[ Dia 13-09-2004 ] – Entrevista com João Barros, director da Sucursal Citroen de Setúbal.

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EMPRESAS, MOTORES DE DESENVOLVIMENTO DA REGIÃO

João Barros, director da Sucursal Citroen de Setúbal
“Um dos problemas desta região
é o sobre-endividamento”

O sobre-endividamento é, para João Barros, director da Sucursal Citroen de Setúbal, um dos “grandes problemas” da região de Setúbal, o que a torna “muito sensível” a situações de crise. Em entrevista ao “Setúbal na Rede”, o director declara que a sua empresa “sentiu a crise” mas de uma forma “menos profunda”, já que “não tem problemas de tesouraria”, tendo notado mais dificuldades ao “nível das cobranças” de serviços de oficina e peças. O director explica porque considera a publicidade “uma aposta e não uma despesa”, sendo esta uma das empresas da região que mais investe em publicidade. João Barros refere ainda a disponibilidade da Sucursal Citroen de Setúbal para colaborar em iniciativas que visem a integração de jovens, numa região “crítica em relação à violência e às drogas”. A Citroen de Setúbal é uma das quatro sucursais da marca francesa em Portugal.

Setúbal na Rede – A que se deve o facto de a Citroen ser o maior vendedor de automóveis do distrito de Setúbal?

João Barros – A Citroen é efectivamente o maior vendedor de automóveis na região de Setúbal, porém, relativamente ao distrito, a marca tem mais dois concessionários, a Auto Monumental de Almada, que abarca a área de Almada, Sesimbra e Seixal, e a Citroponte, que cobre a zona de Montijo, Barreiro e Alcochete. Dos concessionários da Citroen na região, de facto quem tem a maior fatia de vendas é a sucursal de Setúbal.

As razões que levam ao nosso sucesso prendem-se com dois factores, com o facto de sermos representantes de uma marca e não termos dificuldades de tesouraria, dificuldades essas que costumam atrapalhar em alturas de crise. O nosso sistema de controlo interno permite-nos planear as acções, melhorando assim o controlo da tesouraria. O facto de sermos uma sucursal da marca obriga-nos a um cumprimento rigoroso das normas da casa-mãe, já que estamos sujeitos a várias auditorias.

Cumprir as normas e estarmos atentos aos objectivos da Citroen, que para este ano assentam na qualidade, permite-nos ter um bom grau de satisfação dos nossos clientes. Em Setúbal, em termos de qualidade, estamos acima da média nacional.

SR – Como é que se mede o grau de qualidade?

JB – O índice de qualidade é medido por uma empresa externa, através do envio de um ficheiro de clientes a quem fizemos vendas nesse mês e que posteriormente vão ser contactados de forma aleatória. Os pontos focados prendem-se com o atendimento, tempo de espera, a qualidade da reparação, da entrega e da preparação, isto entre as 18 questões que são colocadas nestes inquéritos. Outra das perguntas que é efectuada é se, mediante o serviço que lhe foi prestado, o cliente recomendaria esse ponto de venda a outra pessoa.

SR – É fundamental que os clientes recomendem a sucursal aos amigos?

JB – É extremamente importante que o cliente esteja satisfeito com um ponto de venda de modo a recomendá-lo a um amigo, e nesta área nós estamos acima da média nacional, pelo que acredito que o nosso sucesso comercial passe também por aí. Além disso, o nosso sucesso também se deve ao facto de termos uma equipa de vendas muito aguerrida e de termos um bom parque de demonstração de viaturas, o que possibilita que o cliente experimente o carro antes de comprar, essa é uma regra fundamental, cuja aplicação medimos através de clientes mistério. A qualidade de serviço, na qual temos apostado este ano, a ausência de dificuldades de tesouraria bem como a organização comercial de acordo com as normas da marca, são também factores decisivos para os nossos bons resultados.

SR – Esta é também a empresa do ramo que mais aposta em publicidade.

JB – Temos uma aposta muito forte em publicidade na nossa área porque eu acredito que temos que encarar a publicidade como uma aposta e não como uma despesa. A sucursal de Setúbal não tem uma pessoa apenas vocacionada para o marketing, pelo que sou eu, enquanto director, que acumulo essa função, e o que tento fazer é direccionar a publicidade para que a publicidade central da Citroen saia reforçada e não seja uma repetição.

A responsabilidade da publicidade direccionada para o produto é da Citren a nível central, enquanto nós procuramos fazer um complemento dessa mesma publicidade, orientando-a para região em que estamos inseridos. A publicidade que temos nos órgãos de comunicação locais serve como complemento mas também como factor de desenvolvimento da região, o que por sua vez nos permite ter mercado, algo que é fundamental para que continuemos a existir.

SR – Esta é uma empresa que se envolve muito nas iniciativas da região e que faz muitos patrocínios.

