[ Dia 15-06-2004 ] – Julgamento de mulheres acusadas de aborto começou hoje em Setúbal.

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Julgamento de mulheres acusadas de aborto começou hoje em Setúbal

A escuta telefónica que incrimina uma das mulheres acusadas pela prática de aborto “não pode ser utilizada como prova de acusação”. Esta é a posição da advogada de defesa, Odete Santos que pediu, durante o julgamento que se iniciou hoje no Tribunal de Setúbal, um requerimento “para que seja declarada a nulidade desta prova”. Simultaneamente, decorria à porta do tribunal uma manifestação de solidariedade onde se apelava para a despenalização do aborto.

O caso remonta a 1999, quando duas mulheres de 26 anos usaram os serviços de uma enfermeira parteira para fazer um aborto. Assim, apesar da falta de provas periciais, o procurador-geral de Évora avançou para a pronúncia das arguidas. Segundo a acusação, esta enfermeira já realizou 1985 interrupções voluntárias de gravidez de mulheres de todo o país. As outras duas mulheres são acusadas de autoria material de um crime de aborto.

De acordo com Odete Santos, a escuta telefónica “não pretendia investigar a arguida”. Por isso, de acordo com a Constituição Portuguesa, “a transcrição dessa escuta não pode ser utilizada para incriminar a arguida”. O aproveitamento da escuta resultaria na “violação da lei fundamental”, refere.

A advogada de defesa alega que não existe matéria para acusação. A advogada refere que “Sempre que a apreciação dos factos exigir especiais conhecimentos técnicos e científicos tem de haver lugar obrigatoriamente a prova pericial”. Assim, neste caso, exige-se a realização de exames médico periciais para provar a existência de uma gravidez ou aborto, algo que não existe nestes casos.

A nulidade das escutas telefónicas como prova foi também pedida por Cecília Claudino, advogada da outra mulher acusada de ter feito um aborto, enquanto que o representante da parteira suscitou a apreciação de várias inconstitucionalidades. A juíza do Tribunal de Setúbal vai apreciar os requerimentos estando a próxima sessão de julgamento marcada para a próxima terça-feira.

Partidos da oposição exigem alteração da lei

Em solidariedade para com as três mulheres estiveram vários representantes dos partidos da oposição gritando e empunhando cartazes pela absolvição das três mulheres. O objectivo era solicitar a alteração de uma lei que dizem ser criminosa. Miguel Portas, do Bloco de Esquerda, afirma que “não quer pressionar a juíza mas sim as instituições democráticas”, nomeadamente a Assembleia de Republica, para alterarem uma lei que considera “injusta”.

Essa é também a opinião da dirigente do Movimento do Partido Democrático das Mulheres, Regina Marques que afirma que esta é uma “lei caduca” e “humilhante”. A responsável sublinha que mesmo que o aborto fosse legalizado, “ninguém ia ser obrigada a fazê-lo”. Além disso, Regina Marques não quer outro referendo sobre o assunto porque “há muitas pessoas que votam sem terem conhecimento das coisas”. Uma opinião também partilhada por Conceição Morais, que integrava a manifestação e que afirma que “a vida íntima das mulheres não deve ser referendada”. seta-2232971