[ Dia 15-04-2004 ] – CRÓNICA DE OPINIÃO por José Assis.

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CRÓNICA DE OPINIÃO
por José Assis
(Deputado Metropolitano do PS na AML)

 

A Dança dos Austrolopitecus
– 25 de Abril o dia da… “evolução”!!!???

Após a tentativa de Homicídio do regime Democrático pela via da revisão Constitucional segue-se a tentativa de violação da 3 ª República, pela propaganda. Ambas as tentativas não se consumaram. No Parlamento a oposição resistiu. Nas ruas os outdoors que o Governo espalhou pelo País com a referência aos 30 anos do dia 25 de Abril ( o dia da evolução) só se mantém em pé porque o povo é, efectivamente, Democrático . Dizer que o 25 de Abril não foi uma Revolução, retirar-lhe o R de Abril e afirmar que foi uma evolução nem aos mais evolucionistas lembraria. Pintar os cravos de azul e o fundo de branco nem aos melhores pintores. Só uma mentalidade serôdia e saudosista da velha senhora se lembraria de uma coisa destas. A propósito: se de evolução se tratou aquele dia seriam Salazar e Caetano Austrolopitecus?

Seguramente que Salgueiro Maia, como todos os mortais que fizeram a Revolução, foi um homem feito herói da História Contemporânea da nossa Pátria, pela sua coragem e determinação.

Os outdoors invocativos dos 30 anos do dia 25 de Abril espelham a mentalidade que paira no Governo. Revela, aliás, o estalar de verniz e a emergência da ala ultra conservadora que, neste momento, assume a liderança do Governo. Com os 2 anos de governação, assinalados em grande euforia mas com a contestação generalizada e visível e confrontados com a inevitabilidade do cartão amarelo nas eleições Europeias e o vermelho nas legislativas a coligação da direita não resistiu à tentação de longos anos de tentar branquear o 25 de Abril querendo fazer passar a ideia de que se tratou de uma evolução e não uma revolução. É o ressuscitar da teoria da evolução na continuidade.

Uma espécie de Primavera Marcelista adaptada à efectiva alteração do regime. Como se o 25 de Abril tivesse sido a passagem de testemunho sem resistência do regime de então. Como se antes do 25 de Abril não houvesse PIDE, tortura, Guerra colonial, pobreza e analfabetismo fomentados pelo Estado, exploração brutal da força de trabalho, a clandestinidade obrigada pela natureza securitária do Estado, um regime que na prática prosseguia o fascismo com presos políticos, censura, falta de pluralidade e violação dos direitos liberdades e garantias mais elementares.

Ou mesmo como se no próprio dia 25 de Abril os PIDE não tivessem assassinado cidadãos que se manifestavam à porta da sede da polícia politica. O dia 25 de Abril de 1974 foi o dia em que o povo saiu à rua. Em que os capitães tomaram o poder em nome do Povo, porque já era hora de dizer basta ao obscurantismo reinante. E da Revolução nasceu uma nova Constituição, um novo regime político. Foi um corte, com um passado sistematicamente violador dos direitos humanos e, por isso mesmo, condenado por todos os povos civilizados.

A infelicidade dos outdoors que se suponham comemorativos é de tal ordem que até os cravos transmitem a mensagem de que antes eram azuis – mas eram cravos – e agora são vermelhos e nessa lógica de evolução, mudaram simplesmente de cor. Os cravos são exactamente o símbolo de uma Revolução que historicamente ocorreu. E são os cravos vermelhos. De uma revolução que da parte dos revolucionários foi pacífica e que por isso nos canos das espingardas dos soldados uma criança colocou um cravo vermelho.

Estes outdoors parecem um verdadeiro ajuste de contas ao 25 de Abril, como um dia simbólico e consequentemente, aos seus princípios, ao seu espírito e à sua alma.

Com uma tentativa falhada de alteração da Constituição de Abril prossegue, a direita mais radical, com os propósitos de modificação do regime do Estado de Direito Democrático. O alarmismo na Justiça e as leis de bases da Educação e Desporto são prova disso. As reformulações dos regimes jurídicos do contrato de trabalho; do subsídio de desemprego e da segurança social confirmam esse caminho de desresponsabilização do Estado das suas funções sociais. A política externa actual reforça o papel ultra conservador na governação Portuguesa, que mandou para o lixo, na sua prática, os princípios da Estratégia de Lisboa definida em 2000 sob a Presidência Portuguesa da U E. O embuste da alegada descentralização com a criação de entidades administrativas sem poderes políticos efectivos, revela o gozo que esta direita tem em partir a espinha dorsal do Poder Local.

No Parlamento a estratégia falhou. A Constituição da República mantém-se. Ainda hoje Constitucionalistas como Gomes Canotilho, Vital Moreira e Jorge Miranda criticam e qualificam a proposta de modificação da Constituição apresentada inicialmente pelo Governo como de inaceitável para o regime Democrático nascido no 25 de Abril. Em face do falhanço pela via Constitucional enveredou o Governo pela via da propaganda na rua. Dizer que Abril foi o princípio de um processo de transformação social é reconhecer a história. Associar o dia 25 de Abril à evolução como se esse dia fosse um mero dia de transição de sistema político é branquear o esforço, a integridade física e a vida de muitos cidadãos Portugueses e Estrangeiros que lutaram contra o anterior regime. Cidadãos de todos os quadrantes políticos. Inclusivamente o actual Primeiro-ministro, Dr. Durão Barroso ele próprio um revolucionário de Abril. Atrevo-me a pensar que o Dr. Durão Barroso se tivesse conhecimento do teor dos outdoors concerteza que os chumbaria.

É verdade que a sociedade evoluiu. Com a implantação de um Estado Democrático filho de uma Revolução legitima e que encarna os valores fundamentais da nossa sociedade actual. Duvido que encarne os valores de alguns quadrantes da actual Governação que radicalizaram e se entrincheiraram no populismo. Assim não Dr. Durão. O cartão amarelo manifesta-se, cada vez mais, evidente e necessário. O vermelho dos cravos de Abril ficará para os actos eleitorais subsequentes. 

 seta-9932012