Cem mil euros para recuperar
órgão de igreja do Barreiro
O Órgão da Igreja de Nossa Senhora do Rosário, no Barreiro, vai estar recuperado dentro de dois anos. Trata-se de um instrumento com “grande valor patrimonial”, como “comprova o facto de o Instituto Português do Património Arquitectónico (IPPAR) ter comparticipado com 50% do investimento na recuperação”. António Sardinha, conhecedor da história do órgão, disse ao “Setúbal na Rede” que a recuperação está orçada em cerca de 100 mil contos e vai permitir que o concelho do Barreiro “passe a integrar os grandes ciclos de concertos de órgão de Lisboa”.
O protocolo entre o IPPAR, a Câmara Municipal do Barreiro e a igreja, que visa a recuperação do instrumento, foi assinado no domingo. O IPPAR comparticipa com 50% do valor, a autarquia vai contribuir com 30% e os restantes 20 % serão fruto das contribuições da comunidade. António Sardinha foi um dos impulsionadores do projecto de recuperação do órgão, juntamente com o padre Rodrigo Mendes, Reitor da Igreja de Nossa Senhora do Rosário. De modo a “organizar campanhas de fundos para conseguir a restante verba”, vai ser agora constituída uma comissão à qual pertence António Sardinha.
António Sardinha conta ao “Setúbal na Rede” que a recuperação do órgão é uma velha aspiração da população, “sobretudo da comunidade desta igreja”. Pelas suas características, vários especialistas consideram que remonta à segunda metade do século XVIII, e admitem mesmo que “pode ter pertencido a um dos melhores organeiros portugueses, António Xavier Machado Cerveira”.
Com as obras de restauro que agora se vão realizar, “há a oportunidade de confirmar com rigor a identidade do construtor”. Isto porque, “o instrumento vai ser totalmente desmontado”, o que poderá deixar visíveis as marcas que, habitualmente, os construtores deixavam nas partes escondidas.
António Sardinha refere ainda que, para além deste, “só existe outro órgão no Brasil, com as mesmas características”. Sobre o que está no Brasul, António Sardinha não conhece muitos pormenores, mas quanto ao que se encontra no Barreiro “julga-se que terá sido oferecido à igreja por D. Maria I, grande devota de Nossa Senhora do Rosário”. Aliás, o órgão “contém alterações que demonstram que terá estado antes noutro local”.
O instrumento já não emite nenhuma nota desde a década de 60. Era António Sardinha membro do coro da igreja, quando, em 1957, o órgão foi “remendado”, com pequenas obras de recuperação, para ser tocado por uma professora de música. Cerca de sete anos depois, o instrumento avariou e “não tocou mais”. A recuperação de que tinha sido alvo “foi muito frágil” e “foi feita sem as devidas condições técnicas”.
Há cerca de dois anos e meio começou um processo que culminaria com o protocolo assinado no domingo. O órgão foi alvo de um estudo para avaliar o estado em que se encontra e “se valeria a pena investir tanto dinheiro na recuperação”. Os técnicos concluíram que sendo alvo de obras de restauro, o órgão “pode voltar a produzir som de elevada qualidade”.
Além disso, o IPPAR, o maior co-financiador do projecto, “teve de se certificar de muitos aspectos antes de investir tanto dinheiro”. Assim, o IPPAR aferiu “se a comunidade estava disponível para dar utilização futura ao órgão”, bem como “se a câmara iria apoiar o projecto”. Houve também a garantia de que “há jovens no Barreiro com capacidade para tocar o órgão” e foi ainda encontrada uma pessoa que se encarregará da manutenção do instrumento.
Assim, o restauro do órgão da Igreja de Nossa Senhora do Rosário vai ser encomendado ao organeiro “de renome internacional”, Pedro Guimarães. Formado na Escola Alemã, Pedro Guimarães possui as suas oficinas em Esmoriz, para onde será transportado o órgão, depois de devidamente desmontado. O contrato com o organeiro será, em princípio, assinado em Outubro.
A intervenção vai durar cerca de dois anos, pois está em causa um instrumento “com muitas peças, muitos tubos e ligações” e, acima de tudo, “com muitas especificidades”. Além disso, o instrumento está parado há muito tempo e “há peças que precisam de ser limpas para que se possa produzir o melhor som possível”. Tudo vai ser feito com “o máximo cuidado” e com as técnicas e materiais correspondentes à época em que foi construído. “As próprias colas a utilizar serão feitas como as que se utilizavam na segunda metade do século XVIII”, refere. Só assim, há garantia de poder manter as características sonoras do instrumento.
Depois de recuperado, o órgão vai ter uma “grande importância para o Barreiro”, já que vai produzir “som de elevada qualidade” e, assim, permitir a realização de “concertos de grande nível”. O Barreiro vai projectar-se para fora do território do concelho, na área de execução de órgão, e integrar os grandes ciclos de concertos de Lisboa. Além disso, “a própria população vai poder usufruir de um bem patrimonial com valor inestimável”.
O “Setúbal na Rede” tentou contactar o presidente da Câmara Municipal do Barreiro, mas aguarda ainda por uma resposta.