Fundação das Salinas do Samouco
pode fechar este mês
A Fundação para a Protecção e Gestão Ambiental das Salinas do Samouco pode fechar dentro de duas semanas, se o Estado não desbloquear as verbas que deve à instituição. O presidente da fundação, José Manuel Palma, alerta que, este mês, “só pagou metade dos ordenados” e “há apenas dinheiro para o gasóleo das máquinas por mais 15 dias”. O responsável confessa ao “Setúbal na Rede” que está “cansado de viver os mesmos problemas” que continuam por resolver desde a criação da fundação.
A fundação foi criada em 2001, como exigência da União Europeia ao Estado português, de forma a honrar um compromisso datado de 1998. Este compromisso tinha como objectivo “minimizar os impactos” da construção da Ponte Vasco da Gama, numa área de “grande sensibilidade ambiental”. O ministério do Ordenamento do Território e do Ambiente deveria garantir cerca de 150 mil euros, por ano, durante três anos, “até a fundação se tornar economicamente sustentável”.
No entanto, nos últimos dois anos, o Ministério do Ambiente “não canalizou nenhuma verba” para a instituição, que tem sobrevivido com apoios da Lusoponte e do Ministério das Obras Públicas, e também de fundos comunitários derivados de candidaturas. Em Janeiro deste ano, José Manuel Palma confessava ao “Setúbal na Rede” que a fundação deveria fechar em Fevereiro, devido à falta de pagamento, por parte do Ministério do Ambiente, dos 300 mil euros relativos aos anos 2002 e 2003.
A situação difícil em que se encontra a Fundação das Salinas do Samouco teve uma grande mediatização, em Janeiro, quando o Presidente da República, Jorge Sampaio, escolheu as salinas para iniciar uma presidência aberta sobre o ambiente. No entanto, com as mudanças governamentais “a situação instável manteve-se” e o Decreto-lei de 2000, que formaliza a fundação, “não foi alterado, como estava previsto há mais de um ano”. A reformulação da legislação e desbloqueamento das verbas do Governo, são as exigências feitas por José Manuel Palma, “para que a fundação não chegue ao fim”.
O Decreto-lei previa o pagamento de 300 mil euros, por ano, repartidos pelos ministérios do Ambiente e das Obras Públicas. Este último, “honrou sempre o compromisso” e já prometeu disponibilizar, “o mais rápido possível”, 150 mil euros relativos ao ano em curso. José Manuel Palma não compreende porque é que o Ministério do Ambiente, que “deveria ser o mais interessado na manutenção da fundação”, não tem colaborado. “É uma situação contra-natura”, desabafa.
Além disso, os três anos de apoios estatais, previstos no Decreto-lei, “não são suficientes”, já que a fundação “precisa de trabalhar enquanto durar a concessão da Lusoponte, na Ponte Vasco da Gama”, o que deve acontecer durante mais 20 anos. Toda esta situação impede que a instituição tenha um financiamento garantido, pois as poucas verbas recebidas “não chegam para investir, mas apenas para garantir a manutenção”. Assim, a Fundação das Salinas do Samouco “não alcançou a tão desejada auto-suficiência financeira”.
Para contornar as dificuldades, José Manuela Palma candidatou a fundação a diversos programas comunitários, como o Agris. No entanto, “não foi possível utilizar os dinheiros da União Europeia”, pois “não há a comparticipação correspondente do Estado português”. Assim, os projectos sofreram atrasos e “não se conseguiu aproveitar cerca de 25 mil euros”.
Também não foi possível comprar a bomba de água de rega para fazer avançar já o projecto das hortas sociais, no âmbito do Programa Agris. Por isso, a fundação “vai ter de utilizar o pouco dinheiro que possui” para, em conjunto com a Câmara de Alcochete, pagar as despesas referentes às hortas sociais. Este projecto consiste na cedência de parcelas de terreno da área da fundação a residentes do concelho de Alcochete que, desta forma, podem ocupar os tempos livres a fazer agricultura biológica e sem fins lucrativos. A cedência das parcelas vai ser alvo de um concurso público a lançar pela câmara.
Para além da intervenção ambiental, o presidente da Fundação das Salinas do Samouco realça o papel social da instituição que “tem permitido a integração de desempregados de longa duração, bem como pessoas em programas de formação”. “Nunca a fundação teve tanta gente a trabalhar nela como em 2004”, sublinha. Chegou a ter 30 trabalhadores, muitos deles provenientes de acordos com o Instituto do Emprego e Formação profissional. Ainda assim, os ordenados referentes ao mês de Outubro foram pagos pela metade e até mesmo para o gasóleo das máquinas “já escasseia o dinheiro”.
José Manuel Palma avisa que a situação “é insustentável” e que a fundação só poderá sobreviver “se o Ministério das Obras Públicas avançar, no prazo de 15 dias, com os 150 mil euros já prometidos”. Quanto ao Ministério do Ambiente, este responsável já perdeu as esperanças, pois já “estão em falta todos os pagamentos acordados”. A fundação precisa de “alento financeiro para se tornar auto-suficiente”, e também de uma “reestruturação que só pode ser conseguida com a reformulação do Decreto-lei de 2000”.
Uma das mudanças pedidas por José Manuel Palma é que a fundação seja mais aberta à sociedade civil e que a Câmara de Alcochete e todos os ministérios “tenham uma participação mais activa”. Para tal, defende a existência de um conselho consultivo, do qual deve fazer parte a sociedade civil.
Para o dirigente da associação ambientalista Quercus, Francisco Ferreira, é “inadmissível” que o Governo não honre os compromissos assumidos. Por isso, o ambientalista garante que a Quercus vai “escrever uma carta à Comissão Europeia para reforçar a queixa que a Quercus interpôs contra o Estado português, em 2003”.
A situação em que se encontra a Fundação das Salinas do Samouco não surpreende Francisco Ferreira que sempre teve “dúvidas” sobre a viabilidade económica deste organismo, em virtude do que estava previsto no Decreto-lei de 2000. A Quercus acreditava que “quando o financiamento de três anos chegasse ao fim, alguma coisa iria falhar”, refere.
Pior do que isso, o Ministério do Ambiente “não está a cumprir o pagamento das verbas acordadas”, o que significa que os impactos da construção da Ponte Vasco da Gama “não foram minimizados”. “O trabalho desta fundação está muito aquém das expectativas, porque há projectos que não avançam em virtude da falta de verbas”, lamenta. Por isso, Francisco Ferreira apela ao Governo para “cumprir o prometido” e “definir a situação da fundação”.