[ Dia 17-05-2004 ] – ASSENTO PARLAMENTAR por Maria Santos (PS).

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ASSENTO PARLAMENTAR
por Maria Santos
(Vice-Presidente do Grupo Parlamentar
do Partido Socialista)

Diplomacia parlamentar: o contributo de Portugal
nas relações Euro-Mediterrânicas

Gostaria de assinalar, neste artigo, o alcance da participação da Assembleia da República na componente parlamentar do Processo de Barcelona. Como sabemos, a Declaração de Barcelona procura estabelecer uma parceria global euro-mediterrânica, a fim de fazer do Mediterrâneo um espaço comum de paz, estabilidade e prosperidade, através do reforço do diálogo político e de segurança, bem como de uma parceria económica e financeira, e de uma parceria social, cultural e humana.

A experiência colhida nos últimos dois anos, nas reuniões do Fórum Parlamentar, e no contexto da recém-formada Assembleia Parlamentar Euro-Mediterrânica, motivam-me a salientar a importância do papel dos parlamentares no aprofundamento do diálogo Euro-Mediterrânico. Contributo indispensável para a edificação de uma rede, cada vez mais consistente, de relações diversificadas entre as duas margens do Mediterrâneo, numa altura em que, também, as opiniões públicas expressam a sua preocupação relativamente ao necessário incremento dessas relações.

Ao nível parlamentar foi possível institucionalizar uma Assembleia Euro-Mediterrânica, estabelecer objectivos comuns e perspectivar um estimulante quadro de funcionamento. A Assembleia Parlamentar, constituída em Atenas, em Março deste ano, poderá vir a tornar-se um elemento mobilizador e agregador dos cidadãos dos países da parceria, um impulsionador das opiniões públicas democráticas e um encorajador dos instrumentos de cooperação inter-governamental, consignados na Declaração de Barcelona.

Os acontecimentos recentes provam a actualidade dos compromissos que a União Europeia assumiu com os seus parceiros do sul Mediterrânico, aquando da Conferência Inter-governamental de Barcelona. Tal como se consignou em 1995, a paz, a estabilidade e a criação de uma zona alargada de comércio livre, de troca de ideias, de partilha de valores e de respeito mútuo – que nos tempos que correm não podem ser palavras vãs – são essenciais à ordem internacional que ambicionamos e, que, necessariamente, se sustenta no multilateralismo. A União Europeia, agora tão significativamente alargada a leste, confronta-se com aliciantes desafios de consolidação interna, mas tem, paralelamente, responsabilidades internacionais acrescidas.

Neste contexto, não se pode escamotear a importância de uma abordagem global, quer da questão da paz, quer da estabilidade da fronteira sul da União, o Mediterrâneo. Estes objectivos, são cada vez mais essenciais para os Estados e povos da União Europeia, como, aliás, as ocorrências posteriores a 1995 bem evidenciam.

A participação no Fórum Parlamentar Euro-Mediterrânico, permitiu-me, também, apreciar os esforços empreendidos não apenas pelos parlamentos nacionais do conjunto de Estados da Parceria e pelo Parlamento Europeu, mas igualmente as iniciativas da Comissão Europeia e dos Estados-Membros, de modo a dotar esta Parceria de instrumentos efectivos de acção.

Ao aproximar-se o décimo ano do seu lançamento, a Parceria permanece o instrumento-base para a promoção das actividades de solidariedade na região. Oferecendo um amplo espectro de possibilidades fundadas nos princípios de cooperação e de consenso que abarcam campos tão amplos como o diálogo político e de segurança; a promoção das reformas económicas e institucionais; a liberalização económica, bem como a promoção de políticas concertadas em domínios tão essenciais e distintos como o ambiente, a energia e os transportes, ou a cultura e a educação.

Portugal, enquanto Estado-Membro com afinidades históricas e culturais com a bacia do Mediterrâneo, pode dar um bom contributo ao desenvolvimento desta Parceria. Antes de mais pelo envolvimento da sociedade portuguesa num campo alargado de iniciativas: da cooperação parlamentar ao diálogo político e diplomático; do envolvimento directo de empresas portuguesas nos instrumentos de cooperação financeira sustentados por fundos comunitários, à integração de técnicos, de universitários e de instituições na constelação de projectos que têm vindo a ser impulsionados.

A circulação acrescida de pessoas, ideias e mercadorias no espaço interno da União Europeia, e também nos países da fronteira sul, reforçarão a nossa proximidade com o Mediterrâneo e justificarão uma voz mais activa de Portugal. Da promoção de mecanismos de protecção civil e de salvaguarda ambiental ao diálogo entre culturas; da instituição de medidas de segurança e confiança comum à participação em programas de cooperação universitária, muitos são os desafios que se colocam às instituições oficiais e à sociedade civil portuguesa, posicionadas em situação privilegiada para potenciar, deste ponto da União Europeia, a relação com o Mediterrâneo.

No entanto, todos sabemos que sem uma solução de paz no Médio Oriente, sem que seja possível, em breve, retomar as conversações entre Israel e a Palestina – como é o apelo que nos chega nestes últimos dias do “Quarteto para a Paz” – e sem uma estratégia comum de estabilidade da comunidade internacional para a região do Médio Oriente, o alcance desta Parceria permanecerá, infelizmente, por realizar ou ficará muito aquém das suas reais possibilidades.

A via em que acreditamos passa, assim, claramente, pelo aprofundamento do diálogo, pelo respeito mútuo e pelo aprofundamento dos instrumentos de cooperação, que trazem consigo o fortalecimento dos princípios democráticos e da promoção da dignidade humana.