JB – Sim, este ano fizemos um plano de patrocínios cujo objectivo é, pelo menos uma vez por mês, ir ao encontro dos nossos clientes. Desde que cheguei à direcção da sucursal, em 2000, verificou-se que a procura de automóveis no stand tem vindo a cair. Nesta perspectiva sentimos que é importante ir ao encontro dos clientes e não mantermo-nos à espera que eles por aqui passem.

O patrocínio da meia maratona de Setúbal, um dos patrocínios importantes que temos, tem como contrapartida para nós o facto de termos exposições na Avenida Luísa Todi. Temos também um patrocínio com o Atlantic Park, que nos leva a ter aí quatro exposições por ano. No Jumbo temos duas exposições anuais, estamos também nas Festas do Pinhal Novo, na Feira de Sant’Iago, na Gala Empresarial da Rádio Popular, enfim, uma série de patrocínios que nos aproximam do nosso público-alvo.

SR – Afirmou que cada vez menos pessoas vêm às vossas instalações. Esta localização tem mais vantagens ou desvantagens?

JB – Temos três critérios fundamentais para escolher uma localização, estar junto de uma via principal de grande tráfego por questões de visibilidade, estar junto da concorrência e estar perto de uma zona comercial. O local onde nos encontramos permite-nos ter uma boa visibilidade, porque a estrada entre Setúbal e Palmela tem bastante tráfego, estamos perto de dois concorrentes, a Renault e a Honda, pelo que o único senão é o facto de não ser uma zona comercial. Dentro do centro da cidade temos também um stand que acaba por ter menos visitas do que este.

Quanto à localização, consideramos que ela não é má, porém existem perspectivas de investimento numa nova localização que poderão desenvolver-se durante o ano de 2005, respondendo sempre aos três critérios que já referi.

Actualmente a nossa política prende-se com a concentração de serviços, isto é, stand, oficinas e armazém de peças devem estar integradas de modo a aproveitar sinergias. Por vezes acontece que o cliente vem à oficina, não estava a pensar trocar de carro e depois de lhe serem mostradas as vantagens de uma troca, acaba por o fazer. O contrário também é válido, pois o que devemos fazer é adequar a nossa oferta às necessidades dos clientes. Hoje mesmo, dissuadi um cliente de trocar um automóvel com quatro anos e dez mil quilómetros, que apenas necessitava de uma reparação.

SR – A Sucursal Citroen de Setúbal é responsável por uma parte do distrito que se estende até ao litoral alentejano. Como é que a empresa se afirma no sul?

JB – A Citroen tem aí dois agentes, um em Sines e outro em Santiago do Cacém. Teve outro em Grândola mas foi encerrado por não cumprir os novos critérios de distribuição. Os dois agentes do litoral alentejano, em termos de vendas, reportam para a sucursal de Setúbal, mas em termos de reparações são completamente independentes da sucursal.

SR – Mas qual é o peso das vendas dessa região?

JB – Não é tanto como eu desejava. Pelo nosso mapa de penetração verificamos que as nossas áreas de incidência são os concelhos de Setúbal, Palmela, Grândola, Santiago do Cacém, Sines e Alcácer do Sal. Devido à distância verifica-se que a nossa cota de mercado em Santiago e Sines é inferior à média. Enquanto nas outras zonas a nossa cota de mercado ronda os 14%, lá em baixo não chega aos 10%.

SR – Isso significa que a influência se perde à medida que a distância aumenta?

JB – É um facto e esse é um defeito da sucursal. Eu, enquanto director, não tenho sabido motivar os meus agentes de modo a levá-los a obter melhores resultados, e esse é um dos meus desafios. Espero, no futuro, conseguir mudar esta forma de estar, porque acredito que estamos a perder vendas nestes dois concelhos por má organização da nossa parte.

SR – A crise tem-se feito sentir na Citroen?

JB – Tem-se feito sentir tal como aconteceu em todas as empresas. Embora reconheça que o sector automóvel foi um dos mais penalizados, as nossas vendas caíram um pouco menos que a generalidade do mercado, ainda que tenhamos conseguido aumentar a cota de mercado.

Afirmar que já estamos perante uma retoma económica não me parece muito correcto neste momento. A nossa região é muito sensível à crise e notámos que esta região está sobre-endividada, porque em 2001 tivemos uma recusa de financiamento de aproximadamente 3%, em 2002 esse valor subiu para os 5% e em 2003 tivemos meses em que esse valor atingiu os 25%. Se as taxas de 3 e 5% respeitavam a pessoas que já tinham tido incidentes com a banca, os 25% incluíam pessoas que estavam muito endividadas e que a banca previa virem a ter problemas se tivessem mais encargos. Um dos problemas desta região é efectivamente o sobre-endividamento.

SR – Esses resultados da crise afectam o funcionamento normal da empresa?

JB – Não, não chegou a esse ponto porque temos a sorte de pertencer a um grupo muito forte e não temos problemas de tesouraria. Tivemos mais problemas ao nível das cobranças, não dos automóveis porque os pagamentos ou são feitos a pronto ou através de financiamento da banca, mas nas peças para pequenas oficinas ou em reparações. Esta não foi uma situação que nos criasse grandes dificuldades internas, o que aconteceu foi termos um índice de trabalho mais elevado com menos resultados.

Neste cenário de crise notámos que alguns dos nossos clientes tiveram dificuldades financeiras, empresas que nos costumavam comprar automóveis adiavam constantemente a compra e uma renovação de frota que acontecia de três em três anos passou a ser feita de cinco em cinco. Neste aspecto notou-se bem a crise.

SR – Não sente que as coisas tenham começado a mudar?

JB – Não muito. Acreditei que os meses de Março e Abril indicavam uma mudança porque foram meses bons para nós, apesar de termos sempre atingido os nossos objectivos, mas depois, Maio, Junho e Julho voltaram a ser meses mais difíceis em termos de vendas. Esta situação poderá ter a ver com alguma instabilidade do Governo, com a instabilidade do preço do petróleo e com a liberalização dos preços dos combustíveis.

Porém, e apesar de não se notar uma grande retoma económica, tenho que admitir que as nossas vendas estão a crescer em relação ao ano passado, um crescimento na ordem dos 20% relativamente ao primeiro trimestre. Penso que estes resultados não são, apenas fruto da nossa melhor organização, mas também resultado dos eventos realizados na primeira metade do ano, tal como o Rock in Rio e o Euro 2004, que podem ter levado a uma maior necessidade dos nossos serviços, apesar do rent-a-car não ter expressão para nós. Este aumento pode ser uma situação pontual.

SR – Esta é uma sucursal e não um concessionário como acontece com outras marcas. Isso significa que estão mais limitados em termos de autonomia?

JB – Não, na Citroen não existe qualquer diferença entre as regras para um concessionário e para uma sucursal. A marca tem quatro sucursais em Portugal, uma em Sacavém, outra em Lisboa, outra em Faro e esta de Setúbal, que estão sujeitas às mesmas regras e à mesma forma de aplicação. O que acontece relativamente às sucursais é que são enviados auditores de França para supervisionar a aplicação das directrizes da marca, mas mesmo assim sobre métodos de controlo interno e não de vendas. Nós somos uma empresa multinacional que está sujeita a normas iguais às das empresas que estão noutra parte do mundo.

Em termos de métodos operacionais temos a mesma autonomia que os concessionários, porque a marca não se mete nas contas das sucursais. Se eu quiser fazer um investimento em novas instalações, a situação pode ser um pouco diferente porque não posso decidir sozinho como acontece com o concessionário. A ideia é apresentada à direcção da empresa em Lisboa com toda a planificação necessária e o respectivo caderno de encargos, e se a direcção aprovar, apresenta a proposta a França e a obra só pode começar com a aprovação francesa.

SR – Esta não é formalmente uma empresa de Setúbal?

JB – Efectivamente não, porque a Citroen tem apenas um número de contribuinte que pertence à sede em Lisboa e é aí que são pagos os impostos. Existem outros impostos que ficam por cá, mas apesar de tudo a Citroen gera riqueza no distrito.

SR – Quais são as mais valias para região de Setúbal com a presença desta empresa?

JB – Damos emprego a 52 pessoas e damos trabalho a alguns fornecedores externos da região. As carroçarias em madeira para as viaturas de cargas são feitas por uma empresa de Palmela, a transformação dos estofos de viaturas é feita por uma empresa de Setúbal, para alguns serviços de oficina, dos quais não dispomos, recorremos também a fornecedores externos. Devo referir que o facto de termos certificação de qualidade implica um maior cuidado na escolha dos nossos fornecedores, aos quais aplicamos os nossos métodos de controlo de qualidade. Em resumo, penso que ajudamos, claramente, a desenvolver a região.

SR – Esta é uma empresa bem integrada na região de Setúbal?

JB – Nós preocupamo-nos com a boa cidadania, temos directrizes da marca e do grupo no sentido de estarmos bem integrados e cumprirmos a nossa função social. Obviamente que, sendo uma sociedade anónima, o objectivo da empresa é gerar riqueza para os seus accionistas, porém também nos preocupamos com a nossa função social. Nesta perspectiva apoiamos várias iniciativas que consideramos importantes para o desenvolvimento da região, nomeadamente ao nível da integração de jovens, uma vez que esta é uma zona crítica no que toca à violência e às drogas.

Temos entrado em iniciativas que apoiamos de forma quase simbólica, com camisolas ou canetas. Recordo um concurso de pintura numa escola em que oferecemos 10 miniaturas de carros nossos, o que deixou as pessoas muito satisfeitas. Por tudo isso penso que estamos bem integrados aqui. Temos tentado também gerar emprego dentro da região, já que quase todos os nossos funcionários vivem no distrito, incluindo eu próprio. seta-4311345