[ Dia 09-11-2004 ] – ASSENTO PARLAMENTAR por Heloísa Apolónia .

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ASSENTO PARLAMENTAR
por Heloísa Apolónia
(Deputada do PEV eleita pelo distrito de Setúbal)

Mais esquerda com mais ecologia

Tivemos em 6 de Dezembro, provavelmente, o dia de trabalhos parlamentares mais inusitado de que há memória. 

Discutiu-se e votou-se um Orçamento de Estado para ser aplicado no decurso de 2005, fiel retrato de uma maioria de direita que existe actualmente no parlamento, quando a Assembleia da República está prestes a ser dissolvida, quando o Governo a breve prazo entrará em gestão, com eleições legislativas à porta.

Nestas circunstâncias “Os Verdes” entenderam que este Orçamento de Estado está ferido de legitimidade política e consideraram que a Assembleia da República não deveria votar este documento.

Este Orçamento de Estado representa, para além de tudo o mais, uma deslealdade entre o discurso apelativo do Governo e a verdade cruel que nele se incorpora: afinal o combate à fraude e à evasão fiscal ficou muito aquém do anunciado, recuou-se na restrição dos benefícios aos dividendos das privatizações, na tributação dos lucros obtidos na zona franca da Madeira, restringiu-se o acesso da Administração a informação objecto de sigilo bancário, mexeu-se no IRS de forma pouco significativa e com resultados adiados, a margem de aumentos salariais não representa um aumento real, devido ao congelamento de anos anteriores e à estimativa real da taxa de inflação, ficaram adiadas medidas urgentes no que concerne a uma necessidade de auto-suficiência do país ao nível energético e de garantia de maior eficiência energética e a incapacidade deste Governo de garantir um maior desempenho ambiental no sector dos transportes foi manifesta.

Simultaneamente, apesar de algumas migalhas que o Governo previu neste Orçamento para as famílias, as quais tenta que sejam vistas como um bolo, a grande capacidade do Governo esteve em tirar verdadeiramente o pão com medidas anunciadas, para além do Orçamento, com a capa, por exemplo do princípio do utilizador-pagador, e sobrecarregando desta forma os orçamentos familiares, como por exemplo os aumentos consecutivos dos títulos dos transportes colectivos já previstos em quase 6% para o início do próximo ano, ou com o aumento das taxas de saúde.

Este Orçamento e este Governo traduzem a permanente instabilidade e o permanente descontentamento social. Este Orçamento fomenta as desigualdades: as desigualdades regionais do país, bem como as desigualdades sociais, que são problemas estruturais os quais importa tomar como grandes objectivos de governação. A injusta repartição da riqueza e do investimento, com a banca a engordar, associada a um alargamento da pobreza e do desemprego é um problema que a direita não conseguirá jamais contribuir para resolver, porque a estrutura do seu pensamento e acção, traduzida nas suas políticas tem como prioridade salvaguardar interesses onde não cabem a generalidade dos portugueses.

E queria o Sr 1º Ministro ficar a governar este país por mais 10 anos!! Quando nestes 4 meses se confirmaram as piores expectativas.

Primeiro tivemos um 1º Ministro que sabia que ia ser 1º Ministro, não sabia era quando. Mas ao fim de dois anos, depois de uma notória derrota da coligação PSD/PP nas europeias deixou de o ser e foi ocupar o lugar de Presidente da União Europeia.

Depois tivemos um 1º Ministro que sendo Presidente de Câmara já tinha decidido que queria era ser Presidente da República, e que afinal veio, a convite do Sr Presidente da República, a liderar o novo Governo da mesma maioria.

E em quatro meses foi o que se viu: Ministros desavindos, contradições constantes entre membros do Governo que num dia diziam uma coisa e no outro um colega desmentia, professores, pais e alunos de cabelos em pé, pressões sobre a comunicação social para silenciar críticas, remodelações anunciadas, logo a seguir alargadas e 4 dias depois já derrotadas, enfim… isto não foi um Governo mas um verdadeiro desgoverno neste país.

As próximas eleições constituem uma oportunidade para formar uma nova correlação de forças na Assembleia da República, uma nova correlação de forças que assegure que se arredam as medidas de direita, porque este país precisa de valores e de políticas de esquerda, para se orientar para as pessoas, para a promoção do bem estar dos portugueses! Chega de direita e chega também de meias definições carregadas de indefinições, que o PS tem protagonizado. É preciso falar verdade às pessoas e o PS ainda não disse se as suas preferências de convergência vão para a direita ou para a esquerda

Esperamos que este Orçamento de Estado, que foi aprovado, não sirva de pretexto para que qualquer novo Governo se amarre às políticas nele inscritas. Que se o futuro Governo for diferente não se aproveite deste Orçamento para fazer mais do mesmo. Relembramos que há muitos anos que o Parlamento não vota um orçamento à esquerda (no tempo de Guterres foram todos aprovados à direita). Por isso esperamos que daqui a pouco tempo a Assembleia esteja em condições de votar um novo orçamento, alternativo, com a esquerda, com medidas que sirvam os portugueses, orientando o investimento e os benefícios para quem e o que dele precisa, que sirva a sustentabilidade do desenvolvimento e que garanta que conseguiremos atingir os compromissos ambientais que no século XXI temos obrigação de não adiar mais.

Nesse sentido importa reforçar a voz daqueles que têm assumido os seus compromissos, que de uma forma séria têm produzido um imenso trabalho no parlamento no sentido de contribuir sempre e mais para a qualidade de vida dos portugueses, na exigência de um desenvolvimento verdadeiramente sustentável. seta-1400193