ou de um partido comunista, solidariza-se com a luta de todos os povos”.
E daí passámos a aflorar aquilo que Álvaro Cunhal chamou “a lição de 1939-1948”, ao referir-se a um particular momento da história do PCP. Por razões diversas sem contacto com a Internacional Comunista e até à auto-dissolução da mesma em 1943, grassando na Europa a Segunda Guerra Mundial num período em que a ofensiva pertencia ainda, e com elevados custos, para a Humanidade às hostes nazis (com franco em Espanha, de complemento), nem por isso o Partido (como que em ‘contrapartida’), deixava de atingir um auge da sua organização na clandestinidade, com mais de 6 mil habitantes e uma forte iniciativa política com a criação do MUNAF e do MUD, por exemplo (“O Partido com paredes de vidro”).
Segundo Cunhal, o PCP aprendia assim, “na vida, que a mobilização, dinamização e correcta aplicação das próprias forças e confiança nas suas próprias potencialidades é a condição essencial do êxito” (primeira lição); e que “a raiz directa e a fonte inesgotável da sua força revolucionária, do seu ideal, da sua inspiração, dos seus quadros, das motivações da sua orientação e da sua acção, dos seus recursos humanos e materiais, é a classe operária, é o povo português” (segunda lição).
Eis a razão pela qual, no quadro de uma conjunção de esforços para a constituição de uma frente anti-imperialista sempre reclamada pelo PCP e que o XIV Congresso, uma vez mais, consagrou como uma tarefa essencial dos comunistas portugueses, a prestação da solidariedade à luta do povo da Palestina, nesta hora crucial em que novos desenvolvimentos ameaçam a paz no Médio Oriente e a ofensiva norte-americana apresenta-se como imparável (será porque, à falta de o deterem ou de tanto tempo levarem a detê-lo, Bin Laden poderá estar na Casa Branca?), se mantém na ordem do dia.
Salvaguardadas as devidas distâncias, a abordagem dos acontecimentos naquela região coloca-se ela própria num enfrentamento da globalização, esse processo objectivo dos nossos tempos com incontornáveis expressões e incidências mediáticas que fazem com que via satélite estivessem ao nosso lado, todos os dias, todas as horas, os lutadores da impifada, ao processo de combate cujo recrudescimento (no sábado, 28 de Setembro, passam dois anos sobre ele…) se deve única e exclusivamente à provocação da extrema direita sionista de Sharon, como convém não esquecer.
De facto, no conturbado processo do Médio Oriente, o arremesso das pedras levantadas do chão é das mais exaltantes gestas que conjugam a noção de forças e potencialidades com a de fonte e ideal. Deslumbra, no sentido épico da palavra, a quantidade de crianças e de jovens que pereceram na linha da frente. Mas é porque ali não poderia ser de outra maneira, porque sempre e em toda a parte são as massas que fazem a história. Em abono da verdade, também ali nada, absolutamente nada é importado.