TIRO E QUEDA
por Luís Lourenço
(jornalista)
Os atropelos do Bonfim
O futebol ao mais alto nível regressou ao Bonfim, depois de um ano de interregno. E não poderia ter começado melhor a prestação do Vitória de Setúbal. Os sadinos venceram o Sporting, por 2-0, de uma forma convincente e com momentos de algum brilhantismo.
Estão, pois – e por agora – de parabéns os jogadores, o treinador e a direcção que, com o orçamento mais baixo da Superliga, se mantém no comando da competição. Como dizia um amigo meu: “ Já só faltam 30 pontos para atingirmos os objectivos”. A nível desportivo, portanto, os vitorianos saíram felizes do Bonfim, no domingo à noite. Só que nem tudo foi “uma mar de rosas”. Fora das quatro linhas, e no que à organização do jogo diz respeito, lá voltaram as patetices em que o futebol é fértil. Patetices nuns casos, atropelos aos mais elementares direitos de quem pagou o seu bilhete e quis assistir a um espectáculo noutros.
Vamos, então, apenas aos acontecimentos que pude comprovar.
Qualquer criança, com mais de cinco anos teve de pagar aquilo que qualquer adulto pagou. Os filhos de sócios tiveram de se munir de um bilhete de cinco euros, os filhos de não sócios tiveram de pagar os bilhetes normais de não sócio, que poderiam ir até aos 25 euros. Repito, uma criança com seis anos teria de pagar 25 euros por um bilhete na “central”. Os fiscais foram inflexíveis nesta exigência e sei de um caso de um pai que se fez acompanhar por dois filhos, um de seis anos e outro de oito, e que voltou para trás porque ou não pôde, ou não quis desembolsar a módica quantia de 75 euros para ver um jogo de futebol.
Em termos de segurança as coisas também não andaram melhor. Mesmo à minha frente vi uma senhora ser revistada e ser-lhe confiscado um simples frasco de perfume. Até posso compreender já que um frasco, a ser arremessado, pode ferir alguém. O que já não entendo é que em pleno jogo tivessem depois sido rebentados, dentro do estádio, dois petardos. Se o ridículo matasse…
Ainda no campo da segurança fiquei a saber, por experiência própria, que quem saísse do estádio ao intervalo não poderia voltar a entrar. Tentei sair e não me deixaram. Com que direito? Não sei e também não me explicaram. “São as ordens que temos”, disseram-me na porta. Ora esta questão levanta um outro problema ao qual também não obtive resposta. Ninguém pode sair porque ninguém pode entrar. No meu caso, que tenho “um bilhete global”, pago para toda a temporada para os jogos da Superliga, não poderei, assim, entrar ao intervalo se, por qualquer motivo me atrasar. Como não compro bilhete – já está pago – não poderei, assim, mostrar um bilhete que não esteja rasgado e como ninguém sabe se eu já estive lá dentro ou não, até porque não existe controlo nas saídas, ficarei interdito ao jogo.
Outro caso aconteceu com uma senhora que estava no camarote onde eu me encontrava. Estou a referir-me aos camarotes antigos onde, imagine-se, não existem casas de banho para o sexo feminino. Resultado: porque as casas de banho são exteriores dá para perceber o que aconteceu. A dita senhora recebeu a mesma resposta que toda a gente: “quem sai já não entra”.
A terminar uma palavra para os cartazes publicitários que rodeavam o estádio, mesmo junto à relva. A luminosidade feria os olhos e não deixava ver o que se passava junto às linhas laterais. Não se via nem a bola nem os jogadores. Todos nós que pagámos os nossos bilhetes deveríamos ter direito de ver todo o jogo, todo o relvado, todas as incidências. Em nome da publicidade mais uma vez os nossos direitos foram atropelados sem dó nem piedade.
Por tudo isto julgo que não houve, no Bonfim, nem legitimidade nem bom senso na forma como trataram as pessoas. E tão ou mais grave que isto penso que não é assim, em definitivo, que se conquista mais adeptos para o futebol. Se calhar, não é por acaso que, no Municipal de Leiria, no encontro que opôs a União de Leiria ao Estoril, apenas estiveram 200 “pagantes”.