[ Dia 19-03-2004 ] – ASSENTO PARLAMENTAR por Carlos Guinote (BE).

0
Rate this post

ASSENTO PARLAMENTAR
por Carlos Guinote
(Direcção distrital do Bloco de Esquerda)
 

Áreas Metropolitanas e Comunidades Intermunicipais
Que organização para a Península de Setúbal?

Muito silenciosamente o Governo criou duas leis que permitem a criação de novas Entidades Territoriais e muito silenciosamente os autarcas têm procurado o seu “arranjinho”, isto é, têm procurado criar as suas Entidades Territoriais de acordo com a lei sim, mas totalmente à margem da participação dos cidadãos.

Tendo não só em conta que estes diplomas são apresentados no sentido do cumprimento dos princípios da descentralização e da subsidiariedade consagrados na Constituição e no Programa do Governo PSD/CDS, mas principalmente, pela influência que poderão vir a ter no agravamento do desequilíbrio das estruturas urbanas do país, não deixa de ser uma questão política relevante, com repercussões evidentes na vida das populações. Por isso mesmo, não se entende como os autarcas, desde os nada democratas aos muito democratas, tenham vindo a cozinhar entre si as várias figuras administrativas, à margem dos cidadãos!

Algumas notícias sobre os “cozinhados” têm vindo a público, mais na imprensa regional do que na nacional, mas o suficiente para percebermos que as novas entidades territoriais obedecem mais a interesses partidários, segundo as forças dos partidos nos vários municípios, do que aos interesses dos cidadãos. Como se o problema da organização regional do país fosse uma mera questão de presidentes de câmara, ainda que com a aprovação das assembleias municipais.

A lei 10/2003 prevê dois tipos de Áreas Metropolitanas: as Grandes Áreas Metropolitanas (GAM), compostas, no mínimo, por 9 municípios com contiguidade geográfica e 350 mil habitantes; e as Comunidades Urbanas (ComUrb) que terão como limite mínimo 3 municípios com contiguidade geográfica e 150 mil habitantes. A lei 11/2003 que regula a formação das Comunidades Intermunicipais (Comunidades + Associações) dirige-se para os municípios do interior, com menor número de habitantes.

A Península de Setúbal tinha, entre várias, duas hipóteses mais viáveis: uma seria a criação da Área Metropolitana da Península de Setúbal, preferida pelos presidentes de Setúbal e Palmela, mas que não colheu o apoio de outros presidentes de câmara da Península, que preferem encaixar-se na Área Metropolitana de Lisboa (AML) a que já pertenciam; a outra hipótese seria a integração na (AML), que prevalecerá pelas dificuldades atrás apontadas. Chegados aqui, qual seria a melhor solução?

Em primeiro lugar temos que entender o que está subjacente à publicação das citadas leis. Por um lado, o processo em vez de ser descentralizador como demagogicamente anunciou o Governo, ele é centralizador por colocar as novas entidades territoriais na dependência política e financeira dos governos ou de alguns municípios, potenciando a burocracia, o desperdício e a corrupção, ao mesmo tempo que deixa ainda mais isolados os municípios do interior, já que a tendência é para os municípios do litoral (mais populosos), se organizarem em comunidades urbanas maiores, ficando os municípios do interior mais isolados, quando se impunha solidariedade. Por fim, dividido o país em múltiplas entidades territoriais (ou círculos?), está aberto o caminho para o grande objectivo do PSD e do PS: a formação dos círculos uninominais, a melhor via para a bipolarização PS/PSD, com a consequente liquidação dos outros partidos. É este objectivo, pouco oculto, que nos leva a dizer que a divisão da (AML) entre Norte e Sul do Tejo não se deve fazer.

Por fim é preciso que se diga que o processo tem pouco de democrático, uma vez que a direcção das novas entidades territoriais será exercida pelos presidentes das câmaras associadas, eleitos cada um deles para o seu município e não para o território da nova entidade. Escusado será dizer que o mais provável é que cada um deles puxe a brasa ao seu município. Num próximo artigo abordaremos as propostas possíveis para uma descentralização democrática do país. seta-8972666