CRÓNICA DE OPINIÃO
por José Assis
(Deputado Metropolitano do PS na AML)
Nossa Senhora de Brotas
As festas populares são no verão. Há muito tempo que não visitava a aldeia de Brotas durante a sua festa em homenagem a Nossa Senhora de Brotas. A aldeia está na mesma. O Concelho – Mora – minha terra natal, a sentir o abandono dos mais novos. Um incentivo: pertencer a uma rede de aldeias turísticas internacionais. O livro sobre a lenda foi lançado com autores de reconhecido nome. Aguarda Brotas, assim como muitas terras da nossa terra, que os políticos se lembrem do interior.
A verdadeira coesão social está por cumprir e necessariamente um dos três Ds que a revolução fez e o sistema parece querer desfazer. Em Brotas a devoção e a fé continuam e o templo Mariano resiste à indiferença do poder. A torre das águias lá está à espera que uma Secretaria de Estado olhe por ela, ou lá se instale. Valha a força dos seus naturais para que a festa continue. No regresso ouvi músicas do Sérgio Godinho. Quando passava pelo Monte Selvagem ele cantava: ai eu estive quase morto no deserto e Brotas aqui tão perto.
Dizem que a escola do primeiro ciclo vai fechar. Falta o número de alunos mínimo. O mestre Joaquim nem quer acreditar. “Então para onde irão os nossos gaiatos e as nossas gaiatas. Alguém tem que meter mão nisto”. Falta um centro de saúde em condições. Ainda a sessão de fados não tinha começado e já o povo ocupava os seus lugares. O palco em frente à igreja. “Este ano o subsidio podia ser maior. Isto se não fosse a carolice as Brotas eram esquecidas”. Um dos organizadores lamentava-se.” Vá homem isto tá bom. Olha bebe mas é uma imperial e vê lá se não te deixas enganar na bilheteira. Olha que os estrangeiros enganam-te.” E vai de gargalhada. O mestre foi sempre positivo. É um daqueles que não abalou.” E a minha patroa bem queria, só que eu não quis”. E pronto é assim. Não quis e pronto. “ Olha ca porra, abalar para quê?”
Para além do espectáculo musical e da vacada o momento alto da festa é a procissão antecedida de missa. Nossa Senhora de Brotas é venerada, pelo menos, no Brasil, Índia e Timor. A lenda e a aparição perpetuaram a aldeia e as suas gentes. No Brasil a terra de Brotas foi fundada por navegadores que, em homenagem à Padroeira, lhe deram o nome. “ Temos que geminar a aldeia mãe com outras no estrangeiro que nasceram daqui “. Concordei logo.” Vamos fazer germinar a ideia.” Mesmo com uma chuva inesperada a procissão foi muito concorrida e o respeito estava sublinhado nas vestes e no modo como homens, mulheres e crianças acompanhavam a Padroeira. Eu não fui. Expliquei ao meu filho Francisco do que se tratava. Fez uma cara séria. No Domingo não houve suecada no café Central ou o estravalio e gritaria próprios da festa. Nossa Senhora saiu à rua. A sua imagem fez recordar outras festas, outros tempos. Tempos de escuridão de sol a sol. Muitos trazem consigo a imagem da Padroeira. No tempo da Guerra colonial dizem que protegeu os tropas que foram lá fora. Todos escaparam com vida.
Hoje a Igreja e a Torre das Águias são património nacional. O Prof. Moisés Espírito Santo lançou um livro sobre a aldeia e a lenda. A olaria é um ofício que continua vivo. Mas os mais novos continuam a procurar o urbano, a metrópole e os que ficam andam pouco animados. Ouvem falar de descentralização mas os efeitos práticos são poucos. A Comissão de Festas, a Associação de Amigos do Concelho e o clube de Motards tudo fazem para divulgar a aldeia. Querem o D da coesão social. Aquele D que lhe prometeram quando a revolução chegou. A reforma agrária faliu e o sonho continua por cumprir, já que as potencialidades permitem o avanço. São 3 os Ds, só falta 1. “ Olha que há 1, o da democratização, que deixa a desejar “ mestre Joaquim sempre foi um pragmático. “ Aquilo lá do Durão foi um bocado estranho “ Cá para mim pirou-se” “ Ora, fez ele senão bem. Eu cá fazia o mesmo” “ o outro é cá um cromo, olha o que a gente precisa é que venham para cá alguns para mudar isto “
Brotas parece estar a mudar porque há quem queira mudança. As novas figuras descentralizadoras não chegam para melhorar as condições que fixem as pessoas à sua aldeia. Em boa hora que este ano fui a Brotas, pela festa. “ Pró ano a festa ainda vai ser melhor”. Haja saúde. A ver se para o ano lá estou outra vez. Uma hora de caminho. Quando cheguei a casa o David Bowie cantava: This is not América. Lembrei-me do mestre. Se ali estivesse diria: “ ora ca porra isso também eu sei “ E ainda bem. Já agora vamos lá a ver se a ideia da gemição cria corpo e para o ano temos um festival internacional.
Os livros da AML.
Uma última nota para as duas últimas publicações da Área Metropolitana de Lisboa:” Gentes, Paisagens, Lugares”;” A imigração inserção laboral e sócio cultural dos imigrantes” – (encontro promovido pela Assembleia Metropolitana de Lisboa) e também para “ Portos, transportes marítimos e território” edição e coordenação de João Figueira de Sousa e apoio da AML.
Três trabalhos interessantes que revelam a dinâmica da AML. Um registo importante